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Antigo Banco Pinto Leite que foi Café Embaixador é agora trono de hambúrgueres

O Burger King, “na grelha desde 1954”, toma o lugar de um histórico café do Porto inaugurado em 1956, onde antes funcionava a agência bancária de uma família que fez fortuna na Invicta, no Brasil e em Inglaterra, de onde um seu funcionário partiu a bordo do Titanic.

25 de Novembro de 2024 às 20:37
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Nascido em São Clemente, Loulé, a 16 de abril de 1871, José Joaquim de Brito já tinha trabalhado no Brasil e em Itália, e estava há dois anos na capital britânica como funcionário na agência bancária Pinto Leite & Nephews – que tinha escritórios em Londres, Manchester e Liverpool – quando decidiu regressar para junto dos seus pais, que viviam em São Paulo.

Ora, como os bilhetes para o Titanic eram comercializados pela Pinto Leite, José decide comprar um bilhete de 2.ª classe no "inafundável" navio, que faria a viagem inaugural de Southampton para Nova Iorque, onde trocaria de barco para chegar ao seu destino final. José tinha comprado o bilhete número 244360 por 13 libras, que equivaleriam atualmente a cerca de 1.500 euros.

O Titanic partiu a 10 de abril de 1912, tendo cinco dias depois – na véspera de José celebrar os seus 42 anos – colidido com um iceberg e afundado.

José foi um dos quatro portugueses que perderam a vida no mais conhecido naufrágio da história. Os outros eram agricultores madeirenses - Domingos  Fernandes Coelho (20 anos), José Neto Jardim (21 anos) e Manuel Gonçalves Estanislau (38 anos) -, que estavam na 3.ª classe.

Os corpos dos quatro portugueses que viajavam no Titanic nunca foram identificados.

"Perdeu-se um jovem, deixando uma tia idosa dependente em Portugal, trabalhando como ‘criada sem salário’, e o pai idoso dependente no Brasil", lê-se sobre José Joaquim de Brito nos arquivos da Cruz Vermelha.

A casa bancária Pinto Leite & Nephews viria a contribuir para o fundo de socorro às vítimas do naufrágio do Titanic, onde morreram mais de 1.500 pessoas, com 105 libras, que equivaleriam hoje a cerca de 12 mil euros.

Pinto Leite abre banco no Porto

Voltemos à agência bancária onde trabalhou José Joaquim de Brito. Os Pinto Leite notabilizaram-se como negociantes no Porto, em Lisboa, no Brasil e em Inglaterra.

Proprietários da Quinta da Gandarinha, em Cucujães, Oliveira de Azeméis, António Pinto Leite e Teresa Angélica Bernardina da Assunção Correia tiveram muitos filhos, muitos dos quais zarparam cedo para o Brasil, onde fizeram fortuna.

Um dos mais velhos, Joaquim Pinto Leite, regressou a Portugal em 1930, instalando-se no Porto, onde viria a abrir um estabelecimento de tecidos no Largo dos Lóios, que ficava no rés-do-chão do prédio em que residia.

Começou então a diversificar os negócios, dedicando-se também ao empréstimo de capital.

Com muitos familiares em Inglaterra, as movimentações de capital eram intensas. Decidiu então criar a casa bancária Pinto Leite, inicialmente em sociedade com os irmãos.

Em 1855 entrou no capital do recém-constituído "Banco do Porto", tendo ainda sido fundador do Banco Comercial, Industrial e Agrícola, em 1861.

Viria a falecer em 27 de Fevereiro de 1880. A inventariação dos seus bens atingiu a soma de 538.375 escudos, uma fortuna nessa altura.

Apesar de Portugal não ter entrado na II Guerra Mundial, a casa bancária Pinto Leite, que tinha passado para o seu filho homónimo, não sobreviveu a esses tempos.

A 30 de Janeiro de 1940, a Inspecção do Comércio Bancário comunicou à Joaquim Pinto Leite & Filhos que "o exame (…) efectuado à situação económica e financeira" da firma revelava que "alguns créditos concedidos [eram] excessivos em relação ao capital", relatando uma série de outras situações que obrigava a que "o capital e o fundo de reserva da firma" deviam ser "reforçados".

A solução chegaria dois anos depois: em Setembro de 1942 funde-se com o Banco Ferreira Alves, tendo a firma Joaquim Pinto Leite & Filhos sido dissolvida a 7 de Setembro desse ano.

O Banco Ferreira Alves e Pinto Leite viria, em 1965, a fundir-se com o Banco Nacional Ultramarino (BNU), que foi nacionalizado em 1974 e incorporado em 2001 na Caixa Geral de Depósitos (CGD).

Café Embaixador fecha ao fim de 65 anos à boca da Praça da Liberdade

Alguns anos antes, em 1957, nos dois primeiros pisos do edifício de cinco andares onde funcionava a agência bancária Pinto Leite no Porto, na Rua de Sampaio Bruno, junto à Praça da Liberdade, abria o Café Embaixador, um dos raríssimos a contrariar a tendência natural da época de converter cafés emblemáticos em grandes bancos.

Assumidamente um café de elite, era frequentado quase exclusivamente por homens, sobretudo de negócios, e apenas era permitido o acesso de clientes com gravata. Um porteiro permanente controlava as entradas no estabelecimento.

Entretanto, há meia dúzia de anos, o imóvel era vendido com o objetivo de serem convertidos os andares superiores em habitação de luxo, mantendo-se o café em funcionamento.

O Embaixador ainda durou quatro anos, mas viria a encerrar definitivamente a 12 de dezembro de 2022, deixando os seus 16 trabalhadores no desemprego.

25 de novembro de 2024: "O Burger King acaba de abrir as portas do seu novo restaurante no Porto, devolvendo aos portuenses um dos seus espaços de tertúlia e encontro mais emblemáticos da Baixa, o Café Embaixador", revela a cadeia de "fast food", em comunicado.

"Inaugurado em 1959, e encerrado desde 2022, o Café Embaixador ganha agora novas cores, depois um rigoroso trabalho de recuperação e preservação dos elementos arquitetónicos e artísticos do espaço, realizado por técnicos especialistas", realça o Burger King, afiançando que o espaço "mantém a memória de outros tempos, não só através do restaurado letreiro original ‘Café Embaixador’, como também dos painéis icónicos da autoria de Martins da Costa, do pavimento original em tijoleira, das escadas, corrimão e gradeamento do piso superior".

Com uma área de cerca de 350 metros quadrados e capacidade para 156 lugares distribuídos pelos dois pisos, este é o 9.º restaurante da marca na cidade e o 44.º no distrito do Porto.

A abertura do Burger King Café Embaixador faz parte do plano de expansão da marca, que prevê, "até final de 2024, alcançar a meta dos 200 restaurantes com a marca que está há já 23 anos" Em Portugal, onde diz empregar cerca de 4.500 pessoas.

 

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