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Dados do Fórum Económico Mundial indicam que a pandemia acrescentou mais 36 anos ao tempo anteriormente previsto para as mulheres atingirem a igualdade de género. Esta meta só será alcançada globalmente no ano de 2157. Na Europa será antes, por volta do ano 2105. Portanto, por cá, ainda faltam sensivelmente 84 anos até homens e mulheres terem efetivamente igualdade de direitos. Não é, pois, por acaso que a igualdade e a diversidade estão direta e indiretamente explanadas na lista dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) a atingir até 2030.
O tema da igualdade e da diversidade como fatores basilares de uma sociedade justa foi discutido na talk "Igualdade e Diversidade - Um mundo mais justo", organizada pelo Jornal de Negócios a 4 de novembro, naquele que é o segundo ciclo de talks sobre sustentabilidade do jornal. O debate contou com a participação de várias personalidades, nomeadamente, António Saraiva, presidente da CIP; Bruno Casadinho, managing director da Capgemini Engineering; Margarida Couto, sócia da Vieira de Almeida e presidente da GRACE; Sandra Ribeiro, presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG); e Isabel Soares, responsável pelos Assuntos Institucionais da Tabaqueira. A moderação esteve a cargo de Diana Ramos, diretora do Jornal de Negócios.
O debate arrancou com o assinalar do importante papel que as empresas têm na transformação para um mundo mais justo. "O papel das empresas é de transformação", começou por afirmar António Saraiva, que acrescentou: "Há práticas de desigualdade a vários níveis que não se podem manter. E, por isso, as empresas têm um trabalho acrescido enquanto células da sociedade para desenvolverem a correção das anomalias".
Como responsável por uma organização que congrega 185 empresas com preocupações sustentáveis, Margarida Couto salientou que as empresas estão a aprender umas com as outras a implementar os ODS e que esta transformação é mesmo uma questão de competitividade para as próprias. "O tema da igualdade de género é, sem dúvida, um tema de justiça social, mas é também um tema económico, um tema de competitividade e uma enorme oportunidade para as empresas, porque há muitos estudos que demonstram que são mais lucrativas e resilientes. Ou seja, o business case da diversidade é tão evidente que é quase uma irracionalidade económica as empresas não incorporarem essas práticas", afirmou.
Bruno Casadinho corroborou: "Na Capgemini, olhamos para o tema da igualdade e da diversidade como um fator de competitividade". Com um conselho de administração equitativamente distribuído, sendo que em tempos foi composto 100% por mulheres, o responsável afirmou que "percebemos há muito tempo que o maior fator de inovação que temos é a diversidade. Não só de género, mas também uma diversidade cultural, do ponto de vista de fé e religião, do ponto de vista de origem de onde as pessoas vêm, etc. E o maior conselho que eu costumo dar às empresas que querem criar uma cultura de inovação é: mais do que tentarem introduzir programas de ideação, invistam em equipas diversas que automaticamente essa inovação vai surgir". E recorda os efeitos positivos que a diversidade impregnou no Fundão, quando a empresa abriu lá escritório: "Ter diferentes nacionalidades naquela cidade fez com que, por exemplo, tivessem surgido restaurantes vegetarianos, para endereçar as necessidades de pessoas vegetarianas. E hoje proliferam outras empresas do mesmo ramo naquela região, sendo um bom exemplo de como a diversidade pode de facto mudar as empresas e também a sociedade".
O exemplo referido mostra como a sociedade está a evoluir nesta matéria. "Eu acho que tem havido uma grande evolução na forma de gerir recursos humanos e na gestão empresarial de há quinze anos a esta parte. E isso passa muito pela tomada de consciência de que as questões de igualdade e de diversidade são, efetivamente, ferramentas e estratégias de gestão importantíssimas e que são também instrumentos de concorrência", salientou a presidente da CIG. Sandra Ribeiro acrescentou ainda que "a questão da diversidade ligada à criatividade e à inovação está mais do que provada. Portanto, aquilo que me parece é que as empresas que querem estar no mercado, atrair os melhores talentos e dar uma imagem competitiva e de modernidade aos seus clientes estão cada vez mais a apostar nesta área".
Como representante da Tabaqueira, Isabel Soares destacou o facto de esta ser uma empresa muito focada no equilíbrio de género, onde o acesso aos lugares de gestão de topo e a igualdade salarial são uma realidade. Salientou que "40% das mulheres ocupam já um lugar de gestão de topo na empresa. Queria dizer também que a Tabaqueira foi em 2019 a primeira empresa a receber em Portugal a Certificação de Igualdade Salarial, que de facto garante remuneração igual entre homens e mulheres por trabalho igual. É sem dúvida uma empresa exemplar em matéria de igualdade e diversidade. Porque mais do que ter políticas de inclusão ou de diversidade, está na própria cultura da empresa, no seu ADN. Porque cedo percebeu que alcançar esta igualdade de género não beneficiaria apenas as mulheres, mas também fortalecia as empresas e a sociedade".
Quotas, um mal necessário
Estando identificados problemas de desigualdade, havendo estudos a provar a eficácia da igualdade e da diversidade, o que fazer para mudar o status quo? São inúmeras as formas de corrigir um mundo desequilibrado. As quotas, ‘um mal necessário’, foram amplamente referidas pelos intervenientes. Margarida Couto salientou que "a lei das quotas colocou Portugal numa posição, ao nível da Europa, bastante melhor do que estava antes. À frente de países como a Alemanha, mas claramente atrás de países como a França ou a Dinamarca, que têm lei das quotas há mais anos. Ou seja, há uma grande evidência empírica de que os países que têm lei das quotas há mais tempo fazem mais progressos nessa matéria". A advogada reiterou ainda que "é um mal necessário. Acho que ninguém gosta da lei das quotas, nem mesmo as mulheres, e portanto deverão ser vistas como uma alavanca para desconstruir paradigmas. Espero que seja uma lei que deixe pura e simplesmente de ser necessária a curto prazo".
O presidente da CIP confessou que inicialmente não era a favor da lei das quotas, ressaltando a questão do mérito e da competência como fatores impulsionadores do sucesso. Porém, "fui forçado a constatar que a lei das quotas, se outro mérito não teve, teve pelo menos o de dar um empurrão a que determinadas atitudes e práticas fossem adotadas. Sem esse empurrão demorariam mais tempo a ser incorporadas".
Vista como acelerador da transformação pelos intervenientes, Sandra Ribeiro, deu conta de que "a possibilidade de descriminação positiva está prevista no ordenamento jurídico nacional, quer ao nível da legislação laboral, quer noutras áreas. E a razão de ser é que, quando se percebe que há um desequilíbrio tão evidente, esperar que a sociedade se desenvolva não é suficiente para que possa haver esse equilíbrio em tempo útil. Então, sim, faz sentido usar medidas positivas. As quotas são entendidas como essa medida". Porém, "existem outras medidas, inclusive de promoção do emprego. Às vezes há contratação do sexo menos representado em determinadas áreas ou setores. São medidas públicas utilizadas como uma forma de atuação cirúrgica e imediata, para tentar fazer esse reequilíbrio", acrescentou a presidente da CIG. A responsável lembrou também que, não havendo diversidade, as empresas têm trabalhadores muito parecidos, que funcionam bem socialmente, mas que não serão os mais criativos, pois terão tendência a ver os mesmos erros e as mesmas soluções para os problemas a solucionar.
Assim, no sentido de corrigir de forma mais acelerada os desequilíbrios, para além das quotas e da correção direta pelo nivelamento de género, foi referida também a extrema importância de programas de atração e requalificação de mulheres. Programas como o Projeto Promova, da CIP, que visa promover a igualdade de género em altos cargos de direção em organizações privadas, ou os estatais UPSkill e ReSkill, para requalificação em áreas das tecnologias da informação e comunicação e para a aquisição de novas competências, respetivamente, são exemplos para continuar a implementar.
Por fim, face à acelerada e complexa mudança a realizar na presente década, aos oradores foi questionado que tipo de empresas Portugal terá em 2030. António Saraiva sintetizou: "Teremos seguramente empresas mais bem preparadas, empresas com maior responsabilidade social". E por ser esta a dinâmica da transformação, as empresas que não incorporarem estas boas práticas deverão perceber que "o mercado se vai encarregar da diferenciação de opções de compra dos produtos ou dos serviços. Por isso, diria que as empresas estão obrigadas a chegar a 2030, ou por acompanhamento das tendências ou por necessidade de sobrevivência, com todas estas questões importantes incorporadas".
O tema da igualdade e da diversidade como fatores basilares de uma sociedade justa foi discutido na talk "Igualdade e Diversidade - Um mundo mais justo", organizada pelo Jornal de Negócios a 4 de novembro, naquele que é o segundo ciclo de talks sobre sustentabilidade do jornal. O debate contou com a participação de várias personalidades, nomeadamente, António Saraiva, presidente da CIP; Bruno Casadinho, managing director da Capgemini Engineering; Margarida Couto, sócia da Vieira de Almeida e presidente da GRACE; Sandra Ribeiro, presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG); e Isabel Soares, responsável pelos Assuntos Institucionais da Tabaqueira. A moderação esteve a cargo de Diana Ramos, diretora do Jornal de Negócios.
O debate arrancou com o assinalar do importante papel que as empresas têm na transformação para um mundo mais justo. "O papel das empresas é de transformação", começou por afirmar António Saraiva, que acrescentou: "Há práticas de desigualdade a vários níveis que não se podem manter. E, por isso, as empresas têm um trabalho acrescido enquanto células da sociedade para desenvolverem a correção das anomalias".
Como responsável por uma organização que congrega 185 empresas com preocupações sustentáveis, Margarida Couto salientou que as empresas estão a aprender umas com as outras a implementar os ODS e que esta transformação é mesmo uma questão de competitividade para as próprias. "O tema da igualdade de género é, sem dúvida, um tema de justiça social, mas é também um tema económico, um tema de competitividade e uma enorme oportunidade para as empresas, porque há muitos estudos que demonstram que são mais lucrativas e resilientes. Ou seja, o business case da diversidade é tão evidente que é quase uma irracionalidade económica as empresas não incorporarem essas práticas", afirmou.
Bruno Casadinho corroborou: "Na Capgemini, olhamos para o tema da igualdade e da diversidade como um fator de competitividade". Com um conselho de administração equitativamente distribuído, sendo que em tempos foi composto 100% por mulheres, o responsável afirmou que "percebemos há muito tempo que o maior fator de inovação que temos é a diversidade. Não só de género, mas também uma diversidade cultural, do ponto de vista de fé e religião, do ponto de vista de origem de onde as pessoas vêm, etc. E o maior conselho que eu costumo dar às empresas que querem criar uma cultura de inovação é: mais do que tentarem introduzir programas de ideação, invistam em equipas diversas que automaticamente essa inovação vai surgir". E recorda os efeitos positivos que a diversidade impregnou no Fundão, quando a empresa abriu lá escritório: "Ter diferentes nacionalidades naquela cidade fez com que, por exemplo, tivessem surgido restaurantes vegetarianos, para endereçar as necessidades de pessoas vegetarianas. E hoje proliferam outras empresas do mesmo ramo naquela região, sendo um bom exemplo de como a diversidade pode de facto mudar as empresas e também a sociedade".
O exemplo referido mostra como a sociedade está a evoluir nesta matéria. "Eu acho que tem havido uma grande evolução na forma de gerir recursos humanos e na gestão empresarial de há quinze anos a esta parte. E isso passa muito pela tomada de consciência de que as questões de igualdade e de diversidade são, efetivamente, ferramentas e estratégias de gestão importantíssimas e que são também instrumentos de concorrência", salientou a presidente da CIG. Sandra Ribeiro acrescentou ainda que "a questão da diversidade ligada à criatividade e à inovação está mais do que provada. Portanto, aquilo que me parece é que as empresas que querem estar no mercado, atrair os melhores talentos e dar uma imagem competitiva e de modernidade aos seus clientes estão cada vez mais a apostar nesta área".
Como representante da Tabaqueira, Isabel Soares destacou o facto de esta ser uma empresa muito focada no equilíbrio de género, onde o acesso aos lugares de gestão de topo e a igualdade salarial são uma realidade. Salientou que "40% das mulheres ocupam já um lugar de gestão de topo na empresa. Queria dizer também que a Tabaqueira foi em 2019 a primeira empresa a receber em Portugal a Certificação de Igualdade Salarial, que de facto garante remuneração igual entre homens e mulheres por trabalho igual. É sem dúvida uma empresa exemplar em matéria de igualdade e diversidade. Porque mais do que ter políticas de inclusão ou de diversidade, está na própria cultura da empresa, no seu ADN. Porque cedo percebeu que alcançar esta igualdade de género não beneficiaria apenas as mulheres, mas também fortalecia as empresas e a sociedade".
Quotas, um mal necessário
Estando identificados problemas de desigualdade, havendo estudos a provar a eficácia da igualdade e da diversidade, o que fazer para mudar o status quo? São inúmeras as formas de corrigir um mundo desequilibrado. As quotas, ‘um mal necessário’, foram amplamente referidas pelos intervenientes. Margarida Couto salientou que "a lei das quotas colocou Portugal numa posição, ao nível da Europa, bastante melhor do que estava antes. À frente de países como a Alemanha, mas claramente atrás de países como a França ou a Dinamarca, que têm lei das quotas há mais anos. Ou seja, há uma grande evidência empírica de que os países que têm lei das quotas há mais tempo fazem mais progressos nessa matéria". A advogada reiterou ainda que "é um mal necessário. Acho que ninguém gosta da lei das quotas, nem mesmo as mulheres, e portanto deverão ser vistas como uma alavanca para desconstruir paradigmas. Espero que seja uma lei que deixe pura e simplesmente de ser necessária a curto prazo".
O presidente da CIP confessou que inicialmente não era a favor da lei das quotas, ressaltando a questão do mérito e da competência como fatores impulsionadores do sucesso. Porém, "fui forçado a constatar que a lei das quotas, se outro mérito não teve, teve pelo menos o de dar um empurrão a que determinadas atitudes e práticas fossem adotadas. Sem esse empurrão demorariam mais tempo a ser incorporadas".
Vista como acelerador da transformação pelos intervenientes, Sandra Ribeiro, deu conta de que "a possibilidade de descriminação positiva está prevista no ordenamento jurídico nacional, quer ao nível da legislação laboral, quer noutras áreas. E a razão de ser é que, quando se percebe que há um desequilíbrio tão evidente, esperar que a sociedade se desenvolva não é suficiente para que possa haver esse equilíbrio em tempo útil. Então, sim, faz sentido usar medidas positivas. As quotas são entendidas como essa medida". Porém, "existem outras medidas, inclusive de promoção do emprego. Às vezes há contratação do sexo menos representado em determinadas áreas ou setores. São medidas públicas utilizadas como uma forma de atuação cirúrgica e imediata, para tentar fazer esse reequilíbrio", acrescentou a presidente da CIG. A responsável lembrou também que, não havendo diversidade, as empresas têm trabalhadores muito parecidos, que funcionam bem socialmente, mas que não serão os mais criativos, pois terão tendência a ver os mesmos erros e as mesmas soluções para os problemas a solucionar.
Assim, no sentido de corrigir de forma mais acelerada os desequilíbrios, para além das quotas e da correção direta pelo nivelamento de género, foi referida também a extrema importância de programas de atração e requalificação de mulheres. Programas como o Projeto Promova, da CIP, que visa promover a igualdade de género em altos cargos de direção em organizações privadas, ou os estatais UPSkill e ReSkill, para requalificação em áreas das tecnologias da informação e comunicação e para a aquisição de novas competências, respetivamente, são exemplos para continuar a implementar.
Por fim, face à acelerada e complexa mudança a realizar na presente década, aos oradores foi questionado que tipo de empresas Portugal terá em 2030. António Saraiva sintetizou: "Teremos seguramente empresas mais bem preparadas, empresas com maior responsabilidade social". E por ser esta a dinâmica da transformação, as empresas que não incorporarem estas boas práticas deverão perceber que "o mercado se vai encarregar da diferenciação de opções de compra dos produtos ou dos serviços. Por isso, diria que as empresas estão obrigadas a chegar a 2030, ou por acompanhamento das tendências ou por necessidade de sobrevivência, com todas estas questões importantes incorporadas".