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Parlamento britânico rejeita Brexit sem acordo e abre porta a adiamento

Não houve lugar a grandes surpresas na votação desta quarta-feira, com os deputados britânicos a afastarem a possibilidade de o Reino Unido abandonar a União Europeia sem enquadramento legal previamente negociado. Chumbo dá força a cenário de adiamento do Brexit, hipótese que será votada já esta quinta-feira.

Reuters
David Santiago dsantiago@negocios.pt 13 de Março de 2019 às 19:21

A entrada em águas nunca navegadas foi rejeitada pelo parlamento britânico que, esta quarta-feira, afastou a possibilidade de o Reino Unido sair da União Europeia sem enquadramento jurídico - o mesmo é dizer que a Câmara dos Comuns recusou um Brexit sem acordo de saída. Esta votação abre a porta ao adiamento do Brexit, restando, porém, saber qual a duração desse adiamento, e para quê. 

A moção que a primeira-ministra Theresa May levou ao parlamento, alterada pela emenda apresentada pela conservadora Caroline Spelman, previamente acolhida, foi aprovada por 321 votos a favor e 278 contra, o que conferiu uma maioria de 43 votos aos parlamentares que recusam um Brexit desordenado. 

Theresa May, que tinha dado liberdade de voto aos conservadores, acaba por ser derrotada na medida em que, após ver chumbado o acordo de saída revisto que foi renegociado com Bruxelas, assumiu preferir que, não havendo enquadramento legal para a saída, preferia um Brexit sem acordo do que um Brexit com base num mau acordo. 


Todavia, um Brexit sem acordo não ficou definitivamente posto de parte, isto porque, como fez questão de notar o presidente da Câmara dos Comuns, John Bercow, a saída da UE está já prevista na lei britânica para as 23:00 do próximo dia 29 de março. Ou seja, esta moção não chega por si só para afastar uma saída desordenada, já que não tem força de lei, sendo portanto necessário alcançar um acordo de saída com Bruxelas, o qual dificilmente pode ser fechado sem adiar o Brexit de forma a ganhar tempo para a renegociação com o bloco europeu. 

A Comissão Europeia, através de um porta-voz citado pela Bloomberg, também constatou o óbvio ao dizer que esta votação contra um divórcio sem acordo não basta para assegurar que um Brexit desordenado não se torna realidade. E o The Telegraph avançou que no Conselho Europeu de 20 e 21 de março os líderes europeus vão transmitir a May que, a haver uma extensão do artigo 50.º, essa terá de ser longa de forma a criar condições para obter um acordo e evitar novas corridas em contra-relógio.

Isso mesmo parece ficar claro na posição assumida pelo ministro português dos Negócios Estrangeiros, Santos Silva: "Portugal está inteiramente disponível para dar o seu apoio a uma extensão, a um adiamento da data de saída, a uma extensão do prazo, suficientemente significativa para que possamos ter condições e tempo para negociar um acordo com os britânicos".

São mais as perguntas que resultam da votação desta quarta-feira do que as certezas, já que não se sabe ainda se o Brexit será adiado (a votação parlamentar decorre esta quinta-feira), nem durante quanto tempo (a moção do governo propõe um curto adiamento, até 30 de junho, antes de o novo Parlamento Europeu tomar posse, isto se até à próxima quarta-feira for encontrado um acordo, caso contrário a moção governamental refere que Londres pedirá uma extensão mais longa), e muito menos que tipo de acordo pode recolher o apoio necessário à aprovação num parlamento completamente dividido. A moção que é votada esta quinta-feira pode ainda sofrer emendas que poderão mudar o texto que será submetido a votação.

Certo é que este passo no sentido do afastamento do cenário caótico inerente a uma saída sem acordo foi bem recebido nos mercados. Depois de ter valorizado ao longo do dia nos mercados cambiais, a libra acentuou os ganhos face ao dólar para mais de 2%, tocando mesmo no valor mais alto desde junho do ano passado contra a divisa norte-americana.

May alerta para incumprimento do referendo

Antes de Bercow, a primeira-ministra avisou que cabe agora ao parlamento assumir as rédeas do processo. Se os deputados derem apoio a um acordo de saída nos próximos dias, o governo conservador poderá requerer uma "extensão curta e limitada" do artigo 50.º destinada a conferir o tempo necessário à ratificação de um acordo com a UE. Caso contrário, Downing Street ver-se-á obrigada a pedir um adiamento "muito mais prolongado" do Brexit. Note-se que os restantes 27 Estados-membros da União têm de aprovar o adiamento por unanimidade.

Theresa May recordou ainda que um prolongamento extenso do Brexit obrigaria o Reino Unido a participar nas eleições europeias de maio e representaria desrespeitar o mandato atribuído aos políticos britânicos pelo resultado do referendo de 2016.

"Repito aquilo que tenho vindo a dizer: a predisposição legal continua a ser a de que o Reino Unido sairá [da UE] sem acordo a menos que seja encontrado um acordo", atirou a líder dos "tories" insistindo que para já a única solução viável passa pelo acordo revisto ontem chumbado: "o único acordo disponível é o que está em cima da mesa".

Colocando o ónus em May, o secretário-geral trabalhista Jeremy Corbyn defendeu que cabe à primeira-ministra trabalhar em conjunto com os deputados para encontrar uma solução para o impasse. Corbyn sustentou que pedir a extensão do artigo 50.º por si só de nada serve, e reiterou que voltará a encetar esforços para aprovar um compromisso tendente ao estabelecimento de uma união aduaneira com a UE. Se tal pretensão não colher apoio na Câmara, Corbyn considera que a única opção deve ser a realização de um novo referendo à permanência no bloco europeu. 


Uma emenda aprovada e outra rejeitada

A moção aprovada foi alterada para incluir a emenda da deputada conservadora Caroline Spelman que "rejeita que o Reino Unido saia da União Europeia sem um acordo de saída e um enquadramento para a relação futura" entre os dois blocos económicos. Assim, a versão final da moção de May passou a: "Esta Câmara rejeita que o Reino Unido saia da UE sem acordo de saída e um enquadramento para a relação futura".

A emenda foi aprovada por 312 votos a favor e 308 contra, resultado que ajudou a perceber a enorme divisão parlamentar acerca do melhor caminho a seguir e que mostrou haver um número expressivo de deputados que não excluem uma saída desordenada. Confirmou ainda a divisão no seio do executivo de May, que apesar de ter como orientação de voto o chumbo da emenda Spelman teve vários ministros a absterem-se.

Já a chamada emenda Green, favorável a uma saída sem acordo parcialmente ordenada foi chumbada com 374 votos contra e apenas 164 a favor.

(notícia atualizada pela última vez às 21:00)
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