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Análise: Polémica acesa nas telecomunicações
A polémica nas telecomunicações continua. Os novos operadores e a PT não se entendem. Para os primeiros há lentidão na liberalização. Para a segunda há falta de investimento em rede. Aos consumidores resta esperar por melhores dias.
No seminário «As Comunicações e a Sociedade Portuguesa» promovido pela AESE (Escola de Direcção de Negócios), sentados à mesma mesa, PT Comunicações e novos operadores pareciam estar de costas voltadas. De um lado, Carlos Antunes, presidente da PT Comunicações e no outro, Diogo da Silveira e Adelino Santos, presidente da Novis e da Teleweb, respectivamente.
Os novos operadores dizem-se insatisfeitos com os atrasos na liberalização do sector das telecomunicações. Querem oferecer o mais rápido possível acesso à Internet de banda larga concorrente da TV Cabo.
Imputam à PT os atrasos na liberalização do sector. A PT Comunicações, contrapõe afirmando que o problema reside na falta de investimento na construção de uma rede alternativa à da PT.
Em resposta, os novos operadores reclamam que a construção de rede de telecomunicações implica um «elevado investimento», acusando, ao mesmo tempo, a PT Comunicações de beneficiar da utilização dos resultados obtidos com o usufruto de uma posição monopolista para investir em rede.
Os novos operadores dizem que a luta é desigual e que o Instituto de Comunicações de Portugal (ICP) e a Direcção-geral de Concorrência deviam intervir. Mas, a PT Comunicações assegura que os novos operadores pretendem é uma «regulação assimétrica» das regras de mercado.
Enquanto há desentendimento quem mais fica prejudicado é o consumidor que fica sem beneficiar das vantagens da concorrência, em particular, das diversas ofertas de acesso à Internet de banda larga em regime de tarifa única («flat rate») mensal.
Investimentos em redeA PT Comunicações investiu, entre 1998 e 2000, na construção da rede de fibra óptica, um valor aproximado a 1,093 mil milhões de euros (219 milhões de contos), disse Carlos Antunes no seminário promovido pela AESE.
Carlos Antunes revelou ao Canal de Negócios que em 2001 o valor do investimento em rede da PT Comunicações deve «rondar os 289 milhões de euros (58 milhões de contos) praticamente o mesmo montante investido no ano anterior».
Para Carlos Antunes, não são visíveis os investimentos dos novos operadores em rede própria de fibra óptica ou rede de acesso directo via rádio (FWA).
Em traços largos, Carlos Antunes avisou os novos operadores que «sem investimentos não há redes próprias».
Os novos operadores admitem que investiram na construção de rede, mas estes investimentos estão aquém do valor pretendido.
A Teleweb prevê investir, no período entre 2000 e 2002, um valor de 62 milhões de euros (12,4 milhões de contos) na construção da rede fibra óptica e rede FWA, adiantou Adelino Santos, presidente da Teleweb ao Canal de Negócios.
Deste investimento, um total de 19,22 milhões de euros (3,8 milhões de contos) será investido na construção da rede de fibra óptica, um valor de 39 milhões de euros (7,8 milhões de contos) na construção de rede FWA e o restante no acesso indirecto, acrescentou Adelino Santos.
Diogo da Silveira revelou ao Canal de Negócios que serão investidos, em 2001, «milhões de contos» na construção de rede própria de telecomunicações, escusando-se a especificar o valor desse investimento. Em construção de rede, a Novis estima investir, até 2005, 159,6 milhões de euros (32 milhões de contos).
A Jazztel Portugal prevê investir, até 2004, na construção de uma rede própria de telecomunicações fixa (via rádio e de fibra óptica), um valor de 250 milhões de euros (50 milhões de contos).
Intervenção da Direcção-geral de ConcorrênciaMira Amaral, ex-ministro e actual administrador da operadora de televisão por cabo TVTel, diz que a Direcção-geral da Concorrência teve uma atitude negligente por permitir à PT investir os lucros gerados com base numa posição monopolista no mercado, noutra actividade, como é a construção de rede de fibra óptica.
Adelino Santos partilha a mesma opinião adiantando que «é complicado competir» com uma empresa que utiliza os recursos gerados numa base monopolista na aquisição de empresas fornecedoras de conteúdos indispensáveis ao desenvolvimento do negócio de fornecimento de Internet e televisão digital.
Adelino Santos quer «DLL no fio de cabo»Adelino Santos afirmou no mesmo seminário que «não é aceitável que uma empresa detenha o monopólio da rede de cabo», sublinhando que esta é uma «área vazia de regulação».
Para Adelino Santos, fala-se em liberalização do sector das telecomunicações, mas não se fala em desagregação do lacete local (DLL), ou seja, abertura da rede de cabo da PT aos outros operadores. Este executivo alerta ainda para o facto da liberalização apenas incluir o lacete local, não os restantes acessos.
Carlos Antunes contrapõe assegurando que os novos operadores pretendem é «uma regulação assimétrica» das regras do mercado. Lembra que os novos operadores poderiam ter investido na rede de cabo, por terem licenças de televisão por cabo regionais.
Em resposta, o presidente da Teleweb evidencia a forte influência do Grupo Portugal Telecom (PT) junto das autarquias para autorização de passagem de cabo e alvarás, posição essa que, no seu entender, não é detida pelos restantes operadores que têm visto também na falta de autorizações nas autarquias um obstáculo ao desenvolvimento da rede de fibra óptica e cabo.
Diogo da Silveira diz que custos de interligação no ADSL são «insustentáveis»O preço proposto pela PT Comunicações no aluguer mensal de cobre por cliente para ofertas de serviços de banda larga (ADSL) é considerado por Diogo da Silveira como «insustentável».
Segundo Diogo da Silveira, o valor é «muito superior» ao valor de uma assinatura mensal cobrado pela PT, facto que levanta dúvidas quanto à posterior viabilidade do negócio de fornecimento de serviços de banda larga.
Para Diogo da Silveira sem acesso à Internet de banda larga «não há massificação da Internet», sublinhando que só faz sentido lançar oferta em regime de tarifa única mensal em acesso de banda larga.
Para tal, é preciso que os operadores, a PT Comunicações e o ICP cheguem a acordo sobre toda a oferta comercial da PT, acrescenta o presidente da Novis.
Carlos Antunes escusou-se a adiantar ao Canal de Negócios o valor proposto pela PT, mas este deverá rondar os 15 euros (3.000 escudos). Contudo, o valor do aluguer mensal de cobre por cliente será acrescido de uma sobretaxa no caso da oferta de serviços de banda larga.
AntecedênciaApesar da polémica confrontar o operador incumbente e os novos operadores que pretendem garantir uma quota de mercado que torne viável o negócio das telecomunicações, Carlos Antunes admitiu ao Canal de Negócios que deveria ter existido com «alguma antecedência um trabalho de preparação» para a entrada em vigor da liberalizaçao do sector.
Constata este facto, mas diz que a PT Comunicações também teve que alterar num curto espaço de tempo o seu modelo de negócio.
Adelino Santos e Diogo da Silveira dizem que ainda falta muito para fazer. O presidente da Teleweb adiantou que o ICP poderia ter um «papel mais activo como “alta autoridade para a concorrência” e que «ainda existe em Portugal um mercado de monopólio».
Para Diogo da Silveira ainda «está tudo por acontecer» e diz que «nos sentimos prejudicados com isso». O presidente da Novis quer «é ter acesso à infra-estrutura».
Carlos Antunes responde afirmando que para ter acesso à infra-estrutura é preciso investir em rede.
Para o presidente da PT Comunicações, os novos operadores querem aproveitar-se e «não querem investir em rede querem é uma regulação assimétrica» que lhes favoreça. Pelos vistos, ninguém se entende nas telecomunicações. Estima-se que o ICP ainda vai ter muito com que se preocupar.