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O que é que o ex-ministro português tem?
São portugueses, homens, com idades entre os 41 e os 53 anos. Ligados à direita, têm estudos pós-universitários, tendo estudado ou trabalhado no estrangeiro. São ex-ministros e deverão, agora, ser “exportados” para altos cargos internacionais. Eles são Álvaro Santos Pereira, José Luís Arnaut e Vítor Gaspar.
Primeiro, a ida de Álvaro Santos Pereira para a OCDE, noticiada pelo jornal “Sol”. Depois, a de José Luís Arnaut para o Goldman Sachs, avançada em comunicado. A terminar, a notícia do “Expresso” sobre a candidatura de Vítor Gaspar ao FMI. Álvaro, Arnaut e Gaspar foram ministros em Portugal e estão a caminho de voos internacionais.
O fim-de-semana ficou marcado pela indicação de que três antigos ministros iriam para altos cargos da esfera internacional. Em comum, os ex-governantes têm o facto de estarem ligados à direita, mais precisamente ao Partido Social Democrata. Ainda assim, apesar de todos terem integrado governos de coligação PSD/CDS, só Arnaut tem ligações partidárias claras aos sociais-democratas, tendo sido inclusive vice-presidente do partido.
Com idades próximas (Álvaro Santos Pereira tem 41 anos, Arnaut conta com 50 e Gaspar com 53 anos), os três já tiveram contactos internacionais, já que estudaram ou trabalharam no estrangeiro. Álvaro tirou o Doutoramento na Universidade Simon Fraser, no Canadá, por onde viveu até liderar o Ministério da Economia. Gaspar trabalhou no Banco Central Europeu. Arnaut alcançou um diploma de Estudos Superiores Especializados na Universidade Robert Schuman, em Estrasburgo.
As ligações ao estrangeiro fazem parte do passado em comum destes antigos ministros que, agora, ascendem a altos cargos internacionais. Nomeações e candidaturas que mereceram as críticas da oposição e da esquerda e os elogios da direita. “Grandes responsáveis pelo programa de empobrecimento de Portugal estão a ser premiados por instituições políticas e financeiras internacionais”, escreve o portal “Esquerda.net”, mantido pelo Bloco de Esquerda.
Arnaut, o contestado
A nomeação de José Luís Arnaut para o Conselho Consultivo Internacional do Goldman Sachs é a que tem causado maior polémica. Depois de divulgado em comunicado na sexta-feira, o “Expresso” trouxe, no sábado, uma entrevista com o único sócio português do banco americano, António Esteves, em que a escolha é explicada.
“Quantos mais portugueses possamos ter a trabalhar no Goldman Sachs em cargos importantes e relevantes, mais facilmente será dirigir recursos e atenção para Portugal. O José Luís vai ajudar-me muitíssimo a trabalhar nessa direcção”, explicou Esteves ao semanário, avançado que o antigo ministro-adjunto de Durão Barroso e o ex-ministro das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional, de Santana Lopes, “preencheu todos os apertados critérios de avaliação” do banco.
O órgão que o sócio fundador da sociedade de advogados CMS Rui Pena & Arnaut vai integrar conta com 17 membros . “Neste papel, [Arnaut] vai fornecer aconselhamento estratégico à empresa no alargado campo de questões empresariais, regionais, de políticas públicas e económicas, com um foco particular em Portugal e nos países de língua portuguesa em África”, aponta o comunicado. Licenciado em Direito pela Lusíada, Arnaut foi deputado pelo PSD à Assembleia da República em várias legislaturas.
Marcelo Rebelo de Sousa, antigo presidente do PSD, explicou que José Luís Arnaut reúne dois traços importantes para esta nomeação. Por um lado, adiantou o comentador, na TVI, “esteve em todas as privatizações do Estado vendedor e do lado dos privados interessados”. O advogado esteve ligado, com o seu escritório, nas operações da REN, ANA e CTT. Por outro lado, acrescentou Rebelo de Sousa, “tem peso no partido, que por sua vez tem peso no Governo”.
“Dir-me-á que é uma mistura entre poder económico e político. Mas esses bancos, quando escolhem algumas figuras (ex-governadores, ex-ministros), são pessoas que lá estão porque os bancos pensam que podem abrir portas ou, pelo menos, esclarecer o que se passa nesses países”, justificou o comentador conectado ao PSD.
É precisamente esta mistura entre negócios e política que foi alvo de crítica do secretário nacional do PS, António Galamba. “Está instalada a confusão”, afirmou. Eurico Brilhante Dias, na SIC Notícias, acrescentou que “é importante que o envolvimento na sociedade portuguesa, na política, e este envolvimento profissional sejam transparentes”.
Frente-a-frente com o socialista Brilhante Dias na SIC Notícias, Arnaut adiantou que “tem um passado político” mas também em uma profissão. “Estamos no mercado livre. Quem vê isso [de outra forma], vê muito pequeno, não tem dimensão, ainda não percebeu o que é o papel das pessoas no mundo internacional”.
“É bom para Portugal. Quanto mais portugueses houver em posições internacionais, seja qual for a origem, só valoriza Portugal”, sintetizou José Luís Arnaut na sua intervenção na SIC Notícias. José Sócrates, no comentário habitual na RTP1, afirmou que a nomeação “pode aumentar o prestígio do Goldman Sachs em Portugal, mas não aumenta o prestígio de Portugal junto do mundo financeiro”.
Álvaro, OCDE e o conflito com Portugal
A afirmação de Arnaut acontece numa altura em que se sabe, depois de avançado na sexta-feira pelo semanário “Sol”, que Álvaro Santos Pereira vai trabalhar na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).
O concurso para a direcção do departamento de Countries Studies, conectado a cada um dos países membros da OCDE, abriu em Agosto. Em Julho, Santos Pereira havia abandonado a liderança do Ministério da Economia, na sequência da remodelação governamental que acabou por afectá-lo. Álvaro Santos Pereira era considerado politicamente um dos elementos mais frágeis do Executivo, com contestação vinda dos dois partidos da coligação.
Um mês depois de sair do Governo, Santos Pereira, docente e “bloguer” que veio para o Governo pelos seus conhecimentos técnicos, candidatou-se para ir em direcção Paris. O resultado foi conhecido em Dezembro. O antigo ministro da Economia será o ministro responsável pelas negociações com os ministros das Finanças e da Economia dos países da OCDE a partir de Abril, ocupando, assim, a função de número dois entre os economistas da instituição.
Ao “Sol”, Santos Pereira afirmou que, por eventuais conflitos de interesse, não deverá analisar a política portuguesa. “Há regras por causa de conflitos de interesse e provavelmente não serei eu a avaliar as políticas do Ministério da Economia português porque fui eu as que as fiz”, explicou ao semanário.
Gaspar para o FMI
Quem também pretende voos internacionais é Vítor Gaspar. A notícia fez manchete no sábado passado no “Expresso”: “Gaspar avança para o FMI com apoio de Merkel”. Vítor Gaspar candidatou à liderança do departamento de política orçamental do Fundo Monetário Internacional. Esta semana, contou o semanário, estará em Washington devido ao processo de selecção.
Gaspar, que se demitiu a 1 de Julho de 2013 do cargo de ministro das Finanças, conta com os apoios dos governos português e alemão nesta caminhada para o FMI. O ex-governante saiu do Governo depois de admitir que os resultados que a economia portuguesa estava a verificar não eram aqueles por si antecipados.
Os resultados da candidatura serão conhecidos em Fevereiro. Nesta altura, o antecessor de Maria Luís Albuquerque voltou ao seu cargo enquanto Banco de Portugal. Vencendo o concurso, Gaspar vai trabalhar numa das instituições com quem teve de lidar quando estava no Ministério das Finanças. O FMI é um dos credores de Portugal, tendo participado no resgate internacional ao país.