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Frente Cívica: Corrupção de decisores políticos continua tabu e cresce com fundos europeus

“No ciclo em que estamos a viver, em que temos mais dinheiro europeu por via do Programa de Recuperação e Resiliência pós-pandemia e a entrada do novo ciclo habitual de fundos europeus, temos muito mais riscos de corrupção”, alerta o vice-presidente da Frente Cívica.

07 de Dezembro de 2024 às 09:23
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O vice-presidente da Frente Cívica, João Paulo Batalha, considerou que a corrupção de decisores políticos continua tabu na discussão pública em Portugal.

"A corrupção das instituições políticas, dos partidos políticos e dos decisores é a corrupção que os cidadãos mais percecionam. Aquela que aparece nos casos mais mediáticos e com mais impacto é sempre corrupção de decisores políticos e essa continua, de facto, a ser um tabu na discussão pública em Portugal", afirmou João Paulo Batalha, a propósito das comemorações do Dia Internacional Contra a Corrupção, na segunda-feira, na Marinha Grande (Leiria).

Antes, João Paulo Batalha salientou que "para o poder político é incómodo falar, sobretudo, da corrupção política".

"Foi, durante muitos anos, incómodo falar de todo o tipo de corrupção, mas, entretanto, tem havido alguma inteligência tática dos partidos políticos em ocupar o espaço, falando sobre o problema, mas desviando, muitas vezes, para problemas menores do combate à corrupção, nomeadamente corrupção de pequenos funcionários ou corrupção administrativa nas repartições que, todos os indicadores lhes dizem acontecerá, mas pouco", prosseguiu.

Questionado pela agência Lusa sobre como está o país em matéria de combate à corrupção, o dirigente da Frente Cívica respondeu que "tem havido um conjunto de iniciativas políticas de vários governos para o combate à corrupção", como a primeira Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024 e o anúncio do atual executivo de que "está a preparar uma nova agenda de combate à corrupção".

"Vamos tendo um conjunto, mais ou menos cíclico, de iniciativas políticas, mas o que não vemos são resultados no terreno", sustentou, assinalando que se continua a atirar "o combate à corrupção quase exclusivamente para o poder judicial e há uma desresponsabilização política", declarou João Paulo Batalha.

Esta desresponsabilização costumava traduzir-se "numa inércia total", mas, nos últimos anos, houve uma "sucessão de iniciativas de combate à corrupção, de novas leis ou de revisões de leis ou de agendas" que "concretizam pouco, porque têm também objetivos pouco claros e difíceis ou impossíveis de medir", assinalou.

Para o vice-presidente da Frente Cívica, Portugal continua "a ter um problema enorme de eficácia no combate à corrupção, como depois se vai vendo com a sucessão de problemas que acontecem nas instituições" e para os quais estas não estão preparadas para prevenir, nem depois para os resolver.

Sobre o que o país precisa para o combate à corrupção, João Paulo Batalha apontou a assunção da corrupção como "prioridade política, não apenas do ponto de vista normativo", da elaboração ou revisão de leis, da criação de estratégias ou agendas que "são escudos de papel" e não se implementam.

"Precisamos de assumir este problema como um problema de base do poder político e da promiscuidade entre o poder político e poder económico, e um problema de qualidade das instituições", referiu.

Segundo João Paulo Batalha, "as instituições judiciais, nomeadamente o Ministério Público, têm feito algum trabalho de especialização e são muito mais assertivas na investigação de suspeitas de corrupção, mas as instituições políticas continuam a produzir papel e com muito pouca eficácia".

"Precisávamos que este combate fosse assumido pelos principais agentes políticos, os governos, os parlamentos, os vários presidentes da República que temos tido, como um problema de primeira linha de qualidade da nossa democracia e de confiança dos cidadãos no próprio sistema democrático", acrescentou.

 

Risco de corrupção em Portugal cresce com aumento de dinheiro da UE

E alertou para a existência de muito mais riscos de corrupção em Portugal com o aumento das verbas da União Europeia.

"No ciclo em que estamos a viver, em que temos mais dinheiro europeu por via do Programa de Recuperação e Resiliência pós-pandemia e a entrada do novo ciclo habitual de fundos europeus, temos muito mais riscos de corrupção", disse o vice-presidente da Frente Cívica.

Realçando que o país tem, "infelizmente, um histórico de apropriação indevida de fundos comunitários desde o início da adesão à então Comunidade Económica Europeia [01 de janeiro de 1986]", João Paulo Batalha sustentou que esses riscos existem e "são agravados quando há maiores fluxos de dinheiro e quando há uma pressa maior em termos de execução orçamental".

"Prazos para cumprir, para não se perderem os fundos, criam uma quase obsessão dos vários governos em executar os fundos o mais depressa possível", declarou o dirigente da Frente Cívica, salientando que "essa obsessão se traduz em maus projetos, em pressa em atribuir fundos, mesmo que de forma errada a investimento não produtivo ou para favorecer pessoas ou entidades próximas do poder político".

Para João Paulo Batalha, o que se tem visto com o PRR "é uma atitude política e legislativa de abrandar ou até suspender os controlos sobre o uso desse dinheiro, nomeadamente, poupando vistos do Tribunal de Contas e fiscalização da atribuição desses recursos".

"Isto cria um 'cocktail' explosivo de potencial abuso de fundos europeus", adiantou, avisando que este "não é um risco meramente abstrato, é um risco real" que o país está a viver "assistindo à alteração das leis para facilitar o gasto rápido dos fundos e diminuir os controlos".

O vice-presidente frisou ainda que "esta obsessão política com a execução do dinheiro para não devolver dinheiro a Bruxelas" é, "em si, um incentivo à apropriação destas verbas".

"É um problema a que estamos a assistir e o grande perigo é que depois de dissipado este dinheiro europeu, depois de passado o prazo, vamos ver que pouco ou nenhum investimento produtivo foi feito e que o dinheiro foi distribuído pelos mesmos grupos de interesses do costume próximos do poder político", acrescentou João Paulo Batalha.

A Frente Cívica é uma associação de defesa de causas de interesse público. Trabalha para identificar os problemas crónicos da sociedade portuguesa, denunciar os seus responsáveis e lutar pela sua resolução, segundo o seu sítio na Internet.

As comemorações do Dia Internacional Contra a Corrupção começam às 09:00, no auditório da Resinagem. Após a sessão de boas-vindas do presidente da Câmara da Marinha Grande, vão discursar os presidentes da Frente Cívica, do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, da Associação Sindical dos Profissionais da Inspeção Tributária e Aduaneira e da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, além do procurador-geral da República.

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