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Como evitar a "tristificação" das cidades

O sintoma de que a habitação é um problema está no facto de todos os partidos e o Governo terem apresentado iniciativas de alteração à legislação, num total de 27 diplomas, que agora são 24. "Todos os partidos querem mudanças", constatou Helena Roseta.  

02 de Outubro de 2018 às 17:00
David Martins
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Numa reunião com pessoas de um dos bairros lisboeta com maior pressão turística e ameaçado pela gentrificação, um dos presentes referiu-se à "tristificação" da cidade. Helena Roseta explica como "o potencial de investimento valoriza um bem e quem precisa não pode chegar". A liberalização das rendas, a reabilitação urbana, o turismo, o investimento estrangeiro (vistos gold e residentes não habituais), o turismo e o alojamento local estão a provocar uma enorme pressão na habitação, sobretudo no centro das cidades.

 

Em 2017, segundo o FMI, Portugal foi o 5.º país no mundo em crescimento do preço da habitação. Segundo o INE, dados do terceiro trimestre de 2017, o preço da habitação em Portugal foi liderado pela Área Metropolitana de Lisboa e o Algarve, com os valores mais altos, seguindo-se a Madeira. Em Lisboa, houve freguesias em que a taxa de variação homóloga num ano foi superior a 45% e, no Porto, os valores de venda na zona central cresceram entre 14% e 41% entre o terceiro trimestre de 2016 e o terceiro trimestre de 2017. Além disso, a subida de preços está a contaminar as freguesias contíguas.

 

Para resolver a adequação da oferta à procura e resolver os principais problemas habitacionais emergentes, Helena Roseta, deputada independente do PS, apresentou uma proposta de Lei de Bases da Habitação, em Abril passado. Defendeu que "devíamos ter começado pela lei de bases para termos uma estratégia nacional e que, de preferência, tivesse um apoio alargado na Assembleia da República, para andarmos todos a remar para o mesmo lado. Mas cada um foi para uma coisa, temos uma panóplia de projectos para fazer coisas variadas, mas sem uma visão global."

 

"São muito parcelares e reagem a casos que acabam de acontecer, ao sabor do momento, e falta uma estratégia." Salientou que Nova Geração de Políticas Públicas da Habitação foi aprovada em Conselho de Ministros e "devia ser aprovada no Parlamento porque é uma estratégia nacional". Criticou o facto de estes documentos não terem sido discutidos no Parlamento e, por isso, "andamos a fazer remendos, a pôr botox em leis velhas".

 

Desigualdades

 

Helena Roseta disse que hoje "há mais casas que famílias", tendo o número de alojamentos passado de 2,7 milhões nos anos 70 para 5,9 milhões em 2015 (65% em áreas urbanas e 35% em áreas rurais), calculando-se que mais de 700 mil estejam vagos. Apesar disso, em Fevereiro de 2018 estimava-se que 26.000 famílias tinham carências habitacionais graves.

 

Assinalou que, nos últimos 50 anos, houve uma mudança de paradigma. "Em 1970, 46% da população tinha casa arrendada, 55% casa própria. Em 2011, só 25% tinham casa arrendada e 75% casa própria. Mas será mesmo "própria"? Metade dos "proprietários portugueses está a pagar empréstimos à banca", referiu Helena Roseta.

 

No caso do arrendamento, "actualmente 35% das famílias portuguesas com arrendamentos pagam pela habitação mais de 40% dos seus rendimentos. Isto significa que mais de um terço das famílias portuguesas em arrendamento está em sobrecarga de despesas, quando a média europeia é 27%".

 

Existem desigualdades no peso das despesas de arrendamento e no acesso ao crédito. "A população mais pobre e a classe média viram agravar-se em muito as despesas de arrendamento nos últimos anos. Faltam medidas para tornar a habitação mais acessível", bem como o acesso ao crédito. Em 2015, apenas 15% das famílias com menores rendimentos tinham um empréstimo à habitação. Nas famílias com maiores rendimentos essa percentagem era três vezes superior.