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Como gerir os resíduos de 9 mil milhões de consumidores?

Em 2050, estaremos a consumir recursos correspondentes a três planetas. Por isso, governos, agentes económicos e consumidores estão cada vez mais conscientes de que o padrão de consumo linear chegou literalmente ao fim da linha. A mudança para um modelo de economia circular surge como a chave para uma (necessária) economia mais verde.

20 de Setembro de 2021 às 15:45
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Estimativas divulgadas pelo Fórum Económico Mundial (FEM) sugerem que a população mundial vai chegar aos 9 mil milhões em 2030, incluindo 3 mil milhões de novos consumidores de classe média. Uma realidade que coloca uma pressão sem precedentes sobre os recursos naturais para responder à procura futura dos consumidores. E isto num planeta que já não aguenta mais resíduos decorrentes do já excessivo consumo humano.

Segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2050, o mundo consumirá como se existissem três planetas. O consumo mundial de matérias-primas, como a biomassa, os combustíveis fósseis, os metais e os minerais, deverá duplicar nos próximos 40 anos, prevendo-se que a produção anual de resíduos aumente 70% até 2050.

A solução? Mudar todo um paradigma: de uma economia de base linear para uma economia circular, na qual o que supostamente é o fim da linha dá azo a um novo começo. Isto porque a economia circular assenta nos princípios da redução, reutilização, recuperação e reciclagem de materiais e energia. Ou seja, os recursos utilizados mantêm-se na economia o máximo de tempo possível e, assim, a produção de resíduos reduz-se ao mínimo.

Para lá chegarmos, é preciso repensar todo o modelo socioeconómico e reformular processos, produção, produtos, consumo e a gestão de toda esta cadeia. O desafio é enorme, mas também o é o potencial da economia para a inovação, criação de empregos e desenvolvimento económico. As estimativas do FEM apontam para uma oportunidade de um trilião de dólares só em economia de materiais.

Em que ponto estamos?

Em 2019, mais de 92 mil milhões de toneladas de materiais foram extraídos e processados, contribuindo para cerca de metade das emissões globais de CO2. O lixo daí resultante inclui plásticos, têxteis, alimentos, eletrónicos e muito mais. Porém, segundo o FEM, apenas 8,6% da economia geradora destes resíduos é circular.


A produção de resíduos na União Europeia (UE) a 27, em 2013, era de 478 kg per capita/ano e em 2019 esse valor estava nos 502 kg per capita/ano.


A nível europeu, segundo dados do Eurostat, a produção de resíduos per capita tem vindo a aumentar progressivamente, ao contrário do que se pretende. Na União Europeia (UE) a 27, em 2013, a produção de resíduos era de 478 kg per capita/ano e em 2019 a produção já estava nos 502 kg per capita/ano. Para Susana Fonseca, membro da direção da associação ambientalista ZERO, estamos perante um quadro muito preocupante: "Fora da UE o cenário tende a ser muito pior. Podemos dizer com alguma segurança que estamos na infância da economia circular, principalmente porque o único trabalho que estamos a fazer até agora é essencialmente na reciclagem e, mesmo assim, com grande dificuldade, como os números indicam."

Neste caminho mundial a várias velocidades, a Europa está, ainda assim, na linha da frente. Depois de um primeiro plano em 2015, em março de 2020, a Comissão Europeia (CE) adotou o novo Plano de Ação para a Economia Circular, que estabelece as linhas orientadoras e medidas a aplicar ao longo de todo o ciclo de vida dos produtos e que constitui um dos principais alicerces do Pacto Ecológico Europeu. Com estas medidas a adotar por todos os Estados-membros em toda a cadeia de consumo, pretende-se implementar a economia circular como mais uma forma essencial para atingir a neutralidade climática em 2050.

Transição: uma nova oportunidade

A CE vê a transição para a economia circular como uma oportunidade para modernizar e transformar a Europa no seu caminho para uma competitividade sustentável. E estima que a aplicação dos princípios da economia circular à economia pode gerar um aumento adicional de 0,5% do PIB da UE até 2030, criando cerca de 700 mil novos postos de trabalho.

Há igualmente vantagens evidentes para as empresas: dado que as matérias-primas representam cerca de 40% dos custos da produção, os sistemas em circuito fechado podem permitir aumentar a rendibilidade das empresas e protegê-las das flutuações dos preços dos recursos.

O que há a fazer? "A transição para a economia circular terá de se basear necessariamente na participação ativa de todos os atores da cadeia de valor, desde os produtores de recursos aos consumidores, assentando na investigação & inovação sistémica, multidisciplinar, colaborativa e de co-design de soluções como alavanca para a mudança", explica Sandra Rafael, investigadora do CESAM e do Departamento de Ambiente e Ordenamento da Universidade de Aveiro.

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