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Thomas Fricke 29 de Janeiro de 2016 às 20:30

Os incentivos adequados para um futuro com baixos níveis de carbono

Quando os decisores políticos começarem a trabalhar na concepção de estratégias para implementar o Acordo de Paris, não deverão depender substancialmente do aumento dos custos da energia para promoverem os seus objectivos.

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O acordo sobre o clima que os líderes mundiais alcançaram em Paris, em Dezembro de 2015, foi amplamente aclamado por estabelecer a ambiciosa meta de limitar o aumento da temperatura global bastante abaixo dos 2º Celsius em relação aos níveis pré-industriais. Mas o acordo é apenas um passo, se bem que importante. Os decisores políticos têm agora de descortinar como podem atingir essa meta – não é um feito fácil, especialmente atendendo a que, contrariamente à sabedoria convencional, não se pode contar que os custos crescentes das energias convencionais impulsionem a necessária transição para um futuro com baixos níveis de carbono.

 

À primeira vista, a lógica dos incentivos económicos negativos parece sensata. Se, por exemplo, se torna mais caro conduzir um automóvel que consome muita gasolina, então será menos provável que as pessoas o façam. Mas o impacto da evolução dos preços dos combustíveis é parcial e demora tempo. Embora no longo prazo os condutores possam passar a comprar automóveis mais eficientes em termos de consumo de combustível, é mais provável que no curto prazo reduzam outros tipos de consumo para compensar o aumento no custo dos combustíveis. Quando se trata de resolver um problema tão urgente como as alterações climáticas, a famosa frase de Keynes – "no longo prazo, todos estaremos mortos" – aplica-se claramente.

 

Além disso, mesmo que os consumidores responsam de forma eficiente, os preços dos combustíveis fósseis são ditados em grande medida por mercados fortemente influenciados por factores financeiros, o que tendem a ser extremamente voláteis. A forte queda dos preços do petróleo nos últimos 18 meses é disso um exemplo. Não só os preços do petróleo não conseguiram impulsionar uma redução do consumo como também minaram os incentivos ao desenvolvimento de fontes alternativas de energia. A título de exemplo, pode ter parecido valer a pena investir em energia solar quando o petróleo estava a ser negociado a 100 dólares por barril, mas foi algo que se tornou muito menos apelativo quando os preços quebraram a fasquia dos 50 dólares.

 

Possivelmente, os decisores políticos poderiam aumentar os impostos para compensarem essas quedas do preço. Mas esses aumentos, por vezes (como agora), teriam de ser enormes, e a adopção de políticas erráticas que espelhem a volatilidade do mercado nunca é uma boa ideia.

 

Atribuir um preço às emissões de carbono poderia levar a um desfecho semelhante. Na União Europeia, os preços cobrados pela emissão de dióxido de carbono foram baixos durante vários anos, e por enquanto os participantes do mercado parecem estar a seguir a manada na crença de que vão manter-se assim. No entanto, não há qualquer garantia de que o comércio de emissões livres não funcionará como outros mercados financeiros, produzindo fortes oscilações nos preços do CO2. Se as expectativas mudarem repentinamente, a manada poderá virar-se e correr na direcção oposta, levando a uma escalada dos preços do dióxido de carbono.

 

Contudo, um outro problema relacionado com esta abordagem baseada nos preços, no âmbito do combate às alterações climáticas, está no facto de não ter em conta o potencial dos mercados para criarem incentivos perversos. Quando o custo da energia convencional aumenta, novos fornecedores vêem uma oportunidade; assim, antes de Junho de 2014, quando os preços do petróleo estavam altos, os investidores aplicavam os seus recursos no desenvolvimento de petróleo e gás de xisto nos Estados Unidos. No entanto, esta oferta adicional acabou por levar os preços a diminuírem, reduzindo o incentivo ao investimento em fontes alternativas de energia ou na eficiência energética. Trata-se de uma reacção normal do mercado, mas não traz progressos no combate às alterações climáticas, que exigem aumentos constantes dos custos.

 

A última razão pela qual os incentivos negativos não são, por si só, suficientes para mitigar as alterações climáticas pode ser também a mais irracional: após alguns anos de aumento dos impostos, a opinião pública mostra-se veementemente contra qualquer política que possa aumentar os preços da energia, independentemente de os preços actuais estarem altos ou baixos. As pessoas estão tão convencidas de que os preços da energia estão a "explodir" (apesar da recente queda das cotações do petróleo) que é hoje extremamente difícil avançar com qualquer novo projecto que implique a mínima subida dos preços – mesmo que os preços da energia em geral continuem abaixo dos valores de há cinco anos.

 

A implicação é clara: quando os decisores políticos começarem a trabalhar na concepção de estratégias para implementar o Acordo de Paris, não deverão depender substancialmente do aumento dos custos da energia para promoverem os seus objectivos. Uma estratégia que assume que o mercado punirá quem não investir num futuro de baixos níveis de carbono não é realista.

 

É possível uma melhor abordagem: recompensar directamente quem investir num futuro com baixos níveis de carbono, quer seja através do esforço de optimização da eficiência energética ou do desenvolvimento de fontes de energia limpa. A título de exemplo, os governos poderiam implementar programas de amortizações aceleradas para o investimento em actividades geradoras de baixos níveis de carbono; oferecer subsídios ao investimento em edifícios energeticamente eficientes; e criar políticas que favoreçam a inovação industrial com o objectivo de reduzir as emissões e aumentar a competitividade. Tudo isto tornaria os combustíveis fósseis menos apelativos, tanto para os investidores como para os consumidores.

 

Se bem que, no curto prazo, uma abordagem baseada nestes incentivos positivos possa ser mais dispendiosa do que a subida dos impostos, os benefícios de longo prazo são inegáveis. Numa altura de forte resistência ao aumento dos custos da energia, esse pode muito bem ser um dos mecanismos mais eficazes – já para não dizer politicamente engenhosos – para implementar os objectivos delineados em Paris.

 

Thomas Fricke é economista-chefe da Fundação Europeia para o Clima.

 

Direitos de autor: Project Syndicate, 2016.
www.project-syndicate.org
 

Tradução: Carla Pedro

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