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Michael Boskin - Economista 31 de Agosto de 2017 às 14:00

Poderá Trump dar a volta à sua presidência?

Para ter sucesso, Trump precisa de demonstrar respeito por pontos de vista opostos razoáveis e reduzir as suas posições mais extremas para aumentar o seu apoio popular.

A economia dos Estados Unidos está a crescer a um ritmo modesto, com baixo desemprego e inflação. Normalmente, essas condições fortaleceriam a posição do presidente dos EUA junto do público. E, no entanto, a taxa de aprovação de Donald Trump está bem abaixo dos 40%, um valor que esperaríamos ver durante uma recessão.

 

Naturalmente, a verdadeira popularidade de Trump pode ser um pouco superior ao que as pesquisas sugerem, já que as mesmas pesquisas não conseguiram prever a sua vitória em Novembro passado. Mas, mesmo que Trump tenha mantido o apoio da sua base, a lua-de-mel que se seguiu à tomada de posse provou ser fugaz. Agora, está a começar a perder o apoio dos republicanos que esperavam que ele limasse as suas ásperas arestas e crescesse quando assumisse o cargo.

 

Até agora, Trump não conseguiu atingir grandes conquistas ao nível das políticas legislativas. No entanto, ajudou a economia ao reverter as imposições regulatórias e administrativas prejudiciais do presidente Barack Obama em áreas como energia, educação, finanças e direito do trabalho. Além disso, mesmo os republicanos do Congresso que se distanciaram das declarações mais extremas de Trump - alguns antes mesmo da sua resposta inadequada à violência numa concentração de supremacistas brancos em Charlottesville, Virgínia - ainda apoiam as suas principais propostas e estão a contar com ele para assinar a legislação conservadora que Obama vetou.

 

Quer esteja na Sala Oval, no Air Force One ou no seu resort Mar-a-Lago, Trump, como todos os presidentes, reside numa bolha gigante, onde aqueles que a rodeiam geralmente dizem o que ele quer ouvir. É por isso que é tão importante que os presidentes tenham conselheiros e assessores, dentro e fora da Casa Branca, que estejam dispostos a dizer-lhes quando estão a desviar-se da rota.

 

Ao repreender publicamente os seus assessores, Trump tornou ainda mais difícil, mas também mais necessário, para aqueles que o cercam dizerem-lhe o que ele precisa de ouvir. Neste ponto, a principal prioridade da sua administração deve ser desenvolver processos mais disciplinados para assegurar que o presidente recebe informações precisas e opções políticas eficazes.

 

Para esse fim, a decisão de Trump de nomear John Kelly, um general reformado do Corpo de Fuzileiros Navais, como chefe de gabinete da Casa Branca foi um primeiro passo importante. Importantes foram também as decisões de expulsar o estrategista-chefe Steve Bannon, e de realizar uma revisão deliberativa da política norte-americana no Afeganistão. Agora, Kelly controla completamente o fluxo de informações e as pessoas que chegam ao presidente. Mas resta saber se Trump consegue ser mais disciplinado.

 

Geralmente não há uma segunda oportunidade para a primeira impressão. Mas às vezes essas oportunidades surgem para os presidentes dos EUA. A administração de Bill Clinton começou com falta de disciplina, uma tentativa fracassada de reformar a saúde e uma derrota para os democratas nas eleições intercalares de 1994. Porém, Clinton deu a volta às coisas, nomeando novos assessores, avançando em direcção ao centro político, conquistando a reeleição em 1996 e trabalhando com um Congresso controlado pelos republicanos para equilibrar o orçamento e reformar os apoios sociais.

 

Do mesmo modo, Ronald Reagan sofreu uma grande derrota dos republicanos nas eleições intercalares de 1982. Naquela época, os EUA estavam numa profunda recessão, devido à dura política de desinflação da Reserva Federal, que Reagan havia apoiado. Mas a economia teve uma forte recuperação, apoiada pela redução de impostos de Reagan e aumento dos gastos militares. Em 1984, Reagan foi reeleito de forma esmagadora. A administração de Jimmy Carter, pelo contrário, nunca superou os seus problemas e é agora considerada um fracasso.

 

Depois de assumirem o cargo, todos os presidentes dos EUA percebem rapidamente que a sua autoridade, em termos de política económica e interna, é limitada pelo Congresso e pelos tribunais, mas que têm muito mais influência sobre os assuntos de segurança externa e nacional. Trump, pela sua parte, fez questão de ser mais forte do que Obama com aliados e inimigos em questões de segurança. Com a Coreia do Norte a fazer avanços alarmantes nos seus programas de mísseis balísticos nucleares e intercontinentais, a abordagem de Trump está a passar pelo seu primeiro teste real.

 

Aqui, o presidente John F. Kennedy durante a Crise dos Mísseis de Cuba de 1962 é a melhor analogia. A administração Kennedy tropeçou seriamente quando tentou desestabilizar o regime comunista de Fidel Castro em Cuba - um esforço que culminou no fiasco da Baía dos Porcos. Mas, mantendo-se firme contra o Kremlin, Kennedy conseguiu que a crise tivesse um fim pacífico: a União Soviética retirou os seus mísseis nucleares de Cuba e os EUA retiraram silenciosamente os seus mísseis da Turquia.

 

O ditador norte-coreano Kim Jong-un está a agir de acordo com um cálculo político diferente do dos soviéticos, e a situação estratégica na península coreana é ainda mais assustadora do que em Cuba. A Coreia do Norte tem um grande arsenal convencional que pode destruir dez milhões de sul-coreanos na vizinha Seul. Ainda assim, se a resposta firme de Trump acabar por ser bem-sucedida, pode aumentar a sua popularidade.

 

As decisões reais de Trump importam muito mais do que o seu comportamento de confronto. Mas o seu comportamento ainda pode afectar as opções que tem à sua disposição. Se a sua aprovação pública cair muito, menos membros do Congresso trabalharão com ele, e mais contra ele. Além disso, a sua notável inclinação por ofuscar boas notícias com ataques no Twitter permite aos meios de comunicação acentuarem certos traços da sua personalidade, ignorando os sucessos substantivos da sua administração.

 

Por exemplo, no início deste mês, enquanto muitos estavam fixados na retórica de Trump, o secretário de Estado dos EUA, Rex Tillerson, garantiu a aprovação do Conselho de Segurança das Nações Unidas para o aumento das sanções contra a Coreia do Norte, e a China disse que reduziria as suas importações daquele país. Pouco tempo depois, a Coreia do Norte cancelou os lançamentos de mísseis sobre o território norte-americano de Guam.

 

Politicamente, a América está profundamente polarizada. Mas na maioria das questões, os americanos querem soluções sensatas para problemas reais, com o governo a desempenhar um papel limitado nas suas vidas. Trump tem a oportunidade de reduzir os impostos, melhorar a infra-estrutura dos EUA e substituir ou alterar o Obamacare. Para ter sucesso, precisa de demonstrar respeito por pontos de vista opostos razoáveis e reduzir as suas posições mais extremas para aumentar o seu apoio popular.

 

Mas, acima de tudo, precisa de cooperar com o Congresso, assim como fizeram Reagan e Clinton. Se o fizer, poderia dar a volta à sua presidência, confundir os seus críticos e deixar um legado positivo. Será que consegue?

 

Michael J. Boskin é professor de Economia na Universidade de Stanford e membro sénior da Hoover Institution. Foi chairman do conselho de assessores económicos de George H. W. Bush de 1989 a 1993.

 

Copyright: Project Syndicate, 2017.
www.project-syndicate.org
Tradução: Rita Faria

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