Opinião
Pagar impostos com acções
A história que faz hoje a manchete do Jornal de Negócios é exemplar. A PT propõe-se pagar ao Estado impostos em espécie. Toma lá acções e fechamos negócio. Se o Estado aceitar a proposta, as promessas que Henrique Granadeiro fez aos accionistas podem ser
O leitor pense duas vezes nesta situação. Quando a PT for distribuir 50% das acções da PTM aos accionistas o que está a fazer é a oferecer acções. Em consequência da oferta das acções tem de pagar o imposto devido. Até aqui tudo é fácil.
O problema surge quando chega a altura de entregar o imposto ao Fisco. Exactamente porque ao Fisco só se paga em dinheiro. Quer isto dizer que entregando 50% acções da PTM aos accionistas da PT, a empresa terá de entregar 20% do valor de metade da PTM no dia da separação das duas empresas. Dinheiro que sai do banco e que é muito dinheiro vivo. Pois andará na casa dos 340 milhões de euros.
E a pergunta que sobra é se 340 milhões fazem ou não fazem diferença em relação aos planos apresentados por Henrique Granadeiro. Ou seja se os accionistas da PT tinham consciência da situação quando comparam as propostas da sua administração com as propostas da Sonaecom.
Porém, a história tem interesse complementar.
É que a PT elaborou um plano em que se propõe pagar aqueles milhões não em dinheiro mas em acções. Proposta que é legítima e até reveladora da criatividade da engenharia financeira. Aliás, qualquer empresário gostaria de poder pagar impostos com "stocks" e por isso é com muita curiosidade que todos esperamos pela decisão que o Estado venha a tomar quanto a isto.
Assim, se se der o caso de o Estado aceitar a proposta, por certo chegarão muitas outras propostas criativas à mesa do Governo.
E depois, parte curiosa, aceitando a oferta, o Estado ficará a deter cerca de 15% do capital da PTM. O que é fantástico. Não encontrei esta intenção em nenhum documento do Governo mas sou capaz de ter perdido algum detalhe.
À parte isso, se a moda pegar, dentro de pouco tempo, o Estado será dono de muitas empresas portuguesas. Umas acções aqui, umas quotas ali. O que ainda é mais fantástico.
Sobretudo porque o sucessor de Paulo Macedo há-de começar a ver a vida a andar para trás ao olhar para o cofre forte vazio de dinheiro e cheio de títulos.
Quanto ao ministro Teixeira dos Santos, não restará outra hipótese que não seja pagar aos funcionários públicos e aos pensionistas em géneros, isto é em acções e quotas.
Mas não sejamos pessimistas. Nestas histórias há sempre a versão optimista que neste caso reza que os funcionários públicos e os pensionistas serão proprietários de empresas e o verdadeiro capitalismo popular terá chegado a Portugal pela porta do cavalo.
Mas e se se der o caso de o Estado não estar virado para a implementação do capitalismo popular? Eu diria que a PT vai ter de inventar mais outra solução criativa para conseguir cumprir as arrojadas promessas que fez aos accionistas.
Felizmente, como vemos pelo caso da OPA da Sonaecom à PT, quando as histórias grandes começam nunca mais acabam.
E isso é o festim do jornalismo.