Notícia
Fugas, juros, bancos e 1.500 boas notícias numa só
Agarrámos "o touro pelos cornos", vimos os nossos juros descer e os juros dos outros subir, vimos a Holanda, a França e Espanha em nervos, Vítor Gaspar em acalmias, os funcionários públicos com novas regras. E vimos um político partir. Viagem guiada pela semana que hoje termina através das notícias que a fizeram.
Mil e quinhentas notícias numa só
Comecemos por uma boa notícia: a Nokia Siemens vai criar 1.500 postos de trabalho em Portugal. A notícia é uma excepção em tempos de crise e teve a associação imediata do presidente do AICEP, Pedro Reis, e do ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira, para quem esta aposta mostra que "os investimentos aparecem".
Em causa está um investimento num centro de prestação de serviços de dimensão global em Portugal, explicou João Picoito, o português que é director da Nokia Siemens Networks para a Europa do Sul, Leste e Central. O investimento totaliza 90 milhões de euros e será realizado ainda este ano.
Esta foi mesmo uma das notícias publicadas esta semana de sucessos "contra a crise". Mas houve outras notícias empresariais com o mesmo sentido. Como a da empresa portuguesa Vianas estar a exportar o que não consegue vender no mercado doméstico; ou a Brasmar exportar mais 400% este ano.
BPI perde sotaque brasileiro e ganha idioma espan... catalão
É uma das notícias da semana mas foi dada ainda no final da semana passada. A compra da posição que os brasileiros do Itaú detinham no BPI pelos espanhóis da La Caixa. A notícia foi aliás tornada pública ainda na semana passada, na sexta-feira pela hora do jantar, estranhamente logo depois de o BPI ter feito uma conferência de Impresa de apresentação de resultados. E assim, o facto mais importante da vida do BPI não foi comentado na conferência de imprensa.
Os detalhes foram entretanto conhecidos. O La Caixa passou a deter 48,97% do BPI, tendo pago 0,5 euros por cada acção comprada, um prémio de 22,5% face à cotação em Bolsa. E o Negócios revelou que a operação aconteceu não por vontade de os espanhóis investirem mas por vontade de os brasileiros venderem. E, assim, o BPI perdeu o seu parceiro histórico brasileiro. Aliás, a saída do BPI custou ao Itaú cerca de 200 milhões de euros.
Mas a operação teve uma característica polémica: a dispensa de lançamento de OPA. Apesar de a La Caixa ter ultrapassado o limite de 33% no BPI, a CMVM aceitou o pedido de não lançamento de uma oferta pública de aquisição, assumindo que não há controlo do banco português por parte da instituição financeira com sede na Catalunha.
Nesse sentido, a CMVM, regulador do mercado de capitais, criou um precedente que abre a porta a novas aquisições na Bolsa de Lisboa. Presidida por Carlos Tavares, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários tem sido chamada a pronunciar-se sobre diversas operações que estão a acontecer entre empresas cotadas. Além do caso do BPI, há ainda casos como o da Brisa e da Cimpor.
Banca: uma portaria contra a porcaria
Esta semana, o Negócios revelou em primeira mão o conteúdo de uma portaria que vai regulamentar a forma de apoio do Estado aos bancos que necessitarem de recorrer ao "pacote" de doze mil milhões de euros da "troika" para reforçar a sua estrutura de capital. Essa portaria estabelece as condições, exigências e contrapartidas.
O apoio estatal vai exigir que a banca conceda mais crédito a PME exportadoras e a famílias. Além disso, os banqueiros vão ver o seu salário reduzido para metade. No total, os bancos preparam-se para pedir ao Estado o triplo do que valem em Bolsa.
Os "indesmentíveis factos" dos mercados: o que nos corre bem e o que lhes corre mal
A semana foi muito acelerada nos mercados financeiros. A Euribor a seis meses perde terreno há 90 sessões seguidas, o que faz com que o alívio das prestações do crédito chegue a todas as famílias. E os desenvolvimentos em Espanha, na Holanda e em França tiveram impactos importantes nas bolsas e nos custos das dívidas. Portugal, em sentido contrário, teve uma evolução positiva.
"O ponto de viragem da crise é indesmentível pelos factos", afirmou o ministro das Finanças no Parlamento. Vítor Gaspar referia-se à descida muito pronunciada das taxas de juro da dívida portuguesa no mercado secundário, que está agora a níveis inferiores ao dia do pedido de intervenção externa, há cerca de um ano. No final de uma semana de descidas diárias, as taxas de juro portuguesas atingiram o nível mais baixo desde aquele mês de 2011. Tudo isto numa altura em que a dívida pública de Portugal subiu para 190 mil milhões de euros em Fevereiro.
Não foi assim com o resto dos países europeus. Por razões diferentes. Vejamo-las.
Em Espanha, Rajoy veio dizer que será necessário austeridade para evitar um resgate. Ainda a declaração ecoava e já a Standard & Poor's cortava o rating do país vizinho para três níveis acima de "lixo". Os juros subiram, as bolsas caíram, o euro desvalorizou-se. Depois, soube-se que a taxa de desemprego escalou para os 24% e que o PIB terá recuado menos de 0,4% no primeiro trimestre deste ano. E o Governo espanhol anunciou: o IVA irá aumentar em 2013.
Na Holanda, a austeridade criou uma crise política. O Governo demitiu-se, o que teve impacto imediato na queda das acções e subida dos juros. O primeiro-ministro demissionário, Mark Rutte, alertou: "Os problemas na Holanda são demasiado sérios". E foram marcadas eleições antecipadas.
Em França, sucedem-se as reacções à primeira volta das eleições, que teve lugar no domingo. Merkel revelou-se preocupada com a elevada votação na extrema-direita, no mesmo dia em que Hollande afirmou: "Merkel tem liderado a Europa ao lado de Sarkozy. Podemos ver os resultados". O debate para um novo Pacto para o Crescimento na Europa está lançado, tendo no entanto Sarkozy afirmado que "problemas de Portugal, Espanha e Grécia se devem às políticas socialistas". Marine Le Pen ataca Hollande e Sarkozy em carta aberta e a revista The Economist considera Hollande "um homem perigoso". E Angela Merkel responde a Hollande: "Pacto Orçamental não é renegociável".
As análises críticas e os pedidos de alteração de políticas europeias é que não param. Stiglitz diz que "a Europa está próxima de um suicídio". Da Islândia (onde o ex-primeiro-ministro escapou a ser o primeiro político preso por causa da crise) vêm a mensagem de que a austeridade "não chega" mas foi "parte muito importante" da recuperação. O economista-chefe do FMI, Paul de Grauwe, exorta Alemanha a aceitar Eurobonds, e diz que os "alemães estão a receber dinheiro da periferia e ainda se queixam". E já a própria Angela Merkel concede: austeridade é o "principal desafio" dos governos mas não a única solução. Em Portugal, José da Silva Lopes concorda que a "insistência germânica na austeridade vai ser a desgraça não só de Portugal mas da Europa". O elogio vem de van Rompuy: Portugal tem "agarrado o touro pelos cornos".
Voltando a Portugal, onde Gaspar nega uma espiral recessiva e já vê luz ao fundo do túnel, soube-se esta semana que o nosso custo de trabalho é menos de metade da média da Zona Euro. E que Portugal 2011 fechou com um défice orçamental de 4,2% do PIB. Já a Morgan Stanley previu um novo resgate a Portugal... e lucrará com isso.
Rescisões na função pública: amigáveis? Pagando, é claro, mas pouco
O Governo apresentou aos sindicatos uma proposta para as rescisões amigáveis na função pública. Se a proposta avançar nos moldes actuais, a mobilidade de funcionários vai ser possível apenas dentro na mesma entidade mas será alargada a todo o País. As rescisões serão pagas até um máximo de 12 salários. Além disso, soube-se que o Governo não prevê subsídio de desemprego para quem aceitar rescisões por acordo.
Duas outras polémicas marcaram a agenda esta semana: as comemorações do 25 de Abril e a suspeita de novas irregularidades na Madeira.
Mário Soares, Manuel Alegre e "capitães" faltaram às comemorações no Parlamento em protesto com o que consideraram ser falta de liberdade na actual governação. O ex-Presidente da República afirmou nesse dia que o "Povo português não vai deixar de reagir" à austeridade da troika. Já Cavaco Silva, no seu discurso, deixou um desafio: "O 25 de Abril dos nossos dias está em mostrar ao mundo o muito de positivo que o país tem".
Na Madeira, surgem suspeitas de que a "dívida oculta" da Madeira terá subido para 3,6 mil milhões de euros. Um quadro do Governo da Madeira terá tentado fugir com documentos, depois de as instalações do Governo Regional terem sido alvo de buscas, o que motivou críticas do Governo regional, pela falta de discrição. O Governo da Madeira desmente suspeitas de corrupção e que alguém tenha tentado fugir com documentos.
O final fica reservado para uma notícia que abalou a comunidade política portuguesa: a morte de Miguel Portas, aos 53 anos, um político que ainda há pouco perguntava: "Mas quando é que o povo respira?!"