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Constitucional dá luz verde às 40 horas na Função Pública (act2)
O Tribunal Constitucional deu luz verde ao alargamento do horário de trabalho na Função Pública, de 35 para 40 horas. A decisão foi aprovada à tangente, com sete votos a favor e seis contra. Conheça os argumentos dos juízes do Palácio de Ratton.
O Tribunal Constitucional decidiu que o aumento do horário de trabalho dos funcionários públicos de 35 horas para 40 horas semanais não viola a Constituição.
“O Tribunal Constitucional decide não declarar a inconstitucionalidade das normas dos artigos 2.º, em articulação com o artigo 10.º, 3.º, 4.º e 11.º, todos da Lei n.º 68/2013, de 29 de agosto”, lê-se num acórdão publicado no site do Tribunal Constitucional.
O Presidente da República não teve dúvidas quanto à constitucionalidade do aumento do horário, mas os deputados de todos os partidos da oposição pediram a fiscalização sucessiva do diploma, que foi agora validado pelos juízes do Palácio de Ratton. Ainda assim a decisão foi aprovada à tangente, com sete votos a favor e seis contra.
Os deputados argumentaram que as normas que determinam o aumento do horário de trabalho violam os princípios do retrocesso social, da segurança jurídica e da confiança, a par dos princípios da igualdade e da proporcionalidade. No entanto, não foi esse o entendimento da maioria dos juízes.
Constituição não impede alteração de regras laborais
Uma das questões levantadas era a de saber se o aumento do horário de trabalho poderia ser imperativo sobre o que dizem as convenções colectivas, anulando o que ficou definido entre as partes. Sobre este ponto, o acórdão refere que a solução se destina a garantir "a eficácia imediata da alteração do período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas e que todos estes trabalhadores fiquem colocados numa situação inicial de igualdade". Nada impede que, no futuro, as convenções colectivas estabeleçam um horário de trabalho inferior, referem.
Os juízes argumentam, ainda, que o princípio da proibição do retrocesso não pode ser encarado de forma estanque. Caso contrário, "destruir-se-ia quase totalmente a autonomia da função legislativa", deixando pouca margem ao Governo e ao Parlamento para tomar decisões.
Expectativas dos trabalhadores não foram violadas
Outro dos princípios alegadamente violado seria o da protecção da confiança, aquele que protege os cidadãos de decisões que contrariem as expectativas criadas de forma injustificada. Foi este princípio que travou, por exemplo, a generalização dos despedimentos na Função Pública. Este é também um dos princípios invocados pelo Presidente da República para defender a inconstitucionalidade dos cortes nas pensões da CGA.
Neste caso concreto do aumento do horário de trabalho para as 40 horas, os juízes consideram que não se pode considerar que a medida viole de forma flagrante as expectativas criadas, até porque o legislador tem vindo a aproximar as regras laborais da Função Pública com as do sector privado.
"No presente caso, deve ter-se em consideração que a tendência para a laboralização do regime dos trabalhadores da Administração Pública, fortemente acentuada, a partir de 2008, com a adopção, como regime-regra, do contrato de trabalho em funções públicas (disciplinado por um diploma – o RCTFP – próximo do Contrato de Trabalho), permite afirmar que não seria totalmente imprevisível uma alteração como a ora em causa do período normal de trabalho", pode ler-se no acórdão.
Além disso, acrescentam os juízes, "a medida de aumento do período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas visa a salvaguarda de interesses públicos relevantes".
Também a violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade é descartada pelo Constitucional, que argumenta que esta lei não gera diferenças de tratamento novas entre público e privado ou entre funcionários públicos, face à dimensão das diferenças que já existiam.
Cortes salariais são possíveis, desde que sejam justificados
Finalmente, o Tribunal Constitucional analisa, a pedido dos deputados da oposição, se a medida viola o princípio da irredutibilidade do salário.
Os juízes lembram que não existe qualquer norma na Constituição que proíba a redução da remuneração. "O que se proíbe, em termos absolutos, é apenas que as entidades empregadoras, públicas ou privadas, diminuam injustificadamente o quantitativo da retribuição, sem adequado suporte normativo", defendem.
Apesar de reconhecer que há uma diminuição no valor pago por hora trabalhada, o Tribunal Constitucional sublinha que não há uma redução efectiva no valor que os funcionários públicos levam para casa ao final do mês.
O corte pode verificar-se antes a nível do valor pago por horas extraordinárias, o que não é suficiente para justificar uma declaração de inconstitucionalidade, como não o foi no passado.
"Não é decisiva, no sentido da inconstitucionalidade, a diminuição das quantias efetivamente recebidas como remuneração do trabalho extraordinário. Desde logo, não sendo aplicável, nos termos da citada jurisprudência constitucional, a garantia da irredutibilidade do salário, não poderá ser este o fundamento de qualquer julgamento de desconformidade com a Constituição", concluem.
Medida vale 153 milhões de euros em 2014
O aumento do horário de trabalho entrou em vigor no final de Setembro. O relatório do Orçamento do Estado para 2014 revela que o Governo espera poupar 153 milhões de euros com o aumento do horário de trabalho no próximo ano.
"Estima-se que esta medida, conjugada com a redução de trabalhadores por aposentação, tenha um impacto de 153 milhões de euros. Esta poupança resultará da optimização da organização dos tempos de trabalho com redução de horas extraordinárias, além da efetiva acomodação do ritmo de redução de pessoal em curso", pode ler-se no relatório.
O aumento do horário de trabalho de sete para oito horas diárias aplica-se, genericamente, a todos os funcionários, mas na prática há excepções. Os professores negociaram um regime próprio, que permite que possam prestar este trabalho extraordinário em casa. Os médicos continuarão a usufruir da regra que determina que o aumento de horário seja acompanhado de uma subida salarial. Alberto João Jardim criou um regime específico para a Madeira.