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Sergio Moro diz que combate à corrupção não é prioridade de Governo de Bolsonaro
O ex-juiz e anterior ministro da Justiça do Brasil, Sergio Moro, denunciou que o combate à corrupção não é uma prioridade do atual Governo de Jair Bolsonaro, a quem acusou de tentar interferir em investigações policiais.
Numa entrevista publicada na quinta-feira pela revista Veja, Moro, que se demitiu do Governo na semana passada após ter acusado o Presidente do país de tentar interferir politicamente nas investigações da Polícia Federal, reforçou que aceitou o cargo de titular da Justiça perante o compromisso assumido por Jair Bolsonaro com o combate à corrupção.
"Sinais de que o combate à corrupção não é prioridade do Governo foram surgindo no decorrer da gestão. Começou com a transferência do Conselho de Controlo de Atividades Financeiras (Coaf) para o Ministério da Economia. O Governo não se movimentou para impedir a mudança", disse Moro à Veja.
"É bom ressaltar que o Executivo nunca negociou cargos em troca de apoio. Porém, mais recentemente, observei uma aproximação do Governo com alguns políticos com histórico não tão positivo. E, por último, teve esse episódio da demissão do diretor da Polícia Federal sem o meu conhecimento. Foi a gota de água", acusou o ex-juiz da Lava Jato, maior operação contra a corrupção no país.
Na última sexta-feira, o então ministro da Justiça e da Segurança Pública do Brasil, Sergio Moro, pediu a demissão do cargo que ocupava desde janeiro do ano passado, acusando o Presidente brasileiro de estar a fazer "interferência política na Polícia Federal", na sequência da demissão do ex-chefe daquela instituição Maurício Leite Valeixo.
"O Presidente disse-me, mais de uma vez, expressamente, que ele queria ter uma pessoa do contacto pessoal dele [para quem] ele pudesse ligar, [de quem] ele pudesse colher informações, [com quem] ele pudesse colher relatórios de inteligência. Seja o diretor [da Polícia Federal], seja um superintendente", declarou Moro na ocasião.
Segundo Moro, Bolsonaro queria interferir na Polícia Federal porque estava preocupado com investigações em curso no Supremo Tribunal Federal (STF), que poderiam envolver os seus filhos ou aliados políticos.
Horas depois da demissão do ex-juiz, Bolsonaro negou as acusações, mas acabou por admitir que, em pelo menos três ocasiões, procurou obter mais informações acerca de investigações em curso: acerca do atentado que sofreu em 2018, sobre o caso que envolvia a presença dos acusados de matar a vereadora Marielle no seu condomínio, e sobre uma eventual relação do seu quarto filho com a filha de um dos acusados do assassinato da vereadora.
Ainda no mesmo dia, Sergio Moro mostrou à TV Globo uma alegada troca de mensagens entre si e Jair Bolsonaro, na qual o Presidente brasileiro admitia que queria uma mudança no comando da Polícia Federal, justificando a necessidade da medida com uma investigação em curso contra deputados aliados do chefe de Estado.
Na entrevista à revista Veja, o ex-ministro reconheceu que não gostou de exibir essas provas na televisão, mas que o fez para provar que não estava a mentir.
"Embora eu tenha um grande respeito pelo Presidente, não posso admitir que ele me chame de mentiroso publicamente. Ele sabe quem está a falar a verdade. Não só ele. Existem ministros dentro do Governo que conhecem toda essa situação e sabem quem está a falar verdade", assegurou o antigo magistrado.
Moro, que foi um dos principais membros do Governo brasileiro e mantinha uma popularidade maior do que a do próprio chefe de Estado, afirmou que apresentará à Justiça, assim que for instado a fazê-lo, as alegadas provas que mostram que Bolsonaro tentou interferir indevidamente na Polícia Federal.
O ex-juiz revelou ainda que quer ele, quer a sua família, têm sido alvo de ataques desde que fez as acusações contra Bolsonaro, afirmando que receia ser alvo de um atentado.
Questionado sobre o que pretende fazer no futuro, Moro indicou que não pode voltar à magistratura, o que o levará, possivelmente, a enveredar pelo "setor privado".
"Tive 22 anos de magistratura. Deixei a minha carreira com base numa promessa não cumprida, de que teria apoio nessas políticas de combate à corrupção. Não posso voltar para a magistratura. Eu encontro-me, no momento, desempregado, sem aposentação", relatou Sergio Moro, que em 2017 sentenciou o ex-Presidente Lula da Silva a mais de nove anos de prisão, por corrupção.
"Não quero ficar aqui a reclamar de nada. Pedi a quarentena para ter um sustento durante algum tempo e me reposicionar, provavelmente no setor privado", acrescentou.