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Governo esmiuça e cobra mais por festas em monumentos
O novo regulamento sobre cedência de espaços obriga ao dobro da antecedência no pedido e a detalhar o programa do evento e o nome dos envolvidos. A alteração, que surge após um polémico jantar no Panteão, vem também inflacionar os custos e restringir as iniciativas em alguns locais.
Os pedidos de empresas ou de particulares para a cedência de espaços em 24 museus, palácios ou monumentos vão ter de apresentar "de forma detalhada" as actividades a desenvolver naqueles locais, obrigando também a identificar todas as entidades que estarão envolvidas, "nomeadamente nos casos em que os pedidos são apresentados por intermediários, designadamente dos sectores da hotelaria ou da restauração".
A maior minúcia na requisição destes espaços é um dos principais destaques no novo regulamento de cedência de espaços dos serviços dependentes e dos imóveis afectos à Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), que entra em vigor a partir desta quinta-feira, 22 de Março. Alterações que surgem depois do polémico jantar realizado no Panteão Nacional durante o Web Summit, em Novembro de 2017.
Os pedidos de cedência passam também a ser "formulados com a antecedência mínima de 30 dias relativamente à data pretendida", quando até agora bastavam 15 dias. Nesta nova versão, apresentada num despacho conjunto dos ministros das Finanças, Mário Centeno, e da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, desaparece também a cláusula que permitia excepções no cumprimento deste período em pedidos que "pela sua natureza e pela simplicidade de meios envolvidos, [era] susceptível de ser objecto de análise e decisão em prazo mais curto".
E se a competência para decidir sobre a "oportunidade e interesse da cedência de espaços, bem como das condições a aplicar" continua a ser do director-geral da DGPC, o novo regulamento publicado em Diário da República acrescenta que "todos os pedidos de cedência devem ser previamente analisados do ponto de vista jurídico, da segurança e da sua compatibilidade com o prestígio histórico, identitário e patrimonial dos espaços a ceder".
Como o ministro da Cultura prometeu logo após surgir este caso – e na mesma altura um outro envolvendo a encenação de uma fogueira no Convento de Cristo, em Tomar, durante a rodagem de um filme –, este despacho obriga agora à apresentação de um plano de segurança do evento e a identificar um responsável que deve assinar uma declaração em que se responsabiliza pela "aceitação e cumprimento das determinações de segurança aplicáveis".
Além disso, no Panteão Nacional, instalado na Igreja de Santa Engrácia, "só podem ser autorizados eventos de natureza cultural, criteriosamente seleccionados e enquadrados com a dignidade dos espaços". No Mosteiro dos Jerónimos, também em Lisboa, e no Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha – em Maio de 2016 ambos foram reconhecidos com o estatuto de panteão nacional – surgem igualmente maiores restrições, que acabam por se reflectir indirectamente nos valores cobrados pelo Estado.
Subida de preços acompanha restrições
A análise comparativa às duas tabelas mostra que esta polémica foi aproveitada pelo Governo para inflacionar alguns preços. Desde logo no Panteão Nacional, em que um evento cultural (o único que agora é ali permitido) no Corpo Central do monumento custa agora cinco mil euros, ou seja, cinco vezes mais do que o que, por tabela, terá sido pago pelos promotores do polémico jantar aquando da cimeira tecnológica. E a lotação máxima também diminuiu: de 400 lugares sentados ou 800 em pé, o diploma define agora, sem mais detalhe, que a lotação máxima em 500 lugares.
Ainda na capital, alugar a Sala do Baluarte da Torre de Belém para um jantar passa a custar dez mil euros, quando antes valia 7.500 euros. E por um cocktail no Refeitório do Mosteiro de Alcobaça são cobrados mais mil euros do que antes, subindo o valor para um total de 3.600 euros. Outro exemplo: um evento cultural no Claustro Real do Mosteiro da Batalha, que é agora o único viável naquele espaço, custa mil euros. Isto é, quatro vezes mais do que o montante anterior (250 euros), além de que era possível realizar ali jantares, cocktails e eventos sociais. Por outro lado, o diploma prevê um desconto de 50% sobre os valores de tabela se o tempo de utilização dos espaços for até três horas.
Segundo os cálculos feitos pelo Expresso, a aprovação das regras para o aluguer de monumentos em 2014 fez disparar as receitas do Ministério da Cultura com este expediente, que o Orçamento do Estado para 2018 prevê que atinjam meio milhão de euros. É que dos 2,14 milhões gerados nos últimos seis anos nesta rubrica, três quartos acabaram por ser arrecadados depois da entrada em vigor dessa legislação, uma iniciativa do então secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier.
Sindicatos, horas extras e cancelamentos
O despacho sobre as regras aplicáveis na cedência de espaços em monumentos aproveita também para rever e actualizar algumas normas de pormenor. Uma delas é que, se antes a lei dizia que seriam "rejeitados os pedidos de carácter político ou sindical", a partir de agora passam a ser "autorizadas reuniões de natureza sindical", desde que "legalmente enquadradas" e envolvendo directamente os trabalhadores daqueles serviços. E quem paga as horas extras dos funcionários da Direcção-Geral do Património Cultural na preparação e realização da iniciativa? A entidade cessionária, responde a nova legislação, que obriga a fazê-lo até 48 horas após o final do evento. O diploma passa ainda a prever a possibilidade de cancelamento de uma cedência "em resultado da marcação de cerimónias presididas pelo Chefe de Estado", garantindo a devolução dos 25% adiantados pela entidade privada pela reserva do espaço.