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Nascer em Portugal já não é o que era

Nascer em Portugal é hoje muito mais seguro, mas viver não é necessariamente mais fácil. Apesar de haver mais oportunidades, o percurso é mais complexo, com sérios obstáculos demográficos e enormes pontos de interrogação no final do caminho.

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10 de Julho de 2017 às 22:00
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O João acabou de nascer. Tem muito mais probabilidades de sobreviver nos primeiros meses de vida do que outro bebé há algumas décadas. É provável que os pais não sejam casados e tenham um nível de escolaridade superior ao dos seus avós. Por falar em avós, graças à subida da esperança média de vida, o João tem mais hipóteses de os conhecer. Será mais difícil ter um irmão e, caso ele exista, há mais probabilidades de partilharem apenas um dos pais. "A criança que nasce hoje não tem nada a ver com os anos 70", sublinha Maria João Valente Rosa, directora da Pordata.

Hoje, no Dia Mundial da População, a base de dados criada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos publicará o seu nono "Retrato de Portugal", juntamente com uma actualização dos dados da plataforma "Nascer em Portugal". Indicadores que permitem aferir como mudou a vida dos portugueses, do início até à fase final das suas vidas.

O nosso bebé fictício "João" beneficia de nascer numa altura em que a taxa de mortalidade infantil é mais de vinte vezes inferior à década de 60. Um caso de sucesso internacional. Hoje, a maioria dos filhos já nasce fora do casamento (para 17% os pais nem sequer vivem juntos). Como cada mulher tem, em média, 1,36 filhos, o João tem mais probabilidade de ser filho único, mas um em seis tem já um filho de outra união. 

O João viverá provavelmente mais tempo: a esperança média de vida saltou de menos de 70 para mais de 80 anos. Terá acesso a bens que os seus pais não tiveram e oportunidades com que os seus avós talvez não sonhassem. Parte das vantagens estão no sistema educativo. A taxa de escolarização do segundo e terceiro ciclo saltou de valores de apenas um dígito nos anos 60 para próximo dos 90%.

Mas isso não quer dizer que o João deva contar com facilidades ao longo da vida. O desemprego, por exemplo, está em níveis historicamente elevados, principalmente entre os jovens até aos 25 anos. O salário mínimo, que em 2001 abrangia 4% dos trabalhadores por conta de outrem, é recebido agora por um em cada cinco. Ao mesmo tempo, o rendimento das famílias recuou entre 2008 e 2014.

"As avenidas de progresso terão de ser diferentes. A lógica é menos linear. A vida descontinuou-se. O emprego, o casamento, a emigração não são para a vida", sublinha Maria João Valente Rosa. "A percentagem de trabalhadores com salário mínimo é um indicador negro. A escolaridade, mesmo com grandes progressos, continua baixa em face à Europa. Mais de metade dos nossos empregadores têm no máximo o nono ano."

Quanto mais para frente projectarmos a vida do João, a mais pontos de interrogação chegaremos. Quando ele tiver 70 e tal anos, qual será a sua reforma? Os sinais demográficos não são encorajadores. "A sociedade mudou profundamente. E estamos a conviver mal com isso", nota Valente Rosa, referindo-se ao desequilíbrio cada vez maior entre quem contribui para o sistema de Segurança Social e quem beneficia dele. "As causas são positivas [viver mais anos], mas não gostamos destes resultados."

A Pordata diz querer dar aos cidadãos armas para um debate mais informado e menos condicionado. "Nasci numa altura em que muita gente não sabia ler. Na paragem perguntavam a outra pessoa quando vinha o próximo autocarro e tinham de acreditar nelas", recorda a directora da Pordata. "Queremos alargar o debate com factos e não ideias feitas."

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