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Hoteleiros defendem reformulação do modelo da taxa turística
Bernardo Trindade, presidente da associação que representa os hoteleiros em Portugal, lamentou que a Comissão Técnica independente para o novo aeroporto não tenha tratado “com a mesma dignidade” as respostas a curto prazo que o país necessita. E apelou aos partidos que desenhem instrumentos financeiros direcionados para o turismo.
2023 foi o ano de todos os recordes para o turismo, com o setor a registar 25 mil milhões de euros de receitas turísticas. No entanto, o presidente da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP) alerta que há alguns desafios pela frente. Nesse sentido, na sessão de abertura do congresso da associação, que passados 32 anos voltou a realizar-se no porto seguro da Madeira, deixou alguns apelos.
"Depois de uma pandemia que paralisou por completo a nossa atividade, com duas guerras que infelizmente se mantêm activas, conseguimos mais rapidamente do que qualquer um de nós previa recuperar a confiança dos nossos clientes, restabelecendo a nossa actividade. Méritos vários distribuíveis por toda a família do setor", sublinhou o empresário madeirense.
Bernardo Trindade, que falava para uma plateia com vários empresários do setor e representantes do Governo Regional da Madeira, incluindo Miguel Albuquerque, lembrou que o setor teve resultados "extraordinários". "Sim, é verdade, o Governo diz-nos que batemos recordes mês após mês nos indicadores mais importantes de receita. Mas também é verdade, e aqui tenho de trazer uma novidade, mês após mês batemos recordes na estrutura de despesa. É escolher o item...salários, bens alimentares, eletricidade e gás, serviços prestados", apontou. Ainda assim, "felizmente os resultados foram positivos", acrescentou.
Um dos desafios que o setor continua a enfrentar está relacionado com o aeroporto de Lisboa que está a funcionar praticamente na capacidade máxima.
"Quando falamos da procura por Portugal, sabemos todos que ela está condicionada. E há muito tempo. Está condicionada por que a nossa principal porta de entrada no país, servindo todo o país, o aeroporto de Lisboa está condicionado. Só em 2023, segundo a ANA Aeroportos, recusamos o equivalente a 1,3 milhões de lugares de avião, de companhias intercontinentais transportando clientes de alto valor aquisitivo", lamentou.
Bernardo Trindade aproveitou ainda para deixar algumas críticas à Comissão Técnica Independente responsável pelo relatório sobre a localização do novo aeroporto, argumentando que "não tenha tratado com a mesma dignidade as respostas a curto e médio prazo que Portugal tem de dar em termos de acessibilidades". E deixou a pergunta: "Podemos dar-nos a este luxo? Não me parece. Clientes que querem visitar, fruir, alimentar toda a nossa economia…"
O responsável lançou ainda o mote para a necessidade de reformular o atual modelo das taxas turísticas, defendendo que a AHP é "por princípio contra a banalização das taxas turísticas". "Hoje, são muitas as taxas, os compromissos, a logística que todo o Estado exige às empresas. Temos de prosseguir este caminho de redução da burocracia, de redução dos encargos fiscais e contributivos". "Ainda assim", continuou, "se a decisão soberana de criação da taxa se confirmar na Madeira [estando previsto arrancar este ano], a AHP inclina-se para uma taxa regional, que permita a distribuição equitativa entre todos".
"A Madeira é cada vez mais um binómio cidades e as experiências na natureza. Para prosseguir esse equilíbrio, a receita deve ser distribuída de forma equilibrada. E para que esse equilíbrio seja bem construído, entendemos que o modelo de governação e decisão sobre o destino a dar às verbas deve contar com representantes dos empresários da hotelaria. Defendemos e bater-nos-emos por este modelo em qualquer região ou município que decida pela implementação de uma taxa turística. É assim que trabalhamos em Lisboa, com a Câmara Municipal e com a AHRESP. Num comité de investimentos, com propostas, com discussão, com lealdade e com consensos", lembrou.
Pouco tempo depois, a presidente da Câmara Municipal do Funchal, Cristina Pedra, confirmou que a taxa vai mesmo arrancar em 2024 sublinhou se trata do município com "maior pressão" turística. "É uma taxa turística que já existe em tantos outros destinos e o critério utilizado para a cobrança são as dormidas. Nesse sentido é lógico que seja o Funchal a arrecadar a maior fatia de receita, dado que é na capital da Região Autónoma da Madeira que se encontra a maioria dos estabelecimentos hoteleiros", defendeu a autarca.
Apelos aos partidos
Durante a sua intervenção na abertura do congresso, Bernardo Trindade destacou que outro dos desafios que o setor tem pela frente está relacionado com "a conta de exploração das nossas empresas". "Sendo a hotelaria um setor de capital intensivo, assistimos a um aumento substancial dos encargos financeiros. O controlo inflacionista do BCE motivado pela guerra na Ucrânia levou ao aumento significativo das taxas de juro de referência. O resultado foi que os encargos das empresas hoteleiras duplicaram, os resultados da banca também, com o aumento da sua margem financeira, tudo isto sem alterar o nível de risco, apenas pelo efeito automático do aumento das taxas de referência".
Na esperança que se possa corrigir parte deste efeito já em 2024, apelou aos maiores partidos políticos neste período de pré-campanha - tal como já foi feito nos dois almoços com o PS e a AD promovidos pela Confederação do Turismo de Portugal - "para que as instituições financeiras públicas sob a responsabilidade do Estado, o Banco Português de Fomento e a Caixa Geral de Depósitos, sejam instrumentos ao serviço da economia e do turismo, procurando desenhar instrumentos financeiros adequados às necessidades do setor em articulação com o Turismo de Portugal". "Sejamos claros, outra qualquer agenda não nos serve. Se são empresas públicas, e respeitada a sua autonomia de gestão, é tempo de relembrar os objetivos estratégicos do país, e os mesmos não podem passar indiferentes a estas instituições", alertou.
Outro tema que fez questão de trazer para reflexão no congresso é o tema da escassez de água na principal região turística do país, o Algarve. "Senhor Presidente da Turismo do Algarve, quero reafirmar aquilo que já disse pessoalmente: disponibilidade da AHP para trabalharmos e atuarmos em conjunto com as diversas entidades adotando medidas que façam uma melhor gestão deste recurso fundamental".
Além disso, chamou a atenção para "que decisões unilaterais quer de aumentos de preço, ou de forte racionamento, são apenas pensos rápidos num tema de vital importância para toda a população que vive e visita o Algarve".
*A jornalista viajou a convite da AHP