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Recibos verdes: Parlamento chumba solução para "armadilha" das mais-valias

Afectar um imóvel à actividade para deduzir no IRS, de acordo com as novas regras para o regime simplificado, pode, de futuro, transformar-se num pesadelo. O PS apresentou um pedido de autorização legislativa que iria mitigar o problema, mas o Parlamento chumbou.

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Filomena Lança filomenalanca@negocios.pt 28 de Novembro de 2017 às 22:00

Não será ainda desta que os profissionais liberais ou empresários do alojamento local verão resolvido – ou, pelo menos, mitigado – o problema das mais-valias resultantes da afectação de imóveis à sua actividade. Na recta final da votação do Orçamento do Estado (OE) para 2018 no Parlamento, o PS apresentou uma proposta de alteração com um pedido de autorização legislativa para que o Governo alterasse a lei no que toca ao regime das mais-valias, mas a proposta foi chumbada, com a abstenção do CDS-PP e voto contra das demais bancadas.

A questão das mais-valias resultantes da afectação de imóveis à actividade profissional ou empresarial dos proprietários, que já antes se pusera nomeadamente, para a actividade do alojamento local, coloca-se agora com mais acuidade para a generalidade dos profissionais liberais que, de acordo com as novas regras do regime simplificado, sejam obrigados a apresentar facturas para justificar os custos de actividade. Neste caso, se trabalharem em casa ou num imóvel sua propriedade, será aceite como despesa uma amortização do respectivo investimento calculada automaticamente pelo Fisco em função do valor patrimonial tributário (VPT): os profissionais liberais poderão abater 25% de 1,5% do VPT do imóvel afecto à actividade, uma proporção que no alojamento local sobe para 25% de 4% do valor fiscal do imóvel. O problema é que, ao afectarem o imóvel à actividade, caem num regime de mais-valias que pode ser muito gravoso.

Uma verdadeira "armadilha", afirma Luís Leon, fiscalista da Deloitte.  Isto porque, com a afectação do imóvel tem de se calcular, face ao seu valor de mercado, qual a mais- valia criada desde que foi comprado. Essa mais-valia, em sede de categoria G, fica suspensa e, a partir do momento em que o imóvel fica afecto à actividade, começa a contar outra mais-valia, esta  da categoria B. Ora, quando o imóvel deixar de estar afecto à actividade, será preciso fazer contas. A primeira mais-valia, que ficou suspensa, será tributada em 50% na categoria G do IRS e a segunda será considerada praticamente na totalidade como um ganho do exercício da categoria B e aí também tributada. Ou seja, o proprietário será confrontado com duas facturas de imposto, só se livrando da primeira se colocar a casa no mercado do arrendamento.

[A proposta do PS] resolvia a questão das mais-valias em relação ao momento em que terão de ser pagas, mas deixava o resto em aberto. Luís Léon
Fiscalista da Deloitte

Proposta do PS só mitigava o problema

O pedido de autorização legislativa apresentado pelo PS previa que as mais-valias apenas seriam tributadas no momento da alienação do bem, e não quando este regressasse à esfera pessoal do seu proprietário, como agora acontece.

Mitigava o problema, mas não o eliminaria. "Resolvia em relação ao momento em que terão de ser pagas as mais-valias, mas deixava o resto em aberto", explica Luís Léon.  António Schwalbach, coordenador da equipa fiscal da Telles, concorda: "quando mais tarde quiser vender, a pessoa iria ter novamente o problema. E, tendo afectado uma parte da sua habitação, continuaria, por exemplo, a não poder beneficiar do regime de reinvestimento de mais-valias", considera.

Este é, aliás, um problema de quem alocar a casa à actividade: se for a sua habitação própria e mais tarde a quiser vender para comprar outra onde também irá morar, não poderá, ainda que reinvestindo o valor, ficar isento do pagamento de mais-valias.

O Ministério das Finanças não comenta o chumbo do Parlamento nem adianta se pretende ou não avançar com uma proposta de lei. Nada impedirá, contudo, o governo de fazer isso. O PSD, por exemplo, afirma que  votou contra porque um pedido de autorização legislativa tem de ser apresentado pelo Executivo e não pelos deputados, como aconteceu desta vez. "Se o Governo quiser, que apresente uma proposta autónoma ao Parlamento", remata António Leitão Amaro, uma opinião partilhada pelo líder parlamentar do PCP João Oliveira, em declarações ao Negócios. Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, também não fecha a porta a alterações no futuro, considerando "demasiado amplo o âmbito da autorização" que estava a ser pedida pelo PS.

Tendo afectado à actividade uma parte da sua habitação, o proprietário não pode , caso a venda, beneficiar
do regime de reinvestimento de mais-valias.
António Schwalbach
Advogado e coordenador   da equipa fiscal da Telles


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As principais alterações ao regime simplificado

Governo decidiu discriminar positivamente algumas actividades económicas, deixando-as de fora das novas exigências em matéria de comprovação das despesas. Mudanças acabam por apanhar poucos trabalhadores independentes.

Comércio, turismo e agricultura de fora
Ao contrário do que previa a proposta original, os pequenos empresários do comércio, turismo, agricultura, hotelaria não estão abrangidos pelas novas regras. Para estes, nada muda. As novas regras apenas se aplicam aos profissionais liberais, previstos na tabela de actividades do artigo 151º do código do IRS (pagam IRS sobre 75% do que facturam, e aos "outros prestadores de serviços" (pagam IRS sobre 35% do que facturam).

"Outros" prestadores de serviços arriscam mais IRS
Os prestadores de serviços que não indiquem CAE (código de actividades económicas) passam a ser automaticamente a pagar IRS por 75% do que facturam (são colocados no coeficiente 0,75). Trata-se de uma norma anti-abuso introduzida na proposta do PS. Na mesma linha, um prestador de serviços que preste serviços a entidades participadas por si ou por familiares, paga sobre 100% desse valor.

Pelo menos 15% de despesas profissionais
Os trabalhadores independentes só pagam IRS sobre 75% ou 35% do que facturam, consoante sejam profissionais liberais ou outros prestadores de serviços. Estes descontos no IRS continuarão a manter-se, mas precisam de ter despesas profissionais equivalentes a pelo menos 15%. Estes 15% são calculados pela diferença entre o valor das prestações de serviços declaradas e várias coisas: 4.104 euros (ou os descontos  para a Segurança Social, se forem superiores); despesas com pessoal; rendas de imóveis ou, caso ele seja do próprio, uma amortização automática do seu valor patrimonial; bens importados; e todo o tipo de despesas relacionadas com a actividade como telefone, internet, gás, água, luz. O facto de haver sempre 4.104 euros de deduções garantidas, à cabeça, faz com que apenas os contribuintes com mais de 27.360 euros de facturação tenha de se preocupar em ter despesas.

Imóveis e despesas mistas calculadas automaticamente
Um trabalhador a recibos verdes, que esteja no regime simplificado do IRS e que use o telefone, a internet, a electricidade, tanto para fins pessoais como para profissionais, vai passar a poder imputar uma parte da sua factura às despesas profissionais. Tudo será feito automaticamente: a partir do momento em que indique no sistema e-fatura que a despesa tem um carácter misto (um campo novo que será criado para esse efeito), o Fisco pega em 25% do valor e considera-o profissional. O resto segue para as despesas gerais familiares. A mesma lógica será aplicada aos imóveis, para quem trabalhe em casa ou com a casa (se se tratar de alojamento local). O Fisco pemitirá aos profissionais liberais que abatam como despesa profissional 25% de 1,5% do valor patrimonial tributário do imóvel; tratando-se de alojamento local, são 4% do valor patrimonial (se a casa estiver toda afecta à actividade). Também neste caso é tudo feito automaticamente, pelo Fisco, tendo o contribuinte de indicar o imóvel em causa. 



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