- Partilhar artigo
- ...
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a poluição atmosférica seja responsável por 43% das mortes e casos de doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC), 29% das mortes e casos de cancro de pulmão e por 17% das mortes e casos de infeções respiratórias agudas em todo o mundo. Isto sem falar noutras doenças fora do âmbito respiratório, mas que a evidência científica começa a estabelecer relações com a poluição do ar, nomeadamente problemas cardíacos, oncológicos, risco de AVC, risco de diabetes, envelhecimento da pele, etc. A exposição à poluição do ar é assim responsável por milhões de mortes e anos perdidos de vida saudável anualmente e pelos consequentes impactos na sociedade e na economia.
Neste âmbito, pela primeira vez, um estudo global do Centro de Pesquisa para a Energia e Ar Limpo (CREA, sigla em inglês) quantificou os custos económicos da poluição do ar pelos combustíveis fósseis estimando-os em 3,3% do PIB global, excedendo em muito os custos projetados da redução de uso de combustíveis fósseis. O impacto na produtividade também foi quantificado, cifrando-se em 1,8 mil milhões de dias de ausência do trabalho por ano. Focando-se no ano de 2018, este estudo quantificou 4,5 milhões de mortes a nível global devido à exposição à poluição do ar por combustíveis fósseis, sendo que cada morte foi associada a uma perda de 19 anos de vida. O CREA avaliou também os países onde o impacto é maior e a China lidera o ranking com custos pela poluição do ar a representarem 6,6% do PIB, seguindo-se a Bulgária e a Hungria, ambos os países com 6%, e depois os restantes países do Leste da Europa. Já os custos per capita colocam os países desenvolvidos no topo da tabela, com o Luxemburgo, os EUA e a Suíça no pódio.
Na esfera europeia, apesar das melhorias registadas nos últimos anos, fruto de esforços nacionais e concertados, a poluição do ar ainda continua a ser um grande problema. Segundo a Agência Europeia do Ambiente, em 2019, na Europa a 27, a poluição do ar foi responsável por 307 mil mortes prematuras. O Plano de Ação Zero Poluição estabelece a meta de reduzir o número de mortes prematuras devido à exposição a partículas finas em 55% até 2030, em comparação com 2005.
Em 2021, a OMS divulgou novas guidelines sobre a qualidade do ar, reconhecendo que a sua poluição tem impactos na sociedade ao nível do tabaco e da alimentação não saudável. Neste sentido, baixou os níveis de exposição aceitável a elementos como monóxido de carbono, ozono, partículas finas, entre outros, encorajando os países a pô-las em prática de forma a reduzir os impactos da poluição atmosférica na sociedade.
Portugal: efeitos do calor, incêndios e seca
Apesar de a qualidade do ar em Portugal ter vindo a melhorar ao longo dos anos, fenómenos extremos associados às alterações climáticas, como o calor, os incêndios e a seca estão a afetar cada vez mais o país. Na realidade, na região do Mediterrâneo, onde Portugal está inserido, a temperatura média já atingiu os 1,5º de tecto previsto no Acordo de Paris para evitar problemas ambientais catastróficos. Não esquecendo a exposição a pontuais vagas de poeiras provenientes de África, sendo que a última incidência no país foi a maior dos últimos 16 anos. Todos estes fenómenos extremos conjugados potenciam o desenvolvimento ou agravamento de doenças respiratórias, destaca o pneumologista: "Nós sabemos que nas alturas em que há incêndios florestais significativos há imediatamente a seguir um aumento da má qualidade do ar, com muita matéria particulada na atmosfera e resíduos da combustão destes incêndios florestais. Vimos isso no fatídico ano de 2017."
E isto tem ligação direta com a saúde dos portugueses. Um artigo conjunto de cientistas da Universidade de Lisboa, intitulado "Poluição do Ar e Admissões na Emergência Hospitalar -Evidências na Área Metropolitana de Lisboa", publicado em 2020, concluiu que foi encontrado "um número considerável de associações entre poluição do ar e admissões de emergências hospitalares em todas as doenças analisadas, sejam elas circulatórias ou respiratórias". "Também descobrimos que os municípios com maiores níveis de vulnerabilidade à poluição do ar (tráfego, densidade populacional, características socioeconómicas, mudanças climáticas) apresentam mais relações entre ar poluído e admissões em emergência hospitalar." Neste sentido, um projeto internacional (Fireurisk), delineado a partir da Universidade de Coimbra, está a avaliar o impacto dos eventos extremos dos incêndios florestais na Europa e formas integradas de combater os seus efeitos.
Por outro lado, os fenómenos climáticos adversos afetam com mais incidência as populações mais vulneráveis, nomeadamente os idosos. Um estudo recente realizado por Mónica Rodrigues, investigadora no Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Coimbra, projeta o impacto das alterações climáticas na mortalidade em Portugal a curto e a longo prazo. Em particular, o estudo identificou os grupos de idade (inferior a 65 anos e +65 anos) em risco no âmbito do impacto das alterações climáticas sobre as doenças do aparelho circulatório nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto. Os resultados, explica Mónica Rodrigues, evidenciam que para os períodos futuros se prevê "um aumento da temperatura, quer no verão, quer no inverno, com maior frequência de ondas de calor, tendo influência na mortalidade". "Por exemplo, na Área Metropolitana de Lisboa, durante os meses de verão, observa-se um aumento da mortalidade associada ao calor extremo, em todas as idades, na ordem de 1,58% e 0,10% em ambos os períodos (2051-2065 e 2085-2099, respetivamente), comparativamente ao período histórico (1991-2005)."
Segundo a especialista, os resultados obtidos através da modelação climática e em saúde "podem, e devem influenciar a formulação de políticas e incluir uma abordagem preventiva". O mesmo defende António Jorge Ferreira: "O país está a aquecer e nós estamos a envelhecer, ou seja, temos uma população cada vez mais frágil. Tem, portanto, de haver um investimento significativo na área do envelhecimento ativo e saudável. Os próprios serviços de saúde têm de se reorientar nesse sentido".
Para acompanhar os níveis de qualidade do ar da sua localidade, pode consultar visualizadores nos sites da Agência Portuguesa do Ambiente (QualAr) e da Agência Europeia do Ambiente.
Neste âmbito, pela primeira vez, um estudo global do Centro de Pesquisa para a Energia e Ar Limpo (CREA, sigla em inglês) quantificou os custos económicos da poluição do ar pelos combustíveis fósseis estimando-os em 3,3% do PIB global, excedendo em muito os custos projetados da redução de uso de combustíveis fósseis. O impacto na produtividade também foi quantificado, cifrando-se em 1,8 mil milhões de dias de ausência do trabalho por ano. Focando-se no ano de 2018, este estudo quantificou 4,5 milhões de mortes a nível global devido à exposição à poluição do ar por combustíveis fósseis, sendo que cada morte foi associada a uma perda de 19 anos de vida. O CREA avaliou também os países onde o impacto é maior e a China lidera o ranking com custos pela poluição do ar a representarem 6,6% do PIB, seguindo-se a Bulgária e a Hungria, ambos os países com 6%, e depois os restantes países do Leste da Europa. Já os custos per capita colocam os países desenvolvidos no topo da tabela, com o Luxemburgo, os EUA e a Suíça no pódio.
Na esfera europeia, apesar das melhorias registadas nos últimos anos, fruto de esforços nacionais e concertados, a poluição do ar ainda continua a ser um grande problema. Segundo a Agência Europeia do Ambiente, em 2019, na Europa a 27, a poluição do ar foi responsável por 307 mil mortes prematuras. O Plano de Ação Zero Poluição estabelece a meta de reduzir o número de mortes prematuras devido à exposição a partículas finas em 55% até 2030, em comparação com 2005.
Nas alturas em que há incêndios florestais significativos, há imediatamente a seguir um aumento da má qualidade do ar. António Jorge Ferreira, Pneumologista
Na realidade, atualmente mais de 80% da população citadina está exposta a níveis de poluição acima dos recomendados pela Organização Mundial da Saúde, provocando todos estes danos à sociedade, à economia e à saúde das pessoas. "A nível respiratório, a asma e a DPOC são seguramente as duas patologias que vemos com mais realidade e que se prendem muito diretamente com a área da saúde ambiental. Os principais compostos que avaliamos na qualidade do ar, como a matéria particulada, o ozono, os dióxidos de enxofre e de azoto e o monóxido de carbono, estão diretamente relacionados com várias patologias. O impacto pode começar logo na vida intrauterina, havendo uma perturbação do crescimento pulmonar saudável, o que pode levar a anos mais tarde a uma diminuição da capacidade funcional respiratória. O ambiente poluído também leva à inflamação crónica das vias respiratórias e pode inclusive aumentar o risco de outras doenças", assinala António Jorge Ferreira, pneumologista e coordenador da Comissão de Trabalho de Doenças Ocupacionais e Ambiente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP). O tema esteve em debate na conferência "O Pulmão e o Ambiente", organizada pela SPP no passado dia 30 de abril, em Lisboa.Em 2021, a OMS divulgou novas guidelines sobre a qualidade do ar, reconhecendo que a sua poluição tem impactos na sociedade ao nível do tabaco e da alimentação não saudável. Neste sentido, baixou os níveis de exposição aceitável a elementos como monóxido de carbono, ozono, partículas finas, entre outros, encorajando os países a pô-las em prática de forma a reduzir os impactos da poluição atmosférica na sociedade.
Portugal: efeitos do calor, incêndios e seca
Apesar de a qualidade do ar em Portugal ter vindo a melhorar ao longo dos anos, fenómenos extremos associados às alterações climáticas, como o calor, os incêndios e a seca estão a afetar cada vez mais o país. Na realidade, na região do Mediterrâneo, onde Portugal está inserido, a temperatura média já atingiu os 1,5º de tecto previsto no Acordo de Paris para evitar problemas ambientais catastróficos. Não esquecendo a exposição a pontuais vagas de poeiras provenientes de África, sendo que a última incidência no país foi a maior dos últimos 16 anos. Todos estes fenómenos extremos conjugados potenciam o desenvolvimento ou agravamento de doenças respiratórias, destaca o pneumologista: "Nós sabemos que nas alturas em que há incêndios florestais significativos há imediatamente a seguir um aumento da má qualidade do ar, com muita matéria particulada na atmosfera e resíduos da combustão destes incêndios florestais. Vimos isso no fatídico ano de 2017."
E isto tem ligação direta com a saúde dos portugueses. Um artigo conjunto de cientistas da Universidade de Lisboa, intitulado "Poluição do Ar e Admissões na Emergência Hospitalar -Evidências na Área Metropolitana de Lisboa", publicado em 2020, concluiu que foi encontrado "um número considerável de associações entre poluição do ar e admissões de emergências hospitalares em todas as doenças analisadas, sejam elas circulatórias ou respiratórias". "Também descobrimos que os municípios com maiores níveis de vulnerabilidade à poluição do ar (tráfego, densidade populacional, características socioeconómicas, mudanças climáticas) apresentam mais relações entre ar poluído e admissões em emergência hospitalar." Neste sentido, um projeto internacional (Fireurisk), delineado a partir da Universidade de Coimbra, está a avaliar o impacto dos eventos extremos dos incêndios florestais na Europa e formas integradas de combater os seus efeitos.
Por outro lado, os fenómenos climáticos adversos afetam com mais incidência as populações mais vulneráveis, nomeadamente os idosos. Um estudo recente realizado por Mónica Rodrigues, investigadora no Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Coimbra, projeta o impacto das alterações climáticas na mortalidade em Portugal a curto e a longo prazo. Em particular, o estudo identificou os grupos de idade (inferior a 65 anos e +65 anos) em risco no âmbito do impacto das alterações climáticas sobre as doenças do aparelho circulatório nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto. Os resultados, explica Mónica Rodrigues, evidenciam que para os períodos futuros se prevê "um aumento da temperatura, quer no verão, quer no inverno, com maior frequência de ondas de calor, tendo influência na mortalidade". "Por exemplo, na Área Metropolitana de Lisboa, durante os meses de verão, observa-se um aumento da mortalidade associada ao calor extremo, em todas as idades, na ordem de 1,58% e 0,10% em ambos os períodos (2051-2065 e 2085-2099, respetivamente), comparativamente ao período histórico (1991-2005)."
Segundo a especialista, os resultados obtidos através da modelação climática e em saúde "podem, e devem influenciar a formulação de políticas e incluir uma abordagem preventiva". O mesmo defende António Jorge Ferreira: "O país está a aquecer e nós estamos a envelhecer, ou seja, temos uma população cada vez mais frágil. Tem, portanto, de haver um investimento significativo na área do envelhecimento ativo e saudável. Os próprios serviços de saúde têm de se reorientar nesse sentido".
Para acompanhar os níveis de qualidade do ar da sua localidade, pode consultar visualizadores nos sites da Agência Portuguesa do Ambiente (QualAr) e da Agência Europeia do Ambiente.