Opinião
O crédito do dr. Macedo
Dizia-se que a Lei é a única bitola admissível na avaliação de comportamentos que suscitam questões de ética ou de integridade de carácter - e pronto! Problema resolvido. O doutor Macedo vai ser o novo director-geral dos impostos, evidentemente dentro das
Dizia-se que a Lei é a única bitola admissível na avaliação de comportamentos que suscitam questões de ética ou de integridade de carácter - e pronto! Problema resolvido.
O doutor Macedo vai ser o novo director-geral dos impostos, evidentemente dentro das regras, mas não dos bons costumes.
O doutor Macedo é um quadro altamente qualificado do BCP. Mas, pelo menos nos próximos dois anos, vai ficar a mando do doutor Valdez.
A sua requisição foi feita dentro do espírito e do corpo da Lei. O seu invulgar salário é polémico, mas não é ilegal. A maior parte dessa remuneração continuará a ser assegurada pela a sua entidade patronal, o que é ainda mais polémico - mas, por estranho que pareça, continua a ser legal.
E, por fim, se o doutor Macedo sair à tardinha do Terreiro do Paço, no fim do expediente, e passar pela sede do banco, para fazer «uma perninha», também continua tudo dentro dos conformes. A Lei permite.
Ok, até os mais distraídos já entenderam que ninguém vai parar a prisão, nem sequer tem de ir a tribunal, por causa da colocação do doutor Macedo no comando da máquina fiscal deste país. Mas, queira ou não, por muito que a Lei o permita, o novo «xerife do fisco» já vai para a tomada de posse altamente condicionado.
Não é um problema isolado a este caso. É um clássico. A velha questão de «mulher de César». Sendo o doutor Macedo uma pessoa de bem, em situações de dúvida que envolvam o contribuinte BCP, o engenheiro Jardim Gonçalves que não duvide: a administração fiscal passará a decidir sempre contra os interesses do seu banco.
Esta esdrúxula «partilha» da remuneração de SExa. o DGCI, entre o Estado e um dos seus contribuintes mais importantes, leva a uma conclusão óbvia e levanta dois debates obrigatórios.
A conclusão óbvia: esta legislação, que podia ter alguma justificação quando foi criada (e não é fácil ver qual...) é de uma imbecilidade sem limites nos dias de hoje. Tem de ser urgentemente mudada, para não acobertar situações estranhas, como esta em que o doutor Macedo se coloca.
Dos debates obrigatórios, um é antigo e recorrente, outro julgo que inédito.
O tema recorrente tem a ver com esta desastrosa política remuneratória da Administração Pública. Pagam-se salários obscenos no topo da carreira dos grupos profissionais que fazem mais barulho, mendigam-se as remunerações de gestores competentes e contratados para assumir tremendas responsabilidades.
Aliás, o descrédito das instituições e o desprestígio dos funcionários públicos são o resultado trágico desta atitude covarde da nossa classe política e que o nosso regime democrático, em vez de a resolver em três décadas, a tem agravado nos últimos anos.
A questão inédita, ou pelo menos inusitada, é ver esta relação de dependência, no caso financeira, em que o Estado se coloca diante de um grupo privado. Repito: o BCP dificilmente irá beneficiar com isso. Mas fica uma dívida de gratidão. Coisa que qualquer contribuinte deste país gostaria de ter com o fisco.