Notícia
Seis trabalhos da nova administração da TAP
A nova equipa da companhia aérea nacional tem pela frente seis grandes desafios..
- 1 - Concretizar a reestruturação
- 2 - Incertezas na retoma da aviação
- 3 - Conseguir lucros em 2025
- 4 - Assegurar paz social
- 5 - Resistir à pressão da concorrência
- 6 - Empresa pública, pressão política
A implementação do plano de reestruturação da TAP, que tem ainda de ser aprovado pela Comissão Europeia, é o grande desafio que tem pela frente a nova administração da companhia aérea, do qual dependem vários outros.
O plano, que foi entregue a Bruxelas a 10 de dezembro do ano passado, prevê a redução do número de trabalhadores, de aviões e rotas, e admite que a transportadora possa vir a precisar de apoios entre 3,4 e 3,7 mil milhões de euros até 2024, valores que já incluem os 1,2 mil milhões de euros injetados na TAP no ano passado. O Governo já disse esperar que a companhia se consiga financiar no mercado até 2024 e prevê que em 2025 comece a devolver dinheiro ao Estado. O Executivo chegou a acreditar que Bruxelas aprovasse a proposta de reestruturação ainda no primeiro trimestre deste ano, mas a conclusão das negociações tem vindo a derrapar. O que deixa por esclarecer se poderão ser ainda impostas condições, como é o caso da cedência de slots ( faixas horárias nos aeroportos) à semelhança do que a Comissão já exigiu a outras companhias, algo que poderia condicionar a capacidade de recuperação da TAP.
CEO interino da TAP
A pandemia ainda não terminou, nem os efeitos negativos que tem tido sobre o setor da aviação, que prevê atingir o tráfego que tinha em 2019 apenas em 2023, segundo as projeções da Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA, na sigla inglesa). Nas estimativas divulgadas em maio passado, a entidade aponta para que este ano o número de passageiros fique em 52% do total de 2019 e em 2022 chegue a 88%. Como as restantes companhias aéreas mundiais, a TAP tem sido impactada pelas restrições impostas pelos países para travar os contágios, o que levou, em fevereiro e março passados, a que a companhia tivesse operado apenas 7% da sua capacidade. Já em maio deste ano, de acordo com dados da Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC), a TAP transportou mais 24% de passageiros do que no mês de abril, num total de cerca de 261 mil. Um número que revela um aumento de 2050% face a maio de 2020, mas que comparativamente com o mesmo mês de 2019 mostra ainda uma quebra de 83%. Em março, a TAP chegou a anunciar a intenção de operar 879 voos e 100 rotas por semana este verão, mas como tem alertado o seu CEO interino, Ramiro Sequeira, as projeções de retoma são incertas.
Sem a retoma da operação e sem reestruturação, a TAP não pode aspirar a conseguir resultados. Em 2020, devido à pandemia, a companhia aérea apresentou prejuízos históricos de 1.230 milhões de euros (12 vezes mais do que as perdas de 106 milhões de euros registadas em 2019), depois de forçada em março a aterrar a sua frota, resultando numa queda das receitas a pique. Já no primeiro trimestre deste ano a transportadora perdeu 365,1 milhões de euros pelo impacto da covid-19, que "continuou a atrasar a recuperação da procura, com um aumento dos casos e novas restrições nas viagens", justificou no comunicado em que revelou as contas de março. O cenário do Governo é que a TAP tenha perdas acumuladas de receitas no montante de 6,7 mil milhões de euros até 2025, ano em que, segundo o plano de reestruturação entregue a Bruxelas, a companhia terá de apresentar lucros. Com as incertezas da retoma, a transportadora vai redimensionar-se, cortando custos, desde logo, com trabalhadores e frota. A meta assumida é de uma redução acumulada da massa salarial de 1,4 mil milhões de euros e da diminuição do número de aviões de 108 para 88.
Ministro das Infraestruturas
A TAP conseguiu, em fevereiro passado, fechar acordos de emergência com todas as estruturas representativas dos trabalhadores para reduzir custos até 2024. A generalidade dos profissionais aceitou cortes salariais de 25%, mas no caso dos pilotos a redução acordada chega aos 50% este ano. Os entendimentos, que a administração da companhia e o Governo consideraram "históricos", prometiam assegurar a paz social durante o período em que a transportadora terá o plano de reestruturação para concretizar. Os acordos permitiram atenuar, mas não compensar na totalidade, o número inicial de 2.000 trabalhadores em excesso na empresa, levando a TAP a avançar com um processo de medidas de adesão voluntárias, como rescisões amigáveis, reformas antecipadas e pré-reformas ou trabalho a tempo parcial. O grupo assegurou assim nova redução dos seus quadros, mas manteve-se ainda com mais de 200 trabalhadores em excesso, aos quais comunicou já a sua saída do regime de lay-off para poder avançar para um despedimento coletivo em julho. A primeira ameaça à paz social já partiu do sindicato dos pilotos que, ao Expresso, deixou claro que se a TAP despedir pilotos haverá uma guerra judicial.
A pressão concorrencial das "low-cost" não é novidade para a TAP, que mesmo na pandemia continuou a sentir a guerra comercial. Mas além da concorrência de preços, estas companhias contestam as ajudas públicas atribuídas e pressionam para que seja forçada a uma redução de "slots" (faixas horárias nos aeroportos), o que no caso de Lisboa poderia pôr em causa o seu modelo de "hub". A Ryanair apresentou quase duas dezenas de recursos judiciais contra as ajudas públicas dadas às companhias europeias, entre as quais a TAP, que viu, neste processo, ser dada razão à "low-cost" irlandesa pelo Tribunal de Justiça da União Europeia em maio. Os efeitos da anulação do aval da Comissão à ajuda de 1.200 milhões de euros à TAP estão para já suspensos. Também o diretor-geral da Easyjet Portugal admitiu, em entrevista ao Jornal Económico, estar muito atento a tudo o que são ajudas do Estado "para que elas sejam adequadas e equilibradas para não distorcer o mercado", avisando que, se a TAP não tiver de reduzir "slots" no quadro da reestruturação, a Easyjet terá "não só de se queixar, mas também de alertar as entidades responsáveis para o que seria uma forma de distorcer o mercado".
CEO da Easyjet Portugal
A TAP voltou no ano passado a ser controlada pelo Estado, que passou a ter 72,5% do capital, e poderá, na sequência da conversão de parte ou da totalidade do auxílio entregue em 2020 de 1.200 mil milhões de euros, passar a ter "90 e muitos por cento" da "holding" da transportadora aérea de bandeira portuguesa, ficando Humberto Pedrosa e os trabalhadores com participações residuais. Se até ao deflagrar da pandemia e à saída de David Neeleman a gestão da companhia estava entregue aos privados, a ajuda pública desencadeou uma maior intervenção do poder político, designadamente do ministro Pedro Nuno Santos, que abriu logo a porta de saída ao então CEO, Antonoaldo Neves. Desde essa altura têm sido várias as suas intervenções públicas sobre a TAP, seja na qualidade de ministro seja na de representante do acionista Estado, o que já levou a que alguns o apelidassem mesmo de CEO da companhia aérea. Só nos últimos meses envolveu-se em polémica com a Ryanair, indignou-se com o polémico vídeo de responsáveis dos recursos humanos gravado em Espanha e pronunciou-se sobre os despedimentos coletivos na empresa. Um papel interventivo que pode não ser bem recebido pela nova equipa de gestão.