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Homens sempre sós

Haruki Murakami regressa com um conjunto de contos onde os protagonistas são homens que vivem numa profunda solidão, longe do contacto feminino.

30 de Setembro de 2017 às 09:15
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Haruki Murakami
Homens sem Mulheres
Casa das Letras,
250 páginas, 2017


Os sete contos que compõem este "Homens sem Mulheres" giram à volta daquilo que se depreende a partir do título: a solidão. São personagens diferentes, de um actor viúvo a um cirurgião plástico que entra num jejum total, todos eles com os seus pesadelos. Não se trata apenas de homens sem mulheres. Eles, como o actor Kafuku, acham que é impossível atravessar a ponte que separa os homens das mulheres, porque não conseguem vislumbrar como o outro sexo pensa. Murakami é um mestre na arte da prosa: ela é refinada e clara. E isso transparece na forma como nos vai descrevendo as personagens e a sensibilidade como nos apresenta as suas contraditórias emoções.

Todos estes homens vão envelhecendo e, segundo se vai percebendo, parecem ir despertando para pormenores a que não davam atenção. Talvez possamos chamar a isso experiência. Mas o certo é que a vida continua a ser confusa, os gatos são uma das fontes de conforto mais óbvia, e o território preferido de alguns são bares onde se escuta jazz e se bebe whisky. Todos buscam, no fundo, algum sentido para a vida e, sobretudo, para a sua própria existência.

Murakami sempre teve o condão de esconder quase tanto como aquilo que nos mostra (quem leu o labiríntico "1Q84" perceberá um pouco melhor isso). Há muitas ligações a memórias de sucessivas gerações, como é visível em "Yesterday" (a partir da canção dos Beatles), onde um jovem de 20 anos pede ao seu melhor amigo que passe a andar com a sua namorada (uma jovem que conhece desde a infância e com quem só trocou alguns beijos e não teve qualquer experiência sexual). Os sonhos estão aqui também cheios de referências metafóricas, como por exemplo à Lua, algo que é muito normal na literatura oriental.

O envelhecimento é carregado neste "Yesterday": o narrador acaba apaixonado pela namorada do amigo, mas nunca anda com ela e só a vem a reencontrar década e meia depois. Ela está solteira e ele, casado. Mas não acontece o esperado e o narrador acaba só, sem uma mulher por perto, escutando a canção dos Beatles e pensando como eram os seus sonhos quando tinha 20 anos.

Tudo aquilo que encontramos nestas histórias tem que ver com solidão e tristeza. E também com muitas mortes, algumas delas trágicas. E isso debilita os narradores, como Kafuku, que como actor necessita de chegar ao teatro todas as noites sem ter acidentes (por motivos alcoólicos ele já teve alguns) e por isso contrata uma jovem pouco atractiva e de poucas falas para o transportar de carro. Mas, no fundo, Kafuku é um homem sem amigos, solitário, que se vai corroendo a si próprio numa longa tortura.

As suas conversas com a condutora são uma longa caminhada através do seu casamento que se foi desfazendo defronte dos seus próprios olhos, o que levou a que ele tenha mesmo tido como amigo o amante da sua mulher. Como é típico nas obras de Murakami as suas personagens vão perdendo a alma ou então buscam desesperadamente salvar o que resta delas. O que se torna muitas vezes uma tarefa ingrata. Mas esse parece ser o destino da obra do escritor.

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