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Decisões irracionais?

Nunca lhe aconteceu ler uma ementa num restaurante, ter uma ideia daquilo que queria comer ou beber e acabar por alterar a sua escolha porque ouviu um pedido na mesa ao lado, ou porque resolve seguir o exemplo de quem...

29 de Abril de 2009 às 10:00
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A capa da edição portuguesa do livro "Previsivelmente Irracional" tem uma pergunta: "Por que é que pessoas inteligentes tomam decisões irracionais todos os dias?" À luz da economia comportamental, o professor do MIT Dan Ariely explica, com muitos exemplos à mistura, como tomamos decisões e por que somos não só irracionais, mas previsivelmente irracionais.


Nunca lhe aconteceu ler uma ementa num restaurante, ter uma ideia daquilo que queria comer ou beber e acabar por alterar a sua escolha porque ouviu um pedido na mesa ao lado, ou porque resolve seguir o exemplo de quem partilha a mesa consigo?


Em "Previsivelmente Irracional", Dan Ariely dá pistas para os consumidores tomarem melhores decisões.
Analisando este tipo de decisões, a economia convencional diria que se trata de uma decisão informada e racional. Já a economia comportamental diria que as pessoas são susceptíveis de serem influenciadas por aquilo que as rodeia, pelo contexto, e acabam muitas vezes por tomar decisões irracionais. É isso que Dan Ariely, professor de economia comportamental no MIT, explica no seu livro "Previsivelmente Irracional" que acaba de ser publicado em Portugal (editora Estrela Polar).

Com testes e muitas histórias à mistura, este professor do MIT conclui que "somos muito menos racionais a tomar decisões do que a economia convencional pressupõe". E diz mais: os comportamentos irracionais "não são aleatórios ou erráticos, mas previsíveis e sistemáticos." E por que repetimos constantemente os nossos erros? Basicamente, devido ao modo como funciona o nosso cérebro.

No caso de um pedido no restaurante, Dan Ariely diz que as pessoas estão dispostas a sacrificar o prazer de um determinado consumo para projectar nos outros uma certa imagem de si próprios. Nas experiências que fez, por exemplo, os que queriam marcar a sua individualidade escolhiam uma bebida que mais ninguém escolheu.

Esta é apenas um das muitos casos que demonstram a irracionalidade das nossas decisões e que Dan Ariely explica, capítulo a capítulo, no seu livro, lançando uma série de perguntas. Por que será que um medicamento caro nos faz sentir melhor do que um barato? O custo faz a diferença na forma como nos sentimos? Por que é que temos tanta dificuldade com as opções? Por que sobrevalorizamos o que temos? Por que não poupamos parte dos nossos salários, como sabemos que devíamos fazer? Por que não resistimos às novas compras? O que é tão cativante no "grátis"?

A todas estas perguntas, Dan Ariely vai dando respostas, explicando as experiências que foi fazendo ao longo dos anos com os seus alunos. Tudo isto à luz da economia comportamental, que o próprio define no livro como "um campo relativamente novo que aborda aspectos simultaneamente psicológicos e económicos". E é assim que tenta compreender o comportamento humano e a forma como se processam as nossas decisões.

Chega à conclusão, por exemplo, que a teoria da economia convencional de que os preços resultam de um equilíbrio entre duas forças - a oferta e a procura - é uma "ideia elegante", mas assenta num pressuposto errado: o de que as duas forças são independentes. Na verdade, diz, o valor que as pessoas estão dispostas a pagar é facilmente manipulável.

"Somos bem menos racionais do que a economia tradicional pressupõe e os nossos comportamentos irracionais não são nem aleatórios nem destituídos de sentido. São sistemáticos, e como os repetimos vezes sem conta, também são previsíveis." Por isso, não somos só irracionais, mas "previsivelmente irracionais".


Os truques do anúncio da revista "The Economist"

Num anúncio da revista "The Economist" para novos assinantes, colocavam-se três hipóteses aos potenciais assinantes:
- Assinatura da Economist.com por 59 dólares;
- Assinatura da revista impressa por 125 dólares;
- Assinatura impressa e "on-line" por 125 dólares.

A pergunta que se segue é: quem poderia estar interessado apenas na opção impressa quando, pelo mesmo preço, poderia ficar com as duas? Dan resolveu fazer o teste aos seus alunos do MIT. Perante as três opções, dos 100 alunos consultados, apenas 16 optaram pela assinatura "on-line", nenhum escolheu a hipótese da revista e 84 optaram pela assinatura conjunta do "on-line" com a revista. Para testar melhor a sua tese, Dan resolveu retirar a hipótese do meio e testar o anúncio das assinaturas noutro grupo de alunos. Aí, os resultados foram bem diferentes: a maioria acabou por escolher apenas a assinatura "on-line" por 59 dólares.

Conclusão: Tomamos decisões por comparação. "Não só tendemos a comparar as coisas como também tendemos a fazê-lo entre coisas comparáveis e a evitar as que não podemos comparar facilmente." A revista "The Economist" sabia disso e foi por isso que colocou a hipótese do meio, apenas para que as pessoas pudessem comparar e considerassem que fariam uma melhor escolha se optassem pelo pacote que lhe dava mais coisas pelo mesmo preço.

Dicas:
Segundo Dan Ariely podemos controlar os "círculos" à nossa volta e movermo-nos para círculos mais pequenos que incrementem a felicidade relativa. Por exemplo, se estivermos numa reunião de curso e no círculo do meio todos se estiverem a gabar de quanto ganham, podemo-nos afastar para conversar com outra pessoa. Também podemos alterar uma focalização estreita para uma focalização mais abrangente. Por exemplo, achamos fácil gastar três mil dólares nuns estofos de cabedal num carro de 25 mil dólares. Olhando de uma forma mais abrangente, podemos pensar no que podíamos fazer com os três mil dólares.


A importância do primeiro preço: o caso das pérolas negras

Por que motivo as pérolas são tão caras? Se calhar já fez esta pergunta a si próprio. Dan Ariely conta a história no seu livro. Um comerciante de diamantes, após a II Guerra Mundial, conheceu um homem que o convenceu a entrar no negócio das pérolas negras do Taiti. O negócio das pérolas cinzentas metalizadas começou por não correr bem, até que o negociante foi ter com um amigo, lendário comerciante de pedras preciosas. O truque foi colocar as pérolas negras numa montra da 5ª Avenida, em Nova Iorque, com um preço escandalosamente alto e publicar um anúncio num jornal onde as pérolas pretas brilhavam ao lado de diamantes, rubis e esmeraldas. Foi um sucesso.

Conclusão: Quando compramos um produto novo a um determinado preço, ficamos ancorados a esse preço inicial. Apesar dos preços iniciais, como as pérolas de Assel, serem "arbitrários", escreve Dan Ariely, "uma vez estabelecidos na nossa mente não só moldam os preços actuais como os futuros." Isto influencia todos os tipos de compras. Mesmo no dinheiro que se gasta num simples café. Criando o hábito, por exemplo, de consumir um café caro no Starbucks cria-se um padrão de consumo e assume-se que é assim que queremos gastar o dinheiro.

Dicas:
Para dar a volta a este comportamento previsivelmente irracional, a ideia é ganhar consciência das nossas vulnerabilidades, diz Dan Ariely. Depois, questionar os hábitos e perguntar qual o real prazer que se retira de um determinado hábito de consumo. Além disso, "devemos prestar atenção à primeira decisão que tomamos no que vai ser uma longa cadeia de decisões". "A primeira decisão é crucial", afirma.


O poder de atracção do "grátis"

Porque é que o "GRÁTIS!" nos deixa tão contentes, começa por perguntar Dan Ariely. Numa experiência para testar o valor do "GRÁTIS!", decidiu pôr-se à venda chocolates. Vendiam-se trufas da Lindt - chocolates de elevada qualidade que custam cerca de 30 cêntimos - por 15 cêntimos cada e chocolates Kiss a 1 cêntimo. As pessoas compararam a qualidade e preço e 73% compraram os Lindt e apenas 27% escolheram os Kiss. Para ver o impacto do "grátis", desceram 1 cêntimo no preço dos chocolates: os Lindt passaram a custar 14 cêntimos e os Kiss passaram a ser grátis. Resultado, os Kiss passaram a ser os favoritos (escolha de 69% dos clientes), apesar de terem descido o mesmo 1 cêntimo dos Lindt.

Conclusão: A questão crítica surge quando o grátis se torna numa luta entre um produto que custa dinheiro e outro que não custa nada. Quando uma coisa é grátis, esquecemo-nos do lado negativo de uma transacção. "Acho que os humanos têm um medo intrínseco de perder e a verdadeira solução do GRÁTIS! relaciona-se com esse medo."

Dicas:
O grátis pode levar-nos a tomar más decisões, abdicando de um produto que satisfaz melhor as nossas necessidades por outro de pior qualidade mas que tinha o atractivo de ter qualquer coisa grátis. Dan Ariely dá vários exemplos para mostrar que vale a pena reflectir antes de embarcar na palavra GRÁTIS!

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