Num ano em que o setor automóvel enfrentou diversas dificuldades a nível global – a guerra na Ucrânia, escalada nos preços da energia e problemas nas cadeias de fornecimento de componentes –, a indústria automóvel portuguesa alcançou o segundo melhor resultado de sempre.
As 322.404 viaturas produzidas nas cinco fábricas em Portugal apenas ficam atrás dos 345.688 veículos registados em 2019. É também apenas o segundo ano em que a produção do setor supera a fasquia das 300 mil unidades, número a partir do qual se é considerado um “país produtor automóvel” a nível mundial.
“A indústria automóvel nacional – incluindo a fileira dos componentes – demonstrou uma grande resiliência durante os últimos anos, apesar da pandemia e dos problemas entretanto surgidos”, diz ao Negócios Helder Pedro, secretário-geral da Associação Automóvel de Portugal (ACAP).
E o responsável não esconde a satisfação com os números do ano passado, que permitem que nos últimos cinco anos tenham saído das fábricas em Portugal mais de 1,5 milhões de veículos, ou seja, uma média anual superior às “famosas” 300 mil unidades.
“Estes últimos anos foram de consolidação de Portugal como país produtor automóvel. Isso, aliás, é reconhecido em todos os fóruns internacionais”, sublinha.
2022 entre os três melhores anos para principais fábricas
Para os números do ano passado contribuíram as principais fábricas – Autoeuropa, Stellantis de Mangualde e Mitsubishi Fuso.
Na fábrica de Palmela do grupo Volkswagen, o ano em que passou a produzir exclusivamente o T-Roc terminou com 231.100 unidades, o segundo maior volume de sempre. A Autoeuropa representa 71,7% da produção automóvel nacional.
Na Stellantis de Mangualde, o máximo histórico de 2019 sobreviveu por menos de 200 viaturas. A fábrica do grupo liderado por Carlos Tavares viu a produção crescer 14,1%, para 77.422 viaturas. No ano passado, a fábrica, que celebrou o 60.º aniversário, passou a produzir mais um modelo: o Fiat Doblò.
Já a Mitsubishi Fuso Truck Europe, no Tramagal, aumentou a produção em 15,9%, para 10.890 unidades, naquele que foi o seu terceiro melhor ano.
O maior salto na produção face a 2021, contudo, pertenceu à Toyota Caetano. A empresa fechou 2022 com 2.969 veículos produzidos, um salto de 52,5%.
ACAP vê este ano com “otimismo cauteloso”
Para Helder Pedro, as perspetivas para este ano são “otimistas”, esperando o dirigente da ACAP um desempenho, pelo menos, em linha com o de 2022.
Contudo, adverte, existem várias incertezas, nomeadamente sobre se o desconfinamento na China não levará a uma redução da produção das fábricas de componentes no gigante asiático, o que poderá levar a algumas perturbações nas cadeias de fornecimento.
Acresce que há ainda uma incógnita sobre como se comportarão as economias europeias, com vários países a anteciparem um abrandamento ou mesmo recessão.
Esta situação, sublinha o secretário-geral da ACAP, ganha particular importância tendo em conta que 90% das exportações da indústria automóvel nacional têm como destino países europeus. Aqui destacam-se a Alemanha, França, Itália e Espanha, que, em conjunto, absorvem 57% das exportações de veículos de Portugal.
Nos últimos anos tem-se assistido a alterações na hierarquia dos principais mercados para onde as fábricas nacionais exportam. Face a 2019, último ano antes da pandemia, existe uma maior diversificação de destinos. Logo a começar pela redução do peso do Velho Continente, que representava 97,5% das vendas ao exterior em 2019.
Já a Oceânia, que comprou apenas nove veículos em 2019, fechou 2022 com quase oito mil unidades importadas às fábricas portuguesas.
Mas mesmo dentro dos mercados europeus há “mexidas”. Assim, a Alemanha mantém-se como principal destino, mas vê o seu peso recuar de 23,3% para 21,2%. Também França perdeu peso (de 15,5% para 13,8%), tal como Itália e Espanha, com o país vizinho a baixar no ano passado da fasquia dos 10%.
Em contrapartida, a Polónia viu a sua importância aumentar de 2,2% para 3,1%, sendo já o sexto principal mercado na Europa.
Fábricas apontam para manutenção de volumes
As fábricas alinham pelo mesmo diapasão, antecipando um ano positivo, mas ressalvando que existem riscos e um grau elevado de incerteza.
A mais otimista é mesmo a Mitsubishi Fuso, que antecipa um ano de continuidade na recuperação dos volumes de produção, impulsionado pela nova geração do eCanter, camião ligeiro totalmente elétrico. No ano passado, os veículos elétricos produzidos pela Fuso cifraram-se apenas em 171.
Aliás, a fábrica do Tramagal emprega atualmente 550 trabalhadores, mais 150 do que no início de 2020, ainda antes da pandemia da covid-19.
Para já, Fuso, Salvador Caetano e CaetanoBus recuperaram no ano passado os volumes de produção para os níveis anteriores à pandemia.
T-Roc decisivo para salto na produção
Veículos produzidos em Portugal (unidades)
O número de veículos automóveis fabricados em Portugal disparou com o arranque da produção na Autoeuropa do T-Roc, em julho de 2017. Em 2018, a produção disparou mais de 67% e no ano seguinte voltou a subir 17,4%, para um máximo histórico. Nos últimos cinco anos, a produção acumulada é quase o dobro (91,8%) da observada entre 2013 e 2017.