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Cinco caminhos para a Europa?! - (XCIII)

Economias do euro podem vir a ser excluídas de mecanismos de partilha de risco como os referidos, não por opção própria, mas porque não cumpram critérios.

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1. Não deixou de me surpreender a reacção ao Livro Branco de Juncker e, sobretudo, à tomada de posição da Sr.ª Merkel a que me referi no último artigo. Quanto à iniciativa do presidente da Comissão ainda entendo, na medida em que pode ser considerada um apelo aos políticos europeus para que assumam a responsabilidade da escolha de um caminho. Já no que se refere à possibilidade de virmos a ter uma "Europa a várias velocidades" a timidez da reacção que provocou e a ausência de debate são no mínimo surpreendentes. O argumento de que esta solução já se encontra de algum modo prevista nos tratados, através do chamado mecanismo das "cooperações reforçadas" - já utilizado no caso do Euro e do Espaço Shengen -, é ignorar uma questão central: as implicações da existência de uma moeda única para as economias que a adoptaram. Na verdade e como sabemos, dois tipos distintos de bloqueamentos ameaçam fragmentar a União Europeia: defesa/segurança/fluxos migratórios por um lado e baixo crescimento/desemprego jovem/fragmentação social, por outro. Deixando de lado as respostas ao primeiro conjunto de problemas - tornadas mais complexas pelo Brexit e que irão determinar o papel da Europa no quadro geoestratégico que se está a formar, com a emersão da China como potência mundial de primeira linha -, o segundo conjunto está, por sua vez, ligado aos elevados níveis de dívida externa, num quadro em que um conjunto de economias se encontram "amarradas" por uma moeda única. É em relação a este conjunto de economias que as implicações de uma Europa a "várias velocidades" devem ser avaliadas. Em particular no caso de economias que, como a nossa, se encontram a braços com bloqueamentos estruturais que estão a travar o crescimento.

 

2. Para o compreender há que ter presentes as dificuldades que têm vindo a bloquear o progresso da integração financeira no quadro da União Monetária e Bancária. Estas decorrem sobretudo da recusa alemã em avançar para qualquer solução que passe por uma partilha de responsabilidades - seja a implantação a nível europeu e em tempo útil, de um sistema de garantia de depósitos e de um fundo de resolução, seja o lançamento de emissões europeias de dívida, suportadas por mecanismos de partilha de risco, em condições a definir. Num quadro em que os países do euro cederam soberania em áreas de importância crítica, como no caso das decisões sobre o futuro dos seus bancos sistémicos, de que dependa a preservação da estabilidade financeira. Neste contexto, a avaliação das implicações de uma Europa "à la carte"* depende da resposta a várias questões: esta solução refere-se apenas ao primeiro conjunto de problemas ou vai também ser aplicada no interior da Zona Euro? Neste caso, economias do euro podem vir a ser excluídas de mecanismos de partilha de risco como os referidos, não por opção própria, mas porque não cumpram critérios - peso da dívida, situação fiscal, peso dos NPL** ou outros - que venham a ser adoptados? O que corresponderia à criação de diferentes zonas euro e à fragmentação da União Monetária, com um impacto potencialmente devastador sobre as condições de financiamento das economias excluídas. Vamos ter de esperar pelas eleições alemãs para avaliar o alcance da "manobra" da Sr.ª Merkel, mas não devemos ignorar ou subavaliar as implicações - os riscos - de uma Europa a "várias velocidades" que inclua condições susceptíveis de vir a excluir do movimento de integração financeira economias do euro.

 

*"À la carte"- "à lista": o mesmo que a várias velocidades;

 

** NPL - créditos em incumprimento.

Economista

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