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CGD, mobilidade, enfermeiros: Governo mantém o suspense
A revisão do cenário macro tem de ser vista com "naturalidade", o braço-de-ferro com os enfermeiros está a ser tratado, a mobilidade especial está em negociação e a Caixa tem de ser tratada com pinças. Mário Centeno respondeu a uma bateria de perguntas dos deputados, mas só aprofundou algumas.
Do Novo Banco à Caixa Geral de Depósitos (CGD), do novo diploma da mobilidade na Administração Pública às 35 horas, passando pela revisão em baixa do crescimento económico. Mário Centeno deslocou-se esta quarta-feira à comissão da Segurança Social e do Trabalho e foi confrontado com perguntas muito diversificadas, uma mais directamente relacionadas com o âmbito da comissão, outros apenas indirectamente. Não se esquivou a nenhuma, mas evitou ir a fundo nalgumas delas.
Mobilidade especial
Crítico do modelo do anterior Governo, Mário Centeno resolveu colocar em cima da mesa uma proposta que termina com a possibilidade de despedimento dos funcionários públicos, mas que mantém um cenário de corte salarial para aqueles funcionários que não encontrem um novo posto após o processo de requalificação.
A proposta causou incómodo no PCP e no Bloco de Esquerda, e há já rumores de que o Governo se prepara para abandonar a cláusula que admite o corte de 40% na remuneração, mas Mário Centeno não se descoseu sobre a solução.
Insistiu apenas que "não podemos garantir a toda a gente que as condições que hoje temos são iguais às que teremos amanhã" e que "quem trabalha na Administração Pública tem de estar consciente nas necessidades dessa adaptação". Soluções para esta necessidade de adaptação existem várias, o que é fundamental, segundo o ministro, é "não criar barreiras e estigmas onde queremos valorização".
35 horas e os enfermeiros
António Monteiro, do CDS/PP foi insistente nas perguntas: que percentagem de funcionários públicos não vai passar a trabalhar as 35 horas? Como é que o Governo garante que tudo se faz com diálogo social mas os enfermeiros estão a admitir avançar para greve?
Em causa está o facto de o Governo só garantir a descida do horário de trabalho para quem tem contrato em funções públicas, deixando os outros funcionários, que têm contrato individual de trabalho (CIT), ao resultado da contratação colectiva nas respectivas instituições.
A situação afecta especialmente os enfermeiros, e, se de início o Governo garantia que trataria todos de igual modo, acabou por recuar, levando os sindicatos a ameaçar com greves.
Mário Centeno não revela quantos funcionários públicos vão efectivamente ficar de fora das 35 horas (apenas se referiu a estatísticas gerais sobre o número de CIT, o que não é a mesma coisa) nem como vai acabar por resolver o assunto.
Deu, contudo, a entender que, se dependesse de si, o modelo de contratação no Estado generalizar-se–ia para a contratação individual.
"Deve ser um objectivo da Administração Pública não criar condições que se afastem de forma muito determinante daquilo que é o conjunto da economia nacional. Sabemos as especificidades que levam que algumas profissões tenham características específicas, mas devemos querer ter como objectivo ao longo do tempo que haja uma uniformização das condições de trabalho nos diferentes sectores em Portugal", disse o ministro.
Os CIT são uma matéria que tem de ser trabalhada no contexto do Código do Trabalho e no contexto das empresas em que isso se coloca.
Concretamente quanto aos enfermeiros, "é uma matéria que está em processo negocial e vamos conduzi-lo com a rapidez necessária", respondendo "quer às expectativas dos trabalhadores quer quanto às condições que temos para as concretizar", referiu.
Caixa Geral de Depósitos
As explicações que o Governo podia dar nesta fase estão dadas e perguntas como "quantos trabalhadores vão ser despedidos", "quantos balcões vão fechar?", e "qual o montante da recapitalização que vai para pagar indemnizações?" colocadas pelo PSD e pelo CDS, voltaram a ficar sem resposta.
Mário Centeno garantiu que a breve trecho haverá todos os esclarecimentos necessários, e apenas repetiu o que já havia sido garantido por António Costa de que "na CGD não vamos ter despedimentos" – haverá reformas antecipadas, até porque os funcionários reformam-se aos 60 anos, estando o fundo de pensões da CGD devidamente aprovisionado.
Pedindo cautela na forma como as questões financeiras são colocadas no debate político - "as questões financeiras não podem ser discutidas numa óptica partidária" - Mário Centeno justificou que "a questão está em negociação, é altamente sensível e não é passível de declarações públicas".
Repetindo as intenções gerais do Governo (que a CGD reoriente o seu modelo de negocio para apoiar a economia e as famílias, e seja redimensionada à realidade da banca nacional), Centeno socorreu-se ainda da entrevista concedida por Assunção Cristas ao Negócios para responder ao deputado do CDS/PP António Carlos Monteiro que "não me surpreende que o sr. deputado não esteja informado sobre o que se está a passar, porque a sua líder veio dizer que nunca o sistema financeiro foi discutido no Conselho de Ministros. Este Governo já debateu muitas vezes o sistema financeiro no Conselho de Ministros".
Novo Banco
Depois de esta quarta-feira ter dito em entrevista ao Público que espera que a venda do Novo Banco esteja decidida até ao final do mês, Mário Centeno não discorreu mais sobre o assunto na comissão de Segurança Social. "A discussão está do lado da Comissão Europeia para analisar a conformidade do processos à regulamentação da concorrência" , disse.
Sobre a legalidade dos despedimentos em curso, referiu apenas que "o governo tem estado atento à situação", e que já fez chegar à administração do NB a mensagem de que "o processo que tem envolvido uma redução do número de trabalhadores seja conduzido dentro das exigências legais".
Centeno sublinhou ainda aquilo que considera ser um feito excepcional deste Governo: o compromisso de vender o NB em apenas dois anos. "Os bancos irlandeses intervencionados no inicio da crise ainda hoje têm capital publico. Os bancos holandeses, os bancos ingleses, ainda hoje têm capitais públicos. O Estado português assumiu um compromisso que nenhum outro Governo ainda hoje assumiu: vender o NB em dois anos".
O ministro das Finanças lamentou ainda que o PSD e o CDS não assumam as suas responsabilidades na falência do BES. "Cada um tem de assumir a sua responsabilidade neste País" e "não é possível que um Governo perante o que se passou no BES possa dizer que a responsabilidade é do Banco de Portugal. É contraditório com a necessidade de o Governo ser o garante da estabilidade financeira", rematou.
CRESAP
O PSD quis saber o que vai acontecer à CRESAP, mas apenas recolheu a confirmação de que alguma coisa vai mudar, tendo ficado por saber o quê em concreto.
"Achamos que o modelo tem virtualidades mas tem os problemas que, se calhar na sua aplicação, qualquer modelo tem", disse Centeno, para lembrar a partidarização que ele permitiu, como os casos dos Centros Distritais da Segurança Socia testemunham.
A mudança será feita de modo a garantir que chegarão "ao topo da Administração Pública o que de melhor ela tem".
Crescimento em 2016
A admissão de que este ano a economia portuguesa não crescerá 1,8%, como inicialmente previsto pelo Governo, deu o mote ao CDS/PP e ao PSD para voltarem a atacar Centeno pelo irrealismo das suas previsões macroeconómicas. Mas, para o ministro das Finanças, esta é "uma questão de enorme naturalidade".
Repetindo as explicações que já tinha dado em entrevista ao Público, Centeno enquadrou que "Portugal parou de crescer no segundo semestre de 2015. Quando este Governo tomou posse, a economia não crescia há seis meses" e alterar este padrão requer tempo.
A aceleração está em curso e só não é mais pronunciada por causa dos factores externos. As previsões iniciais baseavam-se numa expectativa de evolução de 4,3% na procura externa, que entretanto foi revista em baixa por todas as organizações internacionais. E cada ponto de redução no crescimento da procura externa tem um impacto negativo de 0,36 pontos no crescimento da economia nacional, contabilizou.