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Governo vai analisar limite à isenção fiscal de despesas fixas em teletrabalho

Fiscalista e advogado dizem que como a proposta já aprovada mantém a necessidade de comprovar as despesas não é certo que o Fisco ou a Segurança Social não exijam o pagamento de impostos e contribuições. Mas os deputados vão reabrir o texto que já tinham votado. PS analisa proposta do BE para vir a fixar um limite após a entrada em vigor da nova lei, na sequência de muitos apelos.

O pagamento de despesas comprovadas de teletrabalho está previsto na lei desde janeiro do ano passado.
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Os deputados vão reabrir as votações sobre a definição do pagamento de despesas em teletrabalho e o seu tratamento fiscal. O PS vai analisar uma proposta hoje apresentada pelo BE para que venha a ser fixado um limite até ao qual a compensação paga pelas empresas – que poderá, nos termos da futura lei, ter um valor fixo – no prazo de 30 dias após a sua entrada em vigor. A negociação surge depois dos insistentes apelos de parceiros sociais, fiscalistas e advogados nesse sentido.

O Negócios tem questionado o Ministério das Finanças e os deputados sobre o facto de a proposta já aprovada nas votações de dezembro prever o pagamento de uma compensação fixa, isenta de impostos, mas sem fixar o limite – o que pode potenciar o pagamento de subsídios desproporcionadamente altos e criar uma nova dúvida sobre a tributação –  mas não tem obtido respostas às questões, suscitadas depois de conhecido o parecer da Autoridade Tributária (AT) sobre a lei em vigor.

Esta terça-feira, o Bloco de Esquerda decidiu apresentar na Comissão do Trabalho uma nova proposta que estabelece que "o governo estabelece, no prazo de 30 dias, o patamar legal até ao qual a compensação devida ao trabalhador pelas despesas adicionais em regime de teletrabalho se encontra isenta de contribuições e impostos, quando definida em contrato individual ou instrumento de regulamentação coletiva".

O deputado do PS Francisco José explicou que a análise pelo PS desta proposta é uma das poucas questões pendentes que levaram os deputados a adiar, uma vez mais, o fim das votações sobre as alterações ao Código do Trabalho, agora marcado para dia 1 de fevereiro.

"Ainda estamos a analisar", disse aos jornalistas o vice-presidente da bancada do PS Francisco César.

A questão tem estado naturalmente a ser articulada com o Governo, não só pelas implicações para o Fisco e para a Segurança Social como para a própria administração pública. Esta terça-feira a ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, confirmou que o Estado não está a pagar compensações aos funcionários em teletrabalho.

Os riscos de não definir um limite

Em dezembro, os deputados da Comissão do Trabalho tentaram superar a confusão gerada há um ano com o cálculo das despesas em teletrabalho através da consagração, no Código do Trabalho, da possibilidade de as empresas pagarem uma compensação de valor fixo, que ficaria isento de impostos. Porém, no texto aprovado por PS, PSD, BE e PCP não é estabelecido um limite para a isenção. Desta forma, não se afasta o risco de as empresas pagarem valores exagerados de compensação para fugir à tributação, nem o risco de o Fisco vir a adotar posições inesperadas, uma vez que no texto aprovado em dezembro continua a ser dito que as despesas têm de ser "comprovadas".

Há um ano, na primeira legislação sobre o assunto, os deputados decidiram que as empresas ficariam responsáveis pelo pagamento das despesas adicionais, que seriam aferidas por comparação com período homólogo. Contudo, este cálculo levanta inúmeros problemas, quando o trabalhador mudou de casa, quando é recém-contratado ou quando em sua casa trabalham outras pessoas. Por isso, muitas empresas optaram por pagar um valor fixo. Na semana passada a Autoridade Tributária divulgou um parecer, já de fevereiro, que veio dizer que os valores fixos pagos neste momento estão sujeito a impostos (e a contribuições).

O que foi aprovado em dezembro

Em dezembro, no processo de alterações ao Código do Trabalho que está a ser discutido no Parlamento para entrar em vigor nos próximos meses, os deputados do PS, PSD e PCP aprovaram uma proposta do BE que na prática legaliza as compensações de valor fixo.

"O contrato individual de trabalho e o contrato coletivo de trabalho devem fixar na celebração do acordo para prestação de teletrabalho o valor da compensação devida ao trabalhador pelas despesas adicionais", sendo o valor apenas definido por comparação se não houver acordo sobre o montante fixo. A nova redação mantém no entanto a norma que diz que a compensação "é considerada, para efeitos fiscais, custo para o empregador e não constitui rendimento do trabalhador".

Contudo, tal como sublinharam Luís Leon, fiscalista da consultora ILYA, e Pedro Marinho Falcão, advogado e sócio fundador da Cerejeira Namora Marinho Falcão, em declarações ao Negócios esta terça-feira, a nova redação de dezembro não elimina a parte que determina que o que está em causa são as despesas que o trabalhador "comprovadamente" suporte, pelo que, sem um limite de isenção, existe o risco da AT vir a entender que as faturas são necessárias ou a exigir a sujeição a impostos e Segurança Social.

O texto "continua a exigir à entidade empregadora que prove que corresponde ao aumento de despesas adicionais", diz Luís Leon, explicando que a única coisa que se resolve é a periodicidade com que as despesas têm de ser comprovadas. "Vamos simplificar o processo: vamos dizer que é um valor fixo para a isenção de impostos, por exemplo de 50 euros por mês", sugere o fiscalista, que entende que as regras fiscais não deveriam constar do Código do Trabalho.

Para Pedro Marinho Falcão, advogado e sócio fundador da Cerejeira Namora Marinho Falcão, essa também seria a melhor solução. Isto porque "não havendo qualquer tipo de espécie de limite os trabalhadores podem vir a ser confrontados com a obrigatoriedade de justificar o aumento de despesa quando exercem a sua atividade laboral em regime de teletrabalho", nomeadamente para efeitos fiscais.

Por outro lado, não se compreende a obrigatoriedade da "comprovação" de despesas quando o texto admite que sejam as associações patronais e sindicais, em negociação coletiva, a definir um valor fixo, que tem de ser respeitado, por imperativo legal, por todas as empresas de um setor, onde cada trabalhador terá um acréscimo diferente de custos. "Como é que se fixa o aumento das despesas que comprovadamente cada trabalhador tem por contrato coletivo?", questionava Luís Leon.

Há um ano, PS esteve contra a isenção

O princípio da isenção das despesas de teletrabalho foi introduzido na legislação em dezembro de 2021, pouco antes da dissolução do Parlamento, por proposta do PSD e só passou devido a uma coligação negativa, uma vez que o PS, que na altura não tinha maioria absoluta, votou contra.

Contudo, as alterações a esse mesmo artigo (168º) do Código do Trabalho que foram aprovadas em dezembro no Parlamento, e que mantêm a isenção fiscal, agora também em relação a um valor fixo, tiveram o apoio do PS (que já tem maioria absoluta).

Notícia atualizada com mais informação às 22:40

 

 

 

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