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Os lobinhos de Wall Street

Depois de ultrapassada a crise provocada por ela própria, Wall Street enfrenta agora uma nova e inesperada realidade: escolher a banca como primeiríssima opção de carreira por parte das mentes jovens e brilhantes que saem das melhores universidades do mundo já não é uma certeza inabalável. E os motivos para tal são vários

28 de Fevereiro de 2014 às 11:48
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Talvez seja ainda apressado chegar a alguma conclusão ou afirmação de que estamos perante um fenómeno de “suicídios em série” depois de, ao longo dos últimos seis meses, terem sido seis os jovens que saltaram, literalmente, para a morte em locais tão distintos como os Estados Unidos, Hong Kong ou Londres. Em comum, tinham o facto de trabalharem na área financeira, cuja cultura de pressão e de longas horas de trabalho é sobejamente conhecida e inspiradora de muitos estudos, livros e filmes. Se é verdade o velho ditado que reza que “quem corre por gosto, não cansa” poderia ser utilizado neste contexto, existem vários ângulos através dos quais se pode olhar para este fenómeno. Sim, a ganância desmedida parece continuar a ditar as regras no mundo financeiro; trabalhar em Wall Street já não é sinónimo de se chegar (para os que aguentam) a milionário antes dos 30 anos e, lentamente, a cultura da alta finança está a sofrer alguns ajustamentos. Estas três afirmações podem ser consideradas contraditórias, mas a verdade é que todas elas espelham várias realidades.


Em 1989, e numa obra semi-biográfica, Michael Lewis escrevia o livro “Liar’s Poker”. Saído da prestigiada universidade de Princeton, passando pela não menos reconhecida London School of Economics, o autor conseguiu uma almejada posição numa das primeiras firmas de investimento de Wall Street, a Soloman Brothers. O livro relata a sua ascensão ao longo de três anos na escadaria dourada do paradisíaco inferno financeiro, ao mesmo tempo que descreve os bastidores da ganância, gula e fortunas escandalosas que tão bem o caracterizavam e, é claro, tem como base o escândalo que abalou a poderosa instituição financeira em meados dos anos de 1980.


E Wall Street foi, principalmente desde esta data, palco dos mais turbulentos e suculentos negócios, de lucros chorudos e do endeusamento de excessos, tão bem retratados no recente filme “O Lobo de Wall Street” ou no próprio “Wall Street” , cuja sequela deu origem a “O dinheiro nunca dorme”. Na altura, a intenção de Lewis com a publicação deste livro ao qual chegou a chamar um “manual de utilizador” – desencorajar as jovens elites a começarem as suas carreiras em Wall Street – teve exactamente o efeito contrário. E os excessos viraram sinónimo de “muito sucesso”.


Mas então onde reside a novidade face aos dias de hoje? Para já, num livro lançado há poucos dias, naquilo que se poderá chamar de “timing mais do que perfeito”. E porquê? Por variadas razões. Perfeito devido à atenção que os meios de comunicação estão a dar actualmente a estas mortes “coincidentes”, ao facto de algumas das mais poderosas instituições de Wall Street terem começado a sugerir que não querem que os seus jovens e promissores trabalhadores se matem (literalmente) a trabalhar sete dias por semana e também porque é o primeiro livro do género a “olhar” para Wall Street no período pós-crash de 2008, tendo os jovens como personagens principais.


Intitulado Young Money: Inside the HiddenWorld of Wall Street’s Pot-Crash Recruits, o livro, escrito pelo jornalista Kevin Roose, relata a vida de oito jovens recrutados pela Goldman Sachs e pelo Bank of America Merrill Lynch, os quais desobedeceram (anonimamente, é claro) às restritas cláusulas de “não divulgação” obrigatórias nas políticas destas instituições. Ao longo de três anos, o igualmente jovem autor (que escreve para a New York Magazine) teve acesso, através de longas entrevistas, aos bastidores dos empregos de sonho - que rapidamente se tornam em pesadelo – destes oito juniores, todos eles mentes brilhantes saídos das mais reputadas universidades norte-americanas e que, entre si, cobrem às áreas do trading, das fusões e aquisições e da gestão de risco.


Atentemos, então, à diferença número um: se, em 2006, a universidade de Princeton enviava 46% dos seus melhores alunos para Wall Street, em 2012, apenas 11,5% dos mesmos manifestaram interesse em escolherem o caminho da alta finança para as suas vidas. Esta pode ser uma das razões para o “aligeirar” das exigências em termos de devoção total ao trabalho (e ao dinheiro) que as grandes firmas de Wall Street começam a manifestar. Um outro dado interessante: se, antes do crash de 2008, trabalhar na banca significava a “default option” para os talentosos ambiciosos, esta está a ser gradualmente substituída por um novo império de “caça ao emprego”. Com uma cultura muito mais “cool”, inovadora, optimista e igualmente bem paga (em alguns casos, até mais materialmente recompensadora), Silicon Valley está agora no mapa das preferências dos alunos de elite. “Trabalhar hoje na Google ou no Facebook significa o mesmo do que trabalhar na Goldman há uns anos”, afirma Kevin Roose. E isso significa que Wall Street já não tem o glamour de outros tempos? Sim, pelo menos e face ao período dourado dos últimos 20, 30 anos (exceptuando os anos da crise), o sector poderá estar a sofrer de uma “crise de recrutamento”.

 

 

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