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04 de Dezembro de 2013 às 18:28

Os bancos chineses são os próximos?

O recente episódio de disfuncionalidade política nos Estados Unidos e a crise intermitente na Zona Euro deveriam representar uma oportunidade de ouro para a China.

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Sem dúvida que o mal-estar nos Estados Unidos e na Europa vai afectar as exportações chinesas; mas, no longo prazo, a China pretende reorientar a sua economia para o consumo interno. Com a ala do Tea Party do Partido Republicano dos Estados Unidos a assustar os investidores e a afastá-los do dólar, o interesse no potencial do renminbi chinês como moeda de refúgio só poderá aumentar.

 

Isto vai ajudar a China a atrair mais investidores que procuram diversificar as suas carteiras. A dívida do governo chinês será considerada um activo importante, o que deverá ajudar o sector privado a atrair financiamento em termos razoáveis, enquanto a predominância da Reserva Federal dos Estados Unidos na hora de determinar as condições monetárias mundiais será, supostamente, reduzida. A mudança, que já leva várias décadas, em direcção a um mundo multipolar para a indústria poderia, em consequência, derivar num mundo mais multipolar para as moedas, no qual o renminbi passaria a ser um actor preponderante.

 

No entanto, apesar da sua história única e das suas vantagens actuais, a China esconde uma fragilidade que é bastante semelhante à que causou tantos problemas nos Estados Unidos e na Europa: grandes bancos que têm um incentivo para não serem cautelosos. Os últimos movimentos da China sugerem que, ainda que possa gozar de alguns anos de maior proeminência, o encorajamento às instituições financeiras para que se tornem globais é susceptível de conduzir a sérios problemas.

 

Ironicamente, o governo britânico, que está a dar as boas-vindas aos investidores estrangeiros estendendo-lhes uma passadeira vermelha, está a ajudar a montar uma armadilha às instituições financeiras chinesas – e à economia da China, em geral. Ao incentivar a China a criar instituições financeiras globais com escassa regulação, o Reino Unido não está só a incentivar comportamentos irresponsáveis; está também a ajudar a empurrar toda a economia para actividades improdutivas e, em última análise, até auto-destrutivas.

 

A China tem mantido um controlo apertado sobre os seus principais bancos. As políticas de crédito têm ajudado a impulsionar a economia ao longo do tempo, mas as autoridades também mantiveram a capacidade de desacelerar as coisas quando tal se justificasse. A banca tornou-se um instrumento de política económica para garantir o crescimento do PIB e a criação de emprego, mantendo, ao mesmo tempo, a inflação num nível aceitável.

 

Mas as elites políticas chinesas também têm muito a ideia de que um país de primeira linha precisa de um sistema bancário de destaque que seja activo internacionalmente. Não há nada de errado com essa ambição, desde que ela seja tratada com grande cautela. Infelizmente, agora está a tornar-se evidente que a China não aprendeu as lições das crises financeiras recentes.  

 

Os banqueiros nunca gostam de regulação apertada - e particularmente não gostam que se lhes exija que financiem as suas operações com mais capital em relação à dívida. Tanto nos bons como nos maus momentos, o seu argumento é: "Precisamos de requisitos de capital mais baixos", querendo dizer que deviam ser autorizados a endividar-se mais.

 

A Islândia, Suíça e Reino Unido aprenderam todos da pior maneira que permitir aos bancos que se tornem grandes em relação às suas economias carrega grandes riscos. Os resgates tornam-se mais caros e - como no caso da Islândia - podem efectivamente ser inviáveis. Mesmo quando o custo das perdas não é completamente ruinoso, como no Reino Unido, o prejuízo directo ao crédito interno e à confiança, em geral, pode ser o suficiente para estancar a economia durante cinco anos ou mais.

 

Mervyn King, ex-governador do Banco da Inglaterra (BoE), disse uma vez que “os bancos vivem globalmente e morrem localmente". Em outras palavras, quando tudo está bem, estamos dispostos a acreditar que não importa onde um determinado banco internacional consegue financiar-se ou em que jurisdição se emitem as suas dívidas. Mas, quando coisas más acontecem e há pressão sobre os mercados financeiros, com o medo de insolvência no ar, importa e muito se temos um crédito sobre um banco nos Estados ou sobre uma filial ‘offshore’ não regulada.

 

A China quer aumentar as operações internacionais dos seus bancos. E os britânicos estão a dar as boas-vindas à expansão dessas actividades em Londres – oferecendo-se para tratar os bancos chineses que operam lá como sucursais (sujeitas à regulação chinesa) e não como subsidiárias (sujeitas à regulação britânica).

 

Mark Carney, sucessor de King no BoE, disse "estamos abertos para os negócios", em termos de concessão de liquidez para apoiar os grandes bancos. Mas os activos dos bancos do Reino Unido representavam oito vezes o PIB do país antes da crise e, presumivelmente, estão a aproximar-se novamente desse nível com o incentivo de Carney. Pode o BoE - e o Tesouro do Reino Unido - realmente fornecer um seguro para tudo isto, ou estarão as autoridades do Reino Unido a caminho de se tornar uma outra Islândia (onde o valor dos activos dos bancos atingiu um pico de mais de 11 vezes o PIB do país)?

 

As autoridades chinesas deveriam ter um outro olhar sobre as suas políticas. A China é como a Cinderela - finalmente dão-lhe oportunidade de ir à festa e de tornar-se uma peça importante. Mas a meia-noite pode vir muito rapidamente, e as crises financeiras não têm finais de contos de fadas.

 

Simon Johnson é professor da Sloan School of Management do MIT e co- autor de "White House Burning: The Founding Fathers, Our National Debt, And Why It Matters To You".

 

Copyright: Project Syndicate, 2013.
www.project-syndicate.org

Tradução de Rita Faria

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