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Faltam portugueses na Comissão Europeia

Portugal está há meses sem um posto de diretor-geral, ou adjunto, na Comissão Europeia. O número de funcionários portugueses tem vindo a diminuir nos últimos anos. A sub-representação pode levar a uma perda de influência interna. Entretanto, o Governo tomou medidas para inverter situação.
Vasco Gandra 29 de Abril de 2023 às 09:30

O alerta foi dado em agosto de 2021 por Fernando Frutuoso de Melo, ex-funcionário europeu, ex-diretor-geral na Comissão Europeia e hoje chefe da Casa Civil da Presidência da República. Na escola de verão da Representação da Comissão em Portugal disse então que "o número de portugueses tem vindo perigosamente a decrescer" nas instituições europeias, "está a baixar rapidamente", e que isso pode levar a uma perda de informação sobre a realidade portuguesa nos processos de tomada de decisão e também à perda de influência interna. Defendeu a necessidade de preparar melhor os candidatos portugueses para os concursos de acesso às instituições por forma a reforçar a presença lusa.

Os dados do executivo comunitário confirmam esta tendência. O número de portugueses está a diminuir e atualmente não há nenhum português diretor-geral na orgânica da Comissão. Há até dezenas de portugueses nos graus superiores da hierarquia - no chamado grupo AD (Administrador), onde são recrutados os diretores-gerais e adjuntos -, mas Portugal ficou sem o único posto de diretor-geral que ocupava quando Mário Campolargo deixou Bruxelas há cerca de um ano para assumir o cargo de secretário de Estado da Digitalização.

Os diretores-gerais são o cargo hierárquico mais elevado da função pública europeia. Respondem perante o comissário da pasta e lideram dezenas de funcionários das direções-gerais da Comissão responsáveis por executar as políticas, a legislação e os programas de financiamento da UE. A base legal aplicável refere que uma nacionalidade está adequadamente representada caso haja um diretor-geral, ou adjunto, desse país. Contactada pelo Negócios sobre a possibilidade de Portugal vir a ter um diretor-geral, ou adjunto, ainda este ano, a Comissão escusou-se a especular sobre eventuais próximas nomeações para altos cargos.

Segundo dados da Comissão Europeia, a 1 de janeiro de 2022, o número de portugueses - entre funcionários, pessoal temporário e trabalhadores locais - no conjunto dos serviços da Comissão era de 775, num total de 32.169 - ou seja, 2,4%. O número de portugueses tem vindo a diminuir desde pelo menos 2017 (2,6%, ou 852 em 32.546) em números absolutos ou relativos, indicam diferentes tabelas estatísticas, e está atualmente abaixo da taxa de referência estabelecida para garantir o equilíbrio geográfico em matéria de recrutamento e que é de 3,1% para Portugal.

Mas não é caso único. No início do ano passado, a maioria dos Estados-membros tinha um número de funcionários nacionais abaixo das respetivas taxas de referência. Em contraste, a Grécia, com a mesma taxa de referência de Portugal, viu o número de funcionários nacionais subir de 4% em 2016 para 4,4% no ano passado (1427 funcionários).

Estratégia para inverter a tendência

Uma das prioridades para inverter a situação passa por preparar melhor os candidatos portugueses para as provas de acesso às instituições comunitárias. Para isso, o Governo aprovou no final do ano passado uma estratégia de reforço da presença de funcionários lusos nas instituições em que se prevê o reforço dessa preparação.

"Portugal encontra-se numa situação de sub-representação, sobretudo nos quadros da Comissão Europeia. Conscientes desta realidade, temos vindo a tomar medidas", explica ao Negócios o secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Tiago Antunes. A estratégia tem um orçamento de 1 milhão de euros este ano e passa pela divulgação de oportunidades de emprego nas instituições, formação e preparação específica para concursos de acesso, incentivo ao destacamento de funcionários públicos da administração nacional para Bruxelas e aumento das bolsas aos alunos do Colégio da Europa (Bruges), que é uma porta de entrada nas instituições.

"Há várias medidas em curso com o objetivo de aumentar o número de entradas e, pela base, de termos mais portugueses a aceder às carreiras, mas também de termos mais portugueses em posição de destaque e em lugares de responsabilidade. Pela primeira vez, Portugal não ocupa qualquer posição de diretor-geral na Comissão. Temos chamado a atenção para a necessidade de corrigir esse défice e de voltarmos a ocupar uma posição de diretor-geral ou subdiretor-geral", afirma Tiago Antunes.

Também a ex-representante da Comissão em Portugal e antiga secretária de Estado, Margarida Marques, sublinha a importância de ter mais portugueses nas instituições, sobretudo em lugares-chave. A eurodeputada do PS diz que "não há risco de o país perder influência", mas que é importante a diversidade nacional no processo legislativo. "As propostas da Comissão têm um percurso que passa pelo Parlamento e pelo Conselho, mas o texto das propostas iniciais é muito importante e condiciona o processo de decisão. É por isso que a visão do lado português é importante, na medida em que estas propostas políticas e legislativas se fazem de diversidade." 


Altos cargos na função pública da Europa
João Vale de Almeida, Fernando Frutuoso de Melo e Mário Campolargo são alguns dos portugueses que exerceram altos cargos na função pública europeia


João Vale de Almeida
Um português na alta diplomacia europeia

É um dos quadros portugueses com mais experiência comunitária e da diplomacia da UE. Passou pela Representação da Comissão em Portugal ainda antes da adesão, foi porta-voz adjunto do executivo comunitário e diretor em vários departamentos. Foi chefe de gabinete de Durão Barroso no primeiro mandato na Comissão e, em 2009, diretor-geral das Relações Externas. No ano seguinte rumou aos Estados Unidos como chefe da delegação da UE em Washington e depois, em 2015, junto das Nações Unidas. Entre 2020 e 2022, foi o primeiro chefe da delegação da UE junto do Reino Unido no pós-Brexit.


Fernando Frutuoso de Melo
Chefe da Casa Civil da Presidência da República

O atual chefe da Casa Civil da Presidência da República, Fernando Frutuoso de Melo, é um veterano de Bruxelas. Passou um dos primeiros concursos para portugueses e entrou na Comissão em 1987 onde exerceu várias funções. Foi chefe de unidade na DG Pescas, chefe de gabinete do comissário do Alargamento, diretor no secretariado-geral da Comissão e chefe de gabinete adjunto no segundo mandato de Durão Barroso. Foi ainda diretor-geral adjunto na DG dos Recursos Humanos e Segurança e, em 2013, alcançou o topo como diretor-geral da Cooperação Internacional e Desenvolvimento.


Mário Campolargo
O último português a ocupar um posto de diretor-geral na Comissão Europeia

O atual secretário de Estado da Digitalização e Modernização Administrativa, Mário Campolargo, foi o último português a ocupar um posto de diretor-geral na Comissão Europeia até integrar o atual Governo. Entrou na Comissão em 1990, como gestor e responsável científico de um programa de investigação em telecomunicações. Subiu os diferentes escalões da função pública europeia - chefe de unidade, diretor - na área das tecnologias, infraestruturas, cibersegurança, ciência. Mário Campolargo atingiu o topo em 2016 quando foi nomeado diretor-geral adjunto e depois diretor-geral da Direção-Geral de Informática.

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