Opinião
O interior pelo interior
Em 1998, Portugal realizou um referendo sobre a regionalização. A proposta foi chumbada por larga margem, 60,9% contra, 35% a favor.
O mapa dessa eleição pintado pela Comissão Nacional de Eleições merece ser revisitado. A verde surgem os concelhos onde o sim à regionalização então venceu. E onde se situam eles? Todos a sul de Lisboa, em câmaras que então eram controladas na sua esmagadora maioria pelo PCP. Por todo o resto do país pontifica o vermelho da rejeição. Duas décadas volvidas retoma-se o tema da regionalização, agora com uma nomenclatura nova, descentralização, uma palavra mais aberta e menos impositiva.
Ninguém de bom senso pode recusar a bondade da descentralização e a sua importância para travar a erosão do interior do país. Lisboa e também o Porto foram crescendo à medida que o interior se foi esvaziando.
É consensual que urge tomar medidas para inverter esta trajectória. Quem mora no interior ou quem o visita com regularidade, por vezes num regresso às origens, sabe-o por experiência.
O Movimento pelo Interior tem o mérito indiscutível de ter relançado a discussão e apresentar propostas que constituem uma saudável base de discussão. Mas a descentralização está longe de se fazer pela mera transferência de serviços de Lisboa para o interior. Sendo um assunto de Estado, não pode nem deve apenas ficar nas mãos do Estado central. É também preciso que os líderes autárquicos tenham um visão menos umbiguista do território e que esta descentralização não seja usada para obtenção de ganhos políticos. A coesão do território exige políticas articuladas e complementaridade entre municípios e impõe que se deixe de olhar para o interior como uma espécie de reserva de índios onde os citadinos vão à procura das origens.
Para que tudo possa correr bem, o interior tem de ser relançado a partir do interior e não tendo como premissa a visão condescendente do centralismo.
A defesa do interior é fundamental, sobretudo para quem lá vive. Este é ponto de partida que é imperativo não esquecer.