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A reforma agrária ainda não terminou

Há feridas que não saram, convicções intactas, processos ainda em tribunal. O Ministério da Agricultura acredita ter todas as indemnizações pagas até Abril de 2011 - 36 anos depois

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Há feridas que não saram, convicções intactas, processos ainda em tribunal. O Ministério da Agricultura acredita ter todas as indemnizações pagas até Abril de 2011 - 36 anos depois

"Que deixou marcas, deixou". A frase de José Andrade, ex-presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), cola-se a todos os intervenientes no processo da reforma agrária, que terá nascido em Dezembro de 1974, com a ocupação do Monte do Outeiro, no concelho de Beja. O diploma que legaliza as ocupações só seria publicado em Diário da República a 29 de Julho de 1975.


Ocupados e ocupadores, governantes, militantes políticos e cantores de intervenção guardam as memórias desses tempos. Há feridas por sarar e convicções que se mantêm, em alguns casos, intactas. Passados 35 anos, a reforma agrária ainda é um dossiê aberto. O Ministério da Agricultura conta resolver os últimos nove processos de indemnização, todos na região do Alentejo, em Abril do próximo ano e explica que os recursos apresentados em Tribunal dizem respeito a critérios de determinação das rendas e do valor da cortiça. Até agora já foram ressarcidos 3.926 proprietários, que o Estado diz corresponderem a 99% dos casos. Alguns, foram-no a título já póstumo.


Feitas as contas, provisórias, o Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público já pagou indemnizações no âmbito de reforma agrária no valor de 241,5 milhões de euros. Esta verba integra os montantes pagos no âmbito da Lei 80/77, de 26 de Outubro, e os que decorrem das sentenças emitidas pelo Tribunal dos Direitos do Homem.


Mais complicada é aritmética das emoções. António Barreto, o ministro da Agricultura responsável pela lei que permitiu restituir a terra aos proprietários, diz que a reforma agrária, "feita daquela maneira, foi um disparate e uma inutilidade". "O que eu via eram homens e mulheres a viver os momentos de maior felicidade da vida deles", lembra José Jorge Letria, que andou pelas cooperativas como cantor de intervenção. Agora, a uma distância de 35 anos, a sua análise é ambivalente. "Houve casos em que a ocupação foi absolutamente justa e já era desejável há muito tempo, e casos em que foi desumana. As revoluções dão para os excessos e para os ajustes de contas".



Ian Richardson, hoje dono da herdade do Mouchão, viu estas terras, que eram do seu sogro, serem ocupadas e baptizadas com o nome de Cooperativa Agrícola 25 de Abril. Voltaram à posse dos antigos proprietários e os que as ocuparam, por lá ficaram na condição de trabalhadores. "As revoluções têm destas coisas", concede. Coisas como as ocupações que Joaquim Canejo liderou no concelho de Coruche e das quais guarda imagens vivas, acompanhadas ainda hoje por um busto de Lenine. Afinal, as histórias da reforma agrária são feitas com pessoas lá dentro. E é disso que aqui se fala.


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