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Há vantagens económicas e sociais nas coberturas verdes

Aproveitar os telhados para tornar as cidades mais verdes ajuda a combater as alterações climáticas e os efeitos da pressão populacional. As empresas também tiram benefícios económicos e sociais.

24 de Julho de 2024 às 13:30
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Plantar um jardim num telhado ou cobertura de um edifico é uma das soluções com base na natureza que as cidades estão a encontrar para se adaptarem e tornarem-se mais resilientes às alterações climáticas. São áreas amplamente disponíveis que podem ser usadas pelas entidades públicas e privadas com ganhos ambientais, sociais, mas também económicos.

"As coberturas verdes oferecem uma série de benefícios, como a promoção da biodiversidade, a economia de energia no interior do edifício, a redução do efeito ilha de calor, a melhoria da qualidade do ar e o aprimoramento do isolamento térmico", assinala Cristina Calheiros, vice-presidente da Associação Nacional de Coberturas Verdes (ANCV). Além disso, acrescenta, contribuem para a gestão das águas pluviais e aumentam a valorização imobiliária".

A integração de elementos naturais nos ambientes de trabalho está associada a um melhor ambiente emocional e a uma melhor qualidade de vida no trabalho. Cristina Calheiros
Vice-presidente da Associação Nacional de Coberturas Verdes
Os benefícios não ficam apenas pelo aspeto ambiental, na medida em que também ajudam a promover o bem-estar dos utilizadores desses edifícios. "Ao criar espaços de convivência e lazer, proporcionam áreas agradáveis para os funcionários durante os intervalos, o que pode reduzir o stress e aumentar a satisfação no trabalho. A integração de elementos naturais nos ambientes de trabalho está associada a um melhor ambiente emocional e a uma melhor qualidade de vida no trabalho", frisa a responsável.

Tendo em conta que em 2050 cerca de 70% da população viverá em zonas urbanas, segundo projeções das Nações Unidas, as coberturas verdes estão a ganhar espaço nas cidades para trazer mais bem-estar à população.

"Um território densamente urbanizado, com uma crescente pressão imobiliária sobre o pouco espaço disponível obriga a uma exigente gestão do espaço público para amenizar o impacto das alterações climáticas, ao mesmo tempo que procura promover o aumento da resiliência dos equipamentos e edificado, mas também da qualidade do espaço público. As coberturas verdes prestam um vasto conjunto de serviços dos ecossistemas que beneficiam a cidade em diferentes domínios como ambientais, sociais e económicos", afirma Filipe Araújo, vice-presidente da Câmara Municipal do Porto (CMP), autarquia que está a trabalhar para duplicar a área de espaços verdes na cidade.

As coberturas verdes no município fazem parte da solução para atingir esse objetivo. "Este trabalho de expansão está a ser desenvolvido através do incentivo à construção sustentável e ao uso de soluções de base natural em novas operações urbanísticas e na reabilitação de edifícios antigos, mas sobretudo através do exemplo. A cidade do Porto pretende dar o exemplo ao implementar coberturas verdes e até outras soluções sustentáveis nos novos edifícios ou em reabilitação", conta Filipe Araújo.

A autarquia já avaliou as coberturas dos edifícios da cidade e concluiu que cerca de 25% dos edifícios apresentam coberturas adequadas à instalação de coberturas verdes. Também convida todos os operadores urbanísticos e empresas do setor da construção a incorporarem soluções de base natural nos seus projetos, novos ou para reabilitação, para poderem beneficiar da redução de taxas urbanísticas ou para verem aumentada a área de construção, caso os seus projetos obedeçam a critérios de sustentabilidade em linha com os objetivos ambientais da cidade.

Além disso, o município já instalou coberturas verdes em vários edifícios, como os reservatórios de água da Pasteleira, o terminal intermodal de Campanhã - que conta com cerca de 4,6 hectares de área verde, representando a maior cobertura verde implantada num edifício público da cidade com cerca de 1.600 árvores - o edifício-sede da Porto Ambiente ou a Escola Básica do Falcão.

Os resultados, explica, "são instantâneos na perceção do conforto climático interior, bem como na redução do ruído, eficiência energética, poupança energética no consumo de energia para arrefecimento e aquecimento dos espaços interiores", refere o autarca.

No caso das coberturas instaladas há cerca de ano e meio na Escola do Falcão - que ainda não evoluíram para todo o seu potencial -, a autarquia dá conta de que houve um aumento de 170% de áreas verdes na escola e a redução da temperatura das coberturas em 5,4 °C, podendo no pico do calor atingir valores de 20 ºC de diferença entre cobertura verde e cobertura tradicional. Houve ainda uma redução da perda de água da chuva de 30% para 3,74%, com uma maior retenção da água das chuvas no substrato e vegetação disponível, ajudando a amenizar o efeito de ilha de calor na envolvente do edifício. Por último, registou-se um aumento de 26 novas espécies, principalmente insetos voadores, moscas, mosquitos, himenópteros e algumas espécies do género Armadillium, que "são indicadores da qualidade do habitat".

A autarquia destaca também a produção anual de 28.625 kWh de energia fotovoltaica, reduzindo as emissões de CO2 em 7,39 toneladas por ano, graças a uma maior rentabilidade e eficiência dos painéis solares associados à cobertura verde, que potencia a redução da temperatura ao redor dos painéis por via da evapotranspiração da vegetação e humidade do substrato.

Requisitos e custos

Para instalar uma cobertura verde, os requisitos variam conforme o tipo escolhido: extensiva, semi-intensiva ou intensiva. A cobertura verde extensiva é ideal para baixa manutenção, com plantas como suculentas e herbáceas perenes, que crescem sobre uma camada fina de substrato.

Já a intensiva requer cuidados intensivos, podendo incluir árvores e arbustos em camadas mais espessas de substrato, sendo possível o pisoteio, explica a ANCV.

Quanto à semi-intensiva, combina elementos dos dois tipos, oferecendo uma opção moderadamente exigente em termos de manutenção.

Os valores de construção de coberturas verdes superam os custos de uma cobertura tradicional, mas os benefícios compensam largamente a diferença de investimento inicial. Filipe Araújo
Vice-presidente da Câmara Municipal do Porto
A escolha das espécies adequadas para plantar em coberturas verdes depende do tipo de cobertura e das condições ambientais locais. "É aconselhável optar por plantas nativas ou adaptadas à região onde a cobertura será instalada. Têm maior probabilidade de se estabelecerem com sucesso e de requererem menos manutenção ao longo do tempo. Além disso, plantas nativas contribuem para a biodiversidade local, proporcionando habitat e alimento para diversas espécies de fauna", sublinha Cristina Calheiros.

As coberturas podem ser instaladas tanto em edifícios novos como já existentes, desde que cumpram determinados requisitos. "Para instalar uma cobertura verde é necessária uma laje impermeabilizada com carga para suportar o peso do sistema de cobertura verde", explica Ana Mesquita, arquiteta paisagista, acrescentando que "o peso do sistema depende do tipo de cobertura verdes e poderá iniciar nos 100kg/m2.

É expectável que a cobertura verde tenha o tempo de vida útil do edifício. Quanto à manutenção, a arquiteta paisagista Ana Mesquita destaca que "todas as coberturas têm manutenção (ou deverão ter), mesmo as convencionais, mas no caso das verdes acresce o facto de se estar a trabalhar com materiais vivos.

No caso das coberturas extensivas, as visitas de manutenção "estimam-se em quatro a seis visitas anuais. Já no caso das intensivas assemelha-se a um jardim convencional". Por tudo isto, o custo da instalação de uma cobertura verde é maior do que o de uma cobertura tradicional. No entanto, para a especialista, "este custo poderá não ser significativo uma vez que representa em média 1% do custo total da obra". "Mais do que os custos de instalação de uma cobertura verde, devemos pensar no custo que teremos todos na aplicação".

A título de exemplo, a implementação das coberturas verdes na Escola Básica do Falcão foi financiada pelo Programa LIFE, da União Europeia, no âmbito do projeto "My Building is Green" e teve um custo de instalação de 120 mil euros, que representa 10% do valor total da requalificação do edifício.

[As coberturas verdes] devem ser bem projetadas, construídas e mantidas para que os benefícios se sintam. Caso um destes pontos falhe, poderão existir danos para a vegetação ou edifício. Ana Mesquita
Arquiteta paisagista
"Os valores de construção de coberturas verdes superam os custos de uma cobertura tradicional, mas os benefícios compensam largamente a diferença de investimento inicial, contando que no caso da Escola Básica do Falcão as coberturas e painéis terão um impacto direto na poupança das despesas com energia na ordem dos 3.500 euros anuais. E não podemos deixar de fora o valor imaterial do conforto bioclimático, a melhoria das aprendizagens das crianças e o valor pedagógico que as coberturas representam na modelação dos princípios de sustentabilidade nas novas gerações", sublinha Filipe Araújo, vereador do Porto.

Quanto a riscos que estas coberturas podem oferecer, na medida em que acolhem meios naturais e mais peso, a arquiteta Ana Mesquita salienta que é necessário cumprir riscos técnicos. "Devem ser bem projetadas, construídas e mantidas para que os benefícios se sintam. Caso um destes pontos falhe, poderão existir danos para a vegetação ou edifício. Por isso, é fundamental projetar de acordo com as normas." Seguindo as normas, "não há registo de anomalias em coberturas verdes que cumpram os guias técnicos", acrescenta a arquiteta.
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