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11 de Setembro de 2006 às 13:59

11 de Setembro

Nós lembramo-nos bem do que estávamos a fazer quando soubemos a notícia. O 11 de Setembro de 2001 ficou-nos gravado na memória, porque foi brutal e inverosímil, e porque assistimos ao vivo.

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Nós lembramo-nos bem de ver o segundo avião violar a torre e a nossa humanidade. De ver os corpos a preferir a queda suicida ao fogo homicida, de ver o pó cobrir a cidade e as pessoas, tornando-as todas iguais sob uma espessura necrófaga. Vimos tudo isso em directo. E nós lembrámo-nos disso quando vimos explodir a estância turística em Bali, a estação de Atocha em Madrid e as linhas de metropolitano em Londres. Usando a expressão de Ian McEwan no seu livro «Sábado», vimos «suficiente morte, medo, coragem e sofrimento para abastecer meia-dúzia de literaturas».

Cinco anos não foram suficientes nem para esquecer a emoção a quente, nem para fazer a história a frio. Uma história que ainda se está a fazer, que conta duas guerras entretanto abertas pelos Estados Unidos, com uma meia-vitória no Afeganistão e uma invasão do Iraque que mentiu nos meios e falhou nos fins. Donald Rumsfeld, Colin Powell e Dick Cheney foram os falcões de George W. Bush, o homem que os europeus agora adoram detestar, que tem como grande aliado Tony Blair, o homem que os europeus até então adoravam adorar.

Como diz António Vitorino, «o fenómeno do terrorismo global vai estar connosco durante muitos anos». A estratégia europeia anti-terrorismo não é um caso de sucesso e, se em 2001 o mundo era «all american», à união do terror sobreveio a divisão da política. Nem podia ser de outra forma. Ainda este fim-de-semana, os chefes de Estado e Governo da Ásia e da Europa reuniram-se para debater globalização, terrorismo, energia, alterações climáticas, liberalização do comércio mundial, diálogo cultural e competitividade. Quem discute tantos assuntos não quer resolver nenhum deles.

Felizmente para Portugal, o 11 de Setembro entrou-nos só pela TV - não pela fronteira. Temos pouco mais que falar do que da célebre cimeira dos Açores, em 2003, onde Durão recebeu Blair, Aznar e Bush para dar legitimidade internacional à decisão que os EUA já tinham tomado: invadir o Iraque. Não temos, como Espanha tem, a marca da Al-Qaeda: apesar de viver há trinta anos com terrorismo doméstico, Espanha haveria de ter o ataque mais sangrento da sua história em Atocha.

O 11 de Setembro trouxe o pessimismo e pôs a democracia no medo. A batalha contra o terrorismo não está ainda nem ganha nem perdida mas a Europa da tolerância, da imigração, do pote de culturas, da liberdade religiosa passou a tremer ante uma burka e a rodear de metralhadoras as suas competições desportivas.

A economia resistiu e essa é uma manifestação de sobrevivência. A maturidade das organizações internacionais garantiu que não se entrasse em pânico. As bolsas não despencaram, o investimento não colapsou, o pessimismo não anulou o consumo, não estamos em economia de guerra. A factura está a ser paga no petróleo e mesmo aí evitou-se o choque inflaccionista, à custa de políticas monetárias, das empresas que cortaram custos e dos trabalhadores que toleraram esses cortes.

Mesmo nos EUA a economia está mais eficiente. Há ruínas sectoriais mas também outros lados da moeda: a aviação comercial para executivos caiu drasticamente, em troca o negócio da vídeo-conferência disparou. A economia mudou, mas não parou. Nós lembramo-nos todos, mas também não parámos. Nem paramos.

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