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(Direito do) emprego e geringonça 2.0

É claro que o Direito do Trabalho tem e deve manter a sua função histórica e tradicional de regulação da relação laboral e de protecção do trabalhador. Para tal, é fundamental reforçar o papel dos parceiros sociais.

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No cada vez mais longínquo ano de 2016, e num ambiente típico dos inícios das paixonetas, PS, BE e PCP criaram o autoproclamado Grupo de Trabalho para Preparação de um Plano Nacional contra a Precariedade, o qual se dedicou afincadamente à definição do caldo político adequado à eliminação da possibilidade legal da contratação a termo certo por motivos de política de emprego.

Corria já tarde o ano de 2019, isto é, três anos depois e um acordo de concertação social mais ou menos (in)cumprido pelo meio, quando foi aprovada uma alteração ao Código do Trabalho que afastou a possibilidade de celebração de contratos de trabalho a termo certo, sem qualquer outro fundamento exigível, por trabalhadores à procura do primeiro emprego e por desempregados de longa duração (mantendo tal possibilidade apenas para desempregados de muito longa duração). Procurando o equilíbrio político possível entre os objectivos político-partidários de curto prazo (lembremos que a alteração à lei ocorre em Setembro e que em Outubro têm lugar as eleições legislativas) e os problemas concretos da realidade do mercado de trabalho (entre os quais está o combate ao desemprego jovem e ao desemprego de longa duração), o Código do Trabalho, ao mesmo tempo que acabou de forma intolerável com um instrumento já clássico das políticas de emprego no espaço europeu, alargou o período experimental para 180 dias, num “trade-off” de duvidosa constitucionalidade e controversa eficácia, no caso de contratos de trabalho por tempo indeterminado celebrados exactamente por trabalhadores à procura do primeiro emprego e por desempregados de longa duração.

E eis que estamos em 2020, em plena pandemia covid-19, com a economia em recessão, com o indicador de clima económico em níveis historicamente baixos, com os níveis de confiança dos consumidores pelas ruas da amargura e com um quadro de subida avassaladora do desemprego

Só há um caminho: recuperar o emprego.

É claro que o Direito do Trabalho tem e deve manter a sua função histórica e tradicional de regulação da relação laboral e de protecção do trabalhador. Para tal, é fundamental reforçar o papel dos parceiros sociais e consolidar a contratação colectiva como instrumento mobilizador das vontades e ponto de encontro das expectativas dos trabalhadores e dos empregadores. Neste domínio, a pandemia covid-19 vem evidenciar a importância de algumas (já não assim tão) emergentes áreas, tais como, entre outras, as implicadas no trabalho à distância, no tempo de trabalho, na protecção de dados pessoais e na retribuição (até porque a disrupção digital da economia vai aumentar a pressão sobre os salários).

Mas tal não basta e o Direito do Trabalho tem de se assumir definitivamente também como um direito do emprego.

Com uma forte orientação para a criação de postos de trabalho, um Direito do Trabalho que seja também um direito do emprego define-se pela sua complementaridade funcional, afirma a necessidade de não se deixar desligar nem abstrair da realidade económica e social envolvente e potencia a integração de dois elementos imprescindíveis a um mercado de trabalho economicamente sustentável e socialmente equilibrado: a competitividade das empresas e a solidariedade nas relações laborais.

Haverá coragem para isso ou a manutenção do governo e a sobrevivência do primeiro-ministro via geringonça 2.0 falarão mais alto?

 

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