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Inarbel: A fábrica que cresceu e “vestiu” as batas

Os têxteis da Inarbel espalham-se hoje por mais de 30 mercados, que recebem sobretudo a linha de roupa para bebé e criança. Mas, com a pandemia, a empresa teve de procurar uma nova vocação e encontrou-a nas batas hospitalares.

Cortesia Inarbel
31 de Maio de 2021 às 12:00
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José Armindo lidera hoje a empresa que viu os pais criar em 1984. Foi erguida na vinha do avô paterno, depois de a família ter tido nas feiras a primeira experiência como vendedora de têxteis. O atual CEO afirma ter estado próximo do negócio durante toda a vida, embora só se tenha tornado colaborador aos 29 anos - até então, a carreira passou-se nos campos de futebol. Quando se juntou à empresa, esta contava com 75 colaboradores. Agora, são 237.


As malhas que a Inarbel tece há quase 40 anos deram lugar a batas em tempo de pandemia. Esta empresa têxtil de Marco de Canaveses revirou os planos de modernização que tinha para 2020 e conseguiu até aumentar a faturação, embora os lucros tivessem ficado prejudicados com as mudanças.

"Estive três semanas quase sem dormir a pensar no que ia fazer", conta José Armindo, CEO da Inarbel. Era fevereiro, e portanto a covid-19 ainda não tinha chegado em força a Portugal, mas José Armindo já começava a receber as primeiras más notícias de clientes estrangeiros. "Comecei a receber a anulação de encomendas. Os meus comerciais e eu ligávamos para clientes e eles diziam ‘aguenta-te, não sabemos no que isto vai dar’ e ‘isto aqui na Alemanha, França, Espanha está um caos’", recorda o gestor.

400Investimento
O investimento que estava planeado para remodelações caiu. A Inarbel preferiu usar 400.000 euros para passar a produzir batas.

Em cima da mesa da Inarbel já estava um projeto de renovação da fábrica, pronto para avançar. Contudo, a situação ditou que esse desse lugar a outro, menos ambicioso financeiramente e rumo a uma nova direção: a fábrica optou por investir 400 mil euros para que as habituais malhas de roupa para bebé e criança dessem lugar a batas hospitalares.

"Na altura ainda fiz vários contactos para a produção de máscaras, mas não tinha capacidade", conta o gestor. Assim, as batas começaram a invadir a fábrica, até representarem 80% da produção total entre junho e julho. Foram quase todas exportadas para Espanha. "Em Portugal há muita burocracia", afirma José Armindo, que justifica assim a opção de se virar para Espanha. Além disso, acrescenta, no país vizinho a indústria têxtil é escassa. Por cá, chegou a ter trabalhadores em lay-off mas depois acabou por ter de contratar, para dar resposta às novas necessidades, sem pelo caminho ter feito despedimentos.

9Faturação
O ano de 2020 terminou com uma faturação de 9 milhões de euros para a Inarbel, apesar de no início a produção ter quebrado perto de 70%.

Foi desta forma que uma quebra inicial de 60% a 70% na produção se acabou por reverter, e a fábrica de Marco de Canaveses conseguiu arrecadar um volume de negócios de 9 milhões de euros em 2020, mais do que os 8 milhões do ano anterior. O aperto fez-se antes notar nas margens, e o lucro foi inferior ao de 2019.

Faltam apoios e mãos

Se durante a pandemia foi possível contornar os danos, "agora é que vão ser elas. Agora é que vamos ver onde isto vai parar", afirma José Armindo, que se confessa "extremamente preocupado" com o ano de 2021. "A pandemia ainda não acabou. Mas se o Estado colaborar, dentro de dois a três anos penso que estamos de novo em alta", prevê.

Para o CEO da Inarbel, "os apoios que vêm para Portugal devem apostar em grande nas micro, pequenas e médias empresas", tendo em conta a representatividade que estas possuem no tecido empresarial português. O empresário acredita que é importante que estas empresas consigam "rejuvenescer" com investimento que lhes permita tornarem-se mais competitivas. Isto pressupõe que o Governo não dirija os fundos da "bazuca" europeia para empresas como a TAP e o Novo Banco, onde estamos "constantemente a injetar" verbas, defende.

30Custos
O ano de 2021 já oferece algumas preocupações. O CEO da Inarbel aponta um aumento nos custos com matérias primas e energia de 30%. 

De momento, a dificuldade em contratar tem sido um dos maiores entraves à recuperação, diz José Armindo. Numa altura de grande incerteza, "as encomendas chegam muito tarde, mas querem-se entregas para já", o que impõe um reforço na cadeia de produção que não está a conseguir concretizar, não por falta de infraestrutura, mas sim de mão de obra. "Na semana passada recebi propostas de quatro clientes", que ainda está a negociar, mas diz ser "praticamente impossível" aceitar - tem a certeza de que pelo menos três vai ter de rejeitar. Para José Armindo, um dos grandes problemas é que os trabalhadores recebem quase tanto estando em situação de subsídio de desemprego como na fábrica, pelo que não se torna aliciante assinar um contrato. O CEO acredita que, aqui, o problema está na carga fiscal sobre as empresas, e defende que o Governo devia inclusivamente baixar o nível dos impostos para quem trabalha.

Paralelamente, os custos de produção estão a agravar-se, refere ainda o gestor. De 2020 para 2021, notou um aumento nos custos relacionados com matérias-primas e energia de cerca de 30%, o qual diz que não pode passar para os clientes.

Das feiras aos milhões

Hoje, a Inarbel fatura perto de dez milhões de euros e emprega 237 trabalhadores. O negócio que a fez crescer foi o vestuário de malha para bebé e criança, que representa três quartos do total da produção. O resto são malhas para homem e senhora.

A aposta da Inarbel mudou nos anos 2000, forçada pela concorrência chinesa. Com os clientes de grandes quantidades a escolherem cada vez mais o gigante asiático como fornecedor, uma vez que ali as peças custavam três vezes menos a produzir, a fábrica de Marco de Canaveses começou a trabalhar com clientes mais pequenos e que procurassem valor acrescentado, em vez de um produto mais básico, explica Armindo. As lãs, algodões e misturas que a Inarbel usa são compradas a empresas com certificados de qualidade, e dá a hipótese de personalizar. A Inarbel tem também as suas próprias marcas, a Dr. Kid e a A&J.

A empresa distribui os seus produtos por mais de 30 países, sendo que a maior exposição que possui é a Espanha, na ordem dos 20%, dada a proximidade. Mas o CEO, filho dos fundadores, recorda-se bem do início: os pais eram feirantes, e José Armindo acompanhava-os nestas andanças. Até ao dia em que estes compraram o primeiro tijolo, que se foi instalar numa vinha do avô paterno de José Armindo. Este último optou por uma carreira futebolística até aos 29 anos de idade, mas diz ter estado sempre interessado no negócio da família. Aliás, há aprendizagens que traz dessa vida, as quais reteve dos empresários que geriam os clubes por onde passou. O comendador Rui Nabeiro, que era o patrocinador da equipa do Campomaiorense, ensinou ao líder da Inarbel o "saber estar com as pessoas". José Armindo retornou à fábrica há cerca de 20 anos com estas lições, e gere-a há 15, "com muito gosto".

Com isto, já lá vão quase 40 anos de Inarbel, que atravessou várias crises e uma pandemia global. O CEO da empresa acredita que o segredo para a resiliência é "muita força, muita determinação, assim como gosto e vontade de trabalhar".

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