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Os dois mundos da Ryanair

A Ryanair vive no melhor de dois mundos. Actua num mercado liberalizado e concorrencial e é parcialmente subsidiada com dinheiros públicos ou provenientes de organismos que são financiados por eles.

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A 5 de Abril deste ano, quando o Sindicato Nacional do Pessoal da Aviação promoveu uma greve de contestação contra as práticas laborais da Ryanair, escreveu-se neste mesmo espaço: "o poder da Ryanair foi-se sedimentando com base em apoios de Estado (que lhe são concedidos em dezenas de destinos na Europa), tornando esses países turisticamente co-dependentes da estratégia comercial da companhia. Chama-se a isto beneficiar o infractor. É mesmo isso que o Estado quer?".

 

Quatro meses depois as greves voltaram à Ryanair, desta vez à escala europeia, com as mesmas motivações, a de que a companhia irlandesa respeite as leis laborais em vigor em cada país. Pede-se à Comissão Europeia e aos diversos governos que tomem medidas para pôr cobro ao 'dumping' social promovido pela companhia.

 

Agora, como já o havia feito em Abril, a Ryanair responde às reivindicações com ameaças veladas de despedimento e outras formas de pressão. Mas juntou-lhe outro ingrediente, com o claro propósito de colocar trabalhadores contra trabalhadores, ao anunciar um plano de redução de pessoal na Irlanda (100 pilotos e 200 tripulantes de cabine), alegando que a greve nos vários países europeus afectou a confiança dos consumidores.

 

Ou seja, a Ryanair exime-se de qualquer responsabilidade, tanto junto dos trabalhadores como dos consumidores, colocando o ónus nos grevistas. A mesma Ryanair que, como já se disse, beneficia de apoios de Estado em muitos países da Europa, circunstância que lhe dá uma vantagem de legitimidade duvidosa sobre a concorrência, em domínios relevantes como a fixação de preços.

 

A Ryanair vive no melhor de dois mundos. Actua num mercado liberalizado e concorrencial e é parcialmente subsidiada com dinheiros públicos ou provenientes de organismos que são financiados por eles. É também por isso que o silêncio dos governos e até da Comissão Europeia em relação às práticas da companhia sobressai como estranho e permite leituras sobre a existência de uma complacência que cheira a cumplicidade.

 

É claro que os consumidores, o turismo e actividades conexas, entre outros, ganham com esta estratégia da Ryanair, à qual se deve reconhecer o mérito de ter democratizado, tornando acessível, o uso do transporte aéreo. Outra coisa bem diferente (e porventura falaciosa) é dizer que se trata do mercado a funcionar. Porque não é.

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