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24 de Novembro de 2015 às 20:30

Os limites da terra prometida alemã

Os migrantes que procuram fugir à pobreza e à guerra estão a afluir para a Europa às centenas de milhar. Eles continuam a ser, na maior parte das vezes, bem-recebidos, mas a capacidade dos centros de recepção está rapidamente a atingir o limite.

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Para estancar o afluxo migratório através da rota dos Balcãs, a Hungria impôs controlos nas suas fronteiras – seguida rapidamente pela Alemanha, Áustria, Eslováquia, Croácia, Eslovénia, República Checa, Holanda e Polónia. 

A Alemanha é o país de destino favorito dos migrantes. Até esta altura do ano, metade de todas as aplicações de requisito de asilo, na União Europeia, foram feitas para a Alemanha, isto apesar de este país deter apenas 16% da população da União Europeia. Até Setembro, a Alemanha recebeu provavelmente cerca de 400 mil aplicações ou mais, sendo que o dramático crescimento do afluxo migratório desde o Verão e o restabelecimento de controlos fronteiriços possam elevar o número de pedidos de asilo para 80 mil, este ano. 


Além do mais, a imigração regular para a Alemanha poderá voltar a atingir a marca de 400 mil, tal como em 2014. O total representaria uma imigração líquida de 1,5% da população residente – e uma proporção extremamente elevada comparativamente com os padrões históricos e internacionais.
 


A razão para a preferência dos migrantes em relação à Alemanha passa por este país, em conjunto com a Suécia, deter um dos mais liberais sistemas de asilo e alocar particularmente elevados níveis de financiamento para acolher os recém-chegados. Entre 1.000 e 1.200 euros para cada pessoa por mês é o valor que está a ser transferido pelos municípios para suportar os custos de acolhimento. O valor dos benefícios que os imigrantes recebem na Alemanha é um múltiplo dos salários que poderiam receber nos seus países de origem (se eles conseguissem sequer encontrar um emprego).
 


O Regulamento de Dublin, de acordo com o qual o primeiro país da UE a que o migrante chega é obrigado a registar e processar a aplicação de asilo desse migrante, tem sido há muito ignorado. A Grécia e a Itália estão simplesmente a dispensar refugiados. A Alemanha aceitou, com grande fanfarra, um grande número de refugiados não registados vindos da Hungria e deu-lhes boas-vindas calorosas. Esta discutível decisão acabou por aliciar muito mais refugiados dos países árabes, o que rapidamente obrigou a Alemanha a impor controlos fronteiriços.


Aquilo que o Governo alemão não antecipou foi que todos os refugiados que consigam chegar a solo germânico imediatamente dão as boas notícias nos seus países de origem, alimentando assim uma nova vaga migratória. Os campos de refugiados das Nações Unidas, nos países à volta da Síria, estão gradualmente a ser transferidos para a Alemanha.
 

Somente uma fracção das aplicações de asilo tem sido aprovada, porque a maioria desses requerentes não são politicamente perseguidos mas apenas migrantes económicos. Na primeira metade de 2015, por exemplo, apenas cerca de um quarto das aplicações era de cidadãos da Síria e do Iraque, sendo que uma significativa proporção destes já conseguiu abrigo nos campos de refugiados das Nações Unidas situados em torno desses países. Mas, subsequentemente, a proporção de refugiados sírios rapidamente explodiu, em parte devido às notícias espalhadas de que a Alemanha aprova a maior parte das aplicações de migrantes sírios. 

Se uma aplicação for bem-sucedida, o refugiado tem o direito de trazer consigo os membros da sua família. Frequentemente, as famílias árabes enviam os seus menores para a Alemanha com uma não injustificada esperança de que eles venham a obter o direito para que outros membros das suas famílias venham depois. A Alemanha terá de lidar com as consequências desta onda de refugiados nos anos vindouros. 

Para distribuir de forma mais equitativa o fardo, a Alemanha tentou implementar um sistema de quotas obrigatórias de acolhimento pelos Estados-membros da UE. Mas os parceiros europeus da Alemanha rejeitaram esta ideia de "imperialismo moral". 

Desta forma, a Alemanha falhou na tentativa de adopção de um sistema que lhe garantiria algum alívio. Em vez disso, uma cimeira marcada de urgência acordou num sistema de quotas limitado que cobre apenas 120 mil pessoas, direccionado a aliviar o fardo suportado pela Hungria, Itália e Grécia; irá trazer mais 31 mil refugiados para a Alemanha. 

De forma a evitar o caos, a Alemanha não tem alternativa à imposição de restrições. Entre os passos urgentemente mais necessários está o desenvolvimento de uma capacidade de rápida destrinça – idealmente junto à fronteira – entre refugiados (que enfrentam perseguições políticas) e migrantes económicos. O Serviço Federal de Migração e Refugiados germânico poderia estabelecer postos avançados nas fronteiras para triar as requisições de asilo sem fundamento e enviar os requerentes rejeitados, de acordo com o Regulamento de Dublin, de volta para o primeiro país seguro que pisaram na UE.

Isto permitiria à Alemanha concentrar-se na tarefa que tem em mãos: assegurar àqueles que conseguiram o estatuto de refugiado a formação e aulas de idioma que eles irão precisar para encontrar emprego o mais rápido possível. 

Hans-Werner Sinn, professor de Economia e Finanças Públicas na Universidade de Munique, é presidente do Ifo Institute for Economic Research e pertence ao Conselho Consultivo do Ministério da Economia alemão. É autor, mais recentemente, do livro The Euro Trap: On Bursting Bubbles, Budgets, and Beliefs. 

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2015.
www.project-syndicate.org
Tradução: David Santiago

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