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Se pensa que sabe tudo sobre rosés, pense de novo

Da Quinta do Portal sai um trio que encantará quem gosta de vinhos com boas histórias para contar aos amigos. E muita atenção a um rosé que chocalha contra as regras estabelecidas.

10 de Fevereiro de 2018 às 13:00
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Cada caixa Unlocked é vendida com os dois vinhos brancos e o rosé. Custa: 45€


Quando a gente pensa que o vinho mais difícil de explicar é o Porto ou o Madeira (puzzles criados no tempo da pré-história do marketing), vem o enólogo da Quinta do Portal baralhar tudo. Ou melhor, vem Paulo Coutinho recordar-nos de que a humildade é uma amiga que devemos ter sempre por perto.

Eu sei, por exemplo, que há um ou outro enólogo que apresenta no mercado vinhos brancos com várias colheitas numa mesma garrafa (Manuel Vieira, quando estava na Sogrape, e agora Álvaro Van Zeller, com o seu recém-lançado Kaput), mas não sabia que um enólogo pouco badalado, mas respeitado entre os pares andava, em Sabrosa, numa adega desenhada por Álvaro Siza Vieira, a fazer um vinho rosé que mistura.... cinco colheitas. Ou melhor: cinco colheitas + borras finas de outras três colheitas recentes. O leitor está confuso? Pois, pudera. O único defeito deste grande rosé chamado Unlocked e que nos desafia à mesa é mesmo o seu processo criativo e as ideias supostamente malucas que andavam na cabeça do enólogo, mas vamos desmontá-lo.

Experimentalista solitário quando não está a fazer lotes para os vinhos-âncora da Quinta do Portal, Paulo Coutinho descobriu que, entre os "stocks" em barrica e em garrafa de vinhos rosé, havia colheitas que, com o tempo, ganharam perfis evolutivos curiosos. Uma colheita teria um aroma de fruta e outra umas notas vegetais; certo ano, deu um bom volume de boca e outro uma acidez mais pronunciada. E por aí fora.

Vai daí, criou um lote com vinhos rosé de 2008, 2009, 2010, 2011 e 2012. Uma vez homogeneizado, o enólogo entendeu que seria necessário reforçar a frescura e acrescentar complexidade ao vinho. E o que fez? Pegou no lote e envolveu-o com borras finas de vinhos mais recentes. Em concreto, colheitas de 2013, 2014 e 2015. Quando as borras terminaram o seu trabalho, o vinho foi engarrafado e mandado para descanso durante cerca de um ano.

A partir deste trabalho de alquimia, temos então um rosé disruptivo que, do meu ponto de vista, cheira a champanhe rosé, sendo que a boca é untuosa, cremosa e aveludada, com a acidez a prolongar os sabores de evolução do vinho. No nariz, o copo vai libertando novos aromas. Ora temos flores (rosas), ora sentimos frutos secos, pastelaria, especiarias e mais não sei o quê. Sim, é evidente que a história do vinho obriga-nos a uma maior concentração e a uma maior procura na desmontagem do seu perfil, mas a verdade é que estamos perante algo único em Portugal. Único e muito bom, visto que nem sempre os dois itens se juntam.

Convém dizer que o rosé faz parte de um trio de vinhos que leva o nome de Unlocked porque o enólogo e a família que administra a Quinta do Portal quiseram provar que a empresa tem liberdade, vontade e recursos para percorrer um trilho mais livre. Donde, nada fechado à inovação.

O que faz feliz um director financeiro de qualquer adega é a liquidez que liberta os vinhos de grande volume. Nunca as caixinhas bonitas para uns quantos "nerds" do vinho. Mas há espaço para tudo. "Trabalho nesta empresa há 23 anos, pelo que estou ciente da importância das vendas. Mas tenho liberdade e matéria-prima para fazer pequenas brincadeiras que surpreendem", salienta Paulo Coutinho.

As outras duas brincadeiras na caixa são um branco de Malvasia Fina e outro de Viosinho. Se este último não constituirá uma novidade enquanto vinho varietal (ainda assim um branco poderoso), o Malvasia Fina é capaz de ser um monocasta único e com carácter desafiante pelas suas notas mais florais e algo doces, com uma boca cheia. Poderá também não ser um vinho consensual, mas provado com queijo de pasta dura e picante torna-se fantástico. Com comida asiática, idem.

Aliás, ao idealizar o trio Unlocked, Paulo Coutinho pretendeu provocar. Quis que o Viosinho pudesse acompanhar carnes gordas (tipo um leitão) e que o rosé ligasse com uma sobremesa de pastelaria com frutos secos. E tem razão.

O único desagrado que eu via neste trio era a falta de informação, quer na caixa quer nos contra-rótulos. Nadinha. E, quando comentei isto com o enólogo, perguntando se a ideia era copiar o modelo francês (ausência de indicação de castas), ele nem gaguejou. "O que nós queremos é surpreender, criar emoção e despertar a curiosidade dos consumidores. Se conseguirmos isso, a Quinta do Portal está cá para os receber. Esta é não é uma quinta qualquer. Tem uma adega desenhada por Siza Vieira, uma unidade de hotelaria fantástica, um restaurante excelente e uma loja com gente competente. Não temos contra rótulos explicativos, ok, mas temos gosto em explicar tudo aqui - esta colecção Unlocked e os restantes vinhos da Quinta do Portal. Adoro quando os consumidores saem daqui a saber mais."

Pronto, pronto, já cá não está quem falou em desagrados.



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