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25 de Março de 2018 às 21:08

O meu Facebook?

Os utilizadores do Facebook e do Instagram têm pela frente 3700 palavras antes de clicar no quadradinho que transfere para as duas redes sociais de Mark Zuckerberg o poder de fazer demasiadas coisas com a informação recolhida. Os fãs do Twitter estão um pouco pior: têm de ler 11 mil palavras.

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Na verdade, vai dar ao mesmo. Ninguém lê aqueles textos de consentimento.


Além de serem uma maçada, estes documentos são mil-folhas de complexidade. A expectativa natural — ingénua — das pessoas é que os estados regulem e estejam atentos à atividade destas empresas. Isto é, criem um espaço não apenas seguro, dentro do que é possível e legítimo esperar, mas também equilibrado no que diz respeito à mais abstrata, mas penosamente concreta, área da privacidade individual.


Este clamor público por causa dos 50 milhões de perfis vendidos pelo Facebook à Cambridge Analytica, abrindo uma magnífica autoestrada para a manipulação política ao dispor do melhor comprador, merece todo o alarme social que está a causar, mas se pensarmos bem no que está a acontecer percebemos que o assunto é muito mais grave. Infinitamente mais grave. Vai muito além das redes sociais, apesar de elas serem a porta da frente para a contaminação dos processos democráticos e, portanto, da governação.


A política nunca foi um jogo limpo pela simples razão de que é uma atividade humana que implica o poder de uns sobre os outros e aí o céu é o limite da ganância. Manipulação sempre houve e haverá. Desde agentes infiltrados, escutas, jornais martelados, factos falsos, revoluções provocadas etc., o cardápio de abusos parece ficção militar. O que é novo agora, no sentido em que se acentuou nos últimos dez anos ao ponto de nos apanhar totalmente vulneráveis, é o faroeste imposto pela digitalização das nossas vidas.


Quem quer ter uma expressão da sua vida online é forçado a aceitar a mercantilização do seus dados, gostos, preferências e, claro, medos e taras. Quem não aceita os termos do jogo — os famosos cookies — pura e simplesmente não entra, fica à porta. Basta fazer uma pesquisa no Google sobre um sítio de férias e, é certo como o destino escolhido, que iremos receber nesse mesmo dia publicidade sobre esse ou outros locais turísticos. Publicidade dirigida — com target — chamam-lhe os tipos do marketing. O problema é que se trata de muito mais do que isso.


Toda essa informação pode ter efeitos benignos. Ajuda-nos a conhecer as melhores ofertas no mercado ou apenas a entrar em contacto com novos produtos. Mas o armazenamento deste fluxo diário de dados precisos e individuais, incluindo informação com referências geográficas dos sítios por onde andámos, permite a definição de perfis psicológicos e comportamentais que começaram por ser usados para fins puramente comerciais mas, entretanto, já deram o salto para o lado de lá da barricada política.


Para já, tivemos o Brexit e a eleição de Trump — que receberam essa preciosa batota digital, mas que encontram a sua razão de ser também noutro tipo de insatisfação pessoal e popular. No entanto, muito mais virá se nada for feito para conter a enxurrada. A chantagem pura e dura — informação é poder — é o passo que se segue. A nossa pegada digital é tudo menos privada. Não há privacidade na web. Está tudo guardado. Não há direito ao esquecimento.


Nem sequer podemos gerir a forma como nos queremos identificar: metemos sobre a mesa a história inteirinha das nossas vidas. Entramos num site e dispomo-nos a revelar absolutamente tudo. O streaptease pode ser total, depende apenas do rebuço e conhecimento técnico das empresas com quem lidamos. Imagine o que seria pedirem-lhe que se identificasse à entrada de um simples supermercado. Não o aceitaria, pois não? Mas é o que fazemos todos os dias (para pior) na internet. Viste o meu Facebook? A expressão sempre foi um pouco, digamos, excessiva. Agora tornou-se um absurdo.


Jornalista

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