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Hedge fund mais rentável do mundo agora é um radical das alterações climáticas

Hohn está a levar as suas táticas agressivas para o combate contra o aquecimento global.

25 de Janeiro de 2020 às 12:00
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O que não falta na indústria de hedge funds são profissionais com estratégias agressivas, mas poucos são tão duros como Chris Hohn. O bilionário britânico leva o típico manual a novos níveis - fechando acordos, pressionando para destituir CEO e enfrentando empresas com processos e ameaças. Um oponente ficou tão irritado depois de perder uma batalha na sala de reuniões com Hohn que intitulou um livro sobre a experiência: "Invasion of the Locusts" (invasão dos gafanhotos). Esta abordagem tornou o TCI Fund Management de Hohn no maior e com melhor desempenho hedge fund do mundo no ano passado.

 

Agora Hohn está a levar as suas táticas agressivas para o combate contra o aquecimento global. O gestor de ativos, com 30 mil milhões de dólares em carteira, pressiona as empresas do seu portfólio a reduzirem as emissões poluentes e divulgarem a pegada de carbono. Se não o fizerem, Hohn diz que vai destituir conselhos de administração ou vender ações. Para que ninguém duvide do seu compromisso: Hohn e a sua instituição de caridade doaram 200 mil libras ao Extinction Rebellion, o movimento radical de combate às alterações climáticas cujos membros bloquearam o tráfego em Londres e um terminal de jatos particulares.

 

"Na guerra contra os combustíveis fósseis, não pode ser muito exigente com os seus aliados", diz Jeremy Grantham, cofundador da gestora de ativos GMO, de Boston, um investidor lendário que há muito tempo alerta sobre a catástrofe climática. Hohn "mostrou que com muita pressão é possível causar um grande impacto nas empresas".

 

Para Hohn, 53 anos, um financeiro racional e muito discreto, com fortuna de 2 mil milhões de dólares, a sua campanha é apenas o primeiro passo para abalar a indústria de gestão de ativos que, segundo ele, ignorou uma crise planetária. Pede aos investidores que demitam gestores de ativos que não pressionam as empresas a reduzirem a pegada de carbono e quer que bancos parem de conceder empréstimos a companhias que ignoram as alterações climáticas.

 

Ainda assim, apesar de todo o zelo de Hohn, a sua cruzada está repleta de inconsistências no investimento verde. O TCI já teve uma grande participação num produtor de carvão da Índia; o fundo ainda possui participações em três empresas de ferrovias que queimam toneladas de diesel e transportam combustíveis fósseis, inclusive de areias betuminosas, uma das piores fontes de gases poluentes. Outra posição importante: na Ferrovial, o conglomerado com sede em Madrid que opera aeroportos como o Heathrow, em Londres.

 

"Por um lado, está a tentar ser verde e, por outro, ganha dinheiro com poluidores", diz Jacob Schmidt, presidente da Schmidt Research Partners, uma empresa de investimentos de Londres. "A questão é: quão comprometido realmente está ao seguir seus princípios?"

 

Hohn diz que é muito mais produtivo pressionar empresas intensivas em carbono do que ignorá-las. Em 30 de novembro, o TCI enviou cartas aos CEO das 17 empresas da sua carteira com instruções específicas sobre as deficiências que devem ser corrigidas. O TCI disse que votará contra diretores de empresas que não atingirem metas, bem como auditores que não reportarem "riscos climáticos materiais", e que pode até vender todas as ações nas empresas não cumpram.

 

Numa carta à Ferrovial, Hohn reconheceu que "descarbonizar" aeroportos é um enorme desafio e elogiou a nota "A" da empresa por divulgar as emissões de dióxido de carbono. No entanto, o TCI disse que a meta da Ferrovial de reduzir as emissões em quase 30% até 2030 pode ser aumentada e pediu à empresa que apoie medidas como um imposto sobre o carbono e um mandato para que companhias aéreas passem a usar combustível de aviação mais verde.

 

O gestor disse à Canadian Pacific Railway que o seu método de divulgação de emissões obteve nota "C" pela organização sem fins lucrativos Carbon Disclosure Project e que o plano da empresa ferroviária de aumentar a avaliação para um "B" ainda seria "insatisfatório". O TCI, maior acionista desta empresa com participação de 8%, disse que exige que a cotada tenha um "plano confiável e divulgado publicamente" para reduzir as emissões e que atenda a sete objetivos, como a compensação de emissões de viagens corporativas e melhor eficiência energética das instalações. A Canadian Pacific diz que mantém um diálogo com acionistas sobre temas como sustentabilidade e que há muito tempo divulga as suas emissões de forma a melhorar as suas práticas. Hohn não quis conceder uma entrevista para este artigo.

 

Hohn lançou o TCI e uma instituição de caridade afiliada, a Children’s Investment Fund Foundation, em 2004, depois de ganhar reputação como especialista em escolher ações no escritório de Londres da Perry Capital, um hedge fund com sede em Nova Iorque. A então esposa, Jamie Cooper, que Hohn conheceu em Harvard no início dos anos 90, administrou a fundação, e tornaram-se um casal de poder em Londres quando o TCI investiu dinheiro na instituição de caridade.

 

Graças a Hohn, a fundação possui 5,1 mil milhões de dólares para financiar programas como a melhoria da nutrição de jovens em comunidades carentes, proteção de adolescentes contra a escravidão e tráfico de humanos e expansão do tratamento pediátrico do HIV em África. Hohn e Cooper trocavam informações regularmente com Bill e Melinda Gates e, em 2012, David Cameron, então primeiro-ministro britânico, convidou Hohn para falar numa cimeira sobre desnutrição na sua residência oficial.

 

No TCI, a "onda" era decididamente mais mercenária. Hohn desenvolveu uma estratégia de investimento baseada na sua própria estrutura "pessoal, intelectual e emocional", como disse à juíza Jennifer Roberts, que conduziu o seu divórcio em 2014, o que resultou num acordo de 337 milhões de libras para Cooper. A abordagem de Hohn significava conduzir análises meticulosas e procurar empresas com equipas de gestão fracas que outros investidores evitam. "Pense nisso como o departamento de produtos danificados de uma loja, onde você pode obter descontos de 80% a 90% porque a maioria das pessoas não compra", disse Hohn numa entrevista em vídeo à revista Institutional Investor em 2013.

 

Combater o aquecimento global testará a abordagem de Hohn como nunca. Primeiro, aposta que as empresas vão responder às suas exigências e, depois, que não reduzirá os retornos desestabilizando empresas que as rejeitam. Ao vincular a sorte do TCI a uma agenda de combate às alteraçoes climáticas, Hohn aposta que os riscos económicos da crise crescente são tão grandes que seria tolice não estimular empresas a tomar medidas concretas sobre as emissões.

 

"Investimento verde e hedge funds não são termos que muitos investidores colocariam na mesma frase", diz Marc de Kloe, sócio da Theta Capital Management, em Amesterdão, e investidor no fundo do TCI. "No entanto, temos defendido a ideia de que os hedge funds são, de alguma maneira, mais adequados para implementar políticas verdes fortes, devido à sua natureza e capacidade de implementar táticas ativistas."

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