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Cadeias portuguesas vão ter telefones nas celas dos reclusos

"O modelo de contactos que há hoje, de uma chamada por dia por recluso, de cinco minutos, está ultrapassado e potencia o tráfico de telemóveis", alegou o diretor-geral da Reinserção e dos Serviços Prisionais.

08 de Fevereiro de 2020 às 14:52
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Os serviços prisionais vão avançar com um projeto-piloto de instalação de telefones nas celas dos reclusos nas cadeias de Tires e do Linhó, informou este sábado, em Fátima, o diretor-geral da Reinserção e dos Serviços Prisionais, Rómulo Mateus.

Este responsável, que participou no XV Encontro Nacional da Pastoral Penitenciária, disse que "estão a ser instaladas as cablagens" naqueles dois estabelecimentos prisionais, que virão a permitir, em breve, o início do projeto-piloto.

 

"Espero que depois de alguns meses possa dizer à tutela que funcionou", afirmou, para que o projeto avance para a generalidade das cadeias nacionais.

 

Segundo Rómulo Mateus, "a tutela está empenhada" no processo, embora admita haver necessidade de alteração legislativa para a introdução definitiva do projeto.

 

"O modelo de contactos que há hoje, de uma chamada por dia por recluso, de cinco minutos, está ultrapassado e potencia o tráfico de telemóveis", disse o diretor-geral aos jornalistas, observando que "os reclusos queixam-se de que uma chamada não permite falar com os vários membros da família", por exemplo.

 

Outros países, como a França, "avançaram com os telefones nas celas e verificou-se que a tensão entre reclusos e guardas prisionais caiu, o tráfico de telemóveis caiu e a taxa de suicídios baixou", acrescentou.

 

Rómulo Mateus adiantou que, após o período do projeto-piloto, a instalação dos telefones será alvo de um concurso público internacional e que as chamadas serão integralmente pagas pelos reclusos.

 

Questionado sobre a possibilidade de os telefones serem usados para atividades ilícitas por parte da população prisional, o diretor-geral foi perentório: "95% dos reclusos querem os telefones para falar com a família".

 

Na sua intervenção perante dezenas de visitadores de cadeias, Rómulo Mateus admitiu que está "a tentar romper com o paradigma atual", situação que provoca o "receio dos políticos".

 

Na sua intervenção, que mereceu o vivo aplauso dos participantes no encontro, o diretor-geral da Reinserção e dos Serviços Prisionais apontou outras três preocupações que tem no seu dia-a-dia no cargo, e que se prendem com a situação dos reclusos inimputáveis, dos idosos e dos jovens.

 

Para Rómulo Mateus, os cerca de 250 reclusos inimputáveis "são pessoas maltratadas", com o tratamento que lhes é dado a não ser "o desejável".

 

Por outro lado, Portugal tem "a quarta população prisional mais envelhecida da Europa", com cerca de mil reclusos por crimes de violência doméstica.

 

Alguns reclusos têm "problemas de geriatria evidentes" e o sistema prisional "faz pequenos milagres todos os dias com os poucos recursos que tem" para tratar estes presos mais idosos.

Já quanto aos jovens, a preocupação é que não fiquem desatualizados, nomeadamente ao nível das ferramentas digitais, para que possam ter empregabilidade quando forem libertados.

 

Nesse sentido, na próxima quarta-feira, em Leiria, vai ser assinado um protocolo com vista a um curso de informática a ser frequentado pelos jovens reclusos que cumprem pena num dos estabelecimentos prisionais da cidade.

 

Rómulo Mateus, que sublinhou que "encarcerar as pessoas e esperar que o tempo passe, como fazem certos países", tem resultados "catastróficos", pelo que defendeu a necessidade de a sociedade interiorizar a ideia de que "pela Constituição, o recluso só está privado de um direito, que é o da liberdade. De nenhum outro".

 

Neste encontro subordinado ao tema "Prisões e "Janelas Com Horizonte", organizado pela Coordenação Nacional da Pastoral Penitenciária - órgão dependente da Conferência Episcopal Portuguesa -, participou também o bispo auxiliar de Lisboa Joaquim Mendes, responsável pela vertente pastoral da organização da Jornada Mundial da Juventude 2022, que decorrerá em Lisboa, e que sensibilizou os diferentes agentes da pastoral penitenciária para a forma como a população prisional também pode participar neste evento que será presidido pelo Papa.

 

Segundo o bispo, este será um acontecimento "inclusivo" e a Igreja "não quer deixar ninguém de fora".

 

E o pensamento e as ações do Papa Francisco sobre a realidade dos reclusos foi objeto de uma intervenção do jornalista da agência Ecclesia Octávio Carmo, que defendeu a necessidade de se "reconhecer o outro como pessoa, como próximo" e sublinhou o pedido constante do Pontífice "para que se abandone a cultura do adjetivo e se adote a cultura do substantivo".

 

"Deve haver humanização no olhar, nunca deixar de ver o próximo como semelhante", disse Octávio Carmo, realçando que o Papa Francisco tem dado o exemplo de aproximação "aos que carregam o ódio social", como os reclusos.

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