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30 de Setembro de 2013 às 19:56

O caminho para o crescimento dos conglomerados

Os países não se tornam ricos por fazerem mais do mesmo. Fazem-no por alterar o que produzem e a forma como produzem. Crescem ao fazerem coisas que são novas para eles; em resumo, inovam.

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Muitos países têm alterado as suas estratégias de crescimento para reflectir esta abordagem. Mas, têm sido distraídos por alguns dos maiores – mas atípicos - exemplos de sucesso.

 

Todos ouvimos falar de Steve Jobs, Bill Gates e Mark Zuckerberg – estudantes na casa dos 20 anos que abandonaram a universidade e que construíram empresas que hoje valem milhões de dólares na vanguarda da inovação mundial. Ouvimos falar das “start-ups” que eles e outros adquiriram por centenas de milhões de dólares - Instagram, Skype, YouTube, Tumblr e, mais recentemente, Waze. Então, porque não imitar estes sucessos?

 

O principal problema é que estes exemplos são peculiares na indústria do software, que representa um modelo manifestamente inadequado para o resto da economia.

 

A indústria de software é única, porque apresenta barreiras invulgarmente baixas para entrar e um rápido acesso a um imenso mercado através da Internet. Uma “start-up” é tipicamente apenas um grupo de jovens com uma boa ideia e habilidades de programação. Tudo o que precisam é de tempo para escrever o código. Os incubadores proporcionam espaço, assessoria jurídica e contactos com potenciais clientes e investidores.

 

Mas, consideremos uma fábrica de aço, automóveis ou fertilizantes – ou um resort turístico, um hospital ou um banco. São organizações muito mais complexas que devem começar numa escala muito maior, que requerem muito mais investimento inicial e precisam reunir uma equipa mais heterogénea de profissionais qualificados. Isto não é algo em que se tendam a destacar jovens de 20 anos que abandonam a universidade, pois carecem da experiência, organização e acesso ao capital que estas operações requerem.

 

E, em comparação com o desenvolvimento de “software”, estas actividades também requerem mais infraestrutura, logística, regulação, certificações, cadeias de produção e uma série de outros serviços prestados à empresa – tudo em coordenação com entidades públicas e privadas. Mais importante, estas actividades deverão ser centrais para o crescimento económico em países em desenvolvimento e emergentes. Então, como se podem erguer as empresas nestes sectores e o que pode ser feito para estimular a sua formação?

 

Muitos governos dos países em desenvolvimento estão a ignorar esta questão. Por exemplo, o governo do Chile, obcecado com as chamadas políticas “horizontais”, que tratam de forma igual todos os sectores, recentemente implementou a “Start-Up Chile”, um programa com regras “standard” para encorajar novas empresas. Embora estas regras tenham sido desenhadas para todas as indústrias, o esquema atrai quase exclusivamente empresas de “software” – as únicas que podem ser formadas com o baixo nível de apoio que o programa proporciona.

 

Outros sectores enfrentam dilemas mais importantes, do género de “quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha”: frequentemente, os países não contam com as capacidades que são requeridas por sectores que ainda não existem, mas é impossível desenvolver esses sectores a menos que estejam presentes as capacidades que eles precisam. Uma forma de resolver este problema de coordenação é através da integração vertical – ou seja, as empresas que podem resolver internamente a coordenação da oferta e da procura em qualquer nova capacidade.

 

É por isso que os grupos de negócios nacionais – conglomerados – têm frequentemente um papel chave na transformação de uma economia e das suas exportações. Isso é especialmente verdade nos países em desenvolvimento, onde muitos mercados estão em falta e onde o ambiente de negócio é, muitas vezes, extremamente desafiador.

 

Os conglomerados podem usar o seu conhecimento, as suas habilidades de gestão e capital financeiro para se aventurarem em novas indústrias. Podem começar coisas a uma escala que seria impossível para uma “start-up”. Podem assumir compromissos credíveis para fornecedores futuros e influenciar o ecosistema de negócios para tornar novas indústrias viáveis.

 

Consideremos a Coreia do Sul. Em 1963, o país exportou bens que valiam menos de 600 milhões de dólares aos preços actuais, na maioria, produtos primários como marisco e seda. Cinquenta anos depois, exporta bens no valor de cerca de 600 mil milhões de dólares, na sua maioria electrónicos, maquinaria, equipamentos de transportes e produtos químicos.

 

Esta transformação não foi alcançada através de “start-ups” independentes. Foi feita através de conglomerados, ou chaebols em coreano. Por exemplo, a Samsung começou como uma empresa comercial, transferiu-se para o processamento de alimentos, têxteis, seguros e venda a retalho, e depois para a electrónica, construção naval, engenharia, e indústria aeroespacial, apenas para nomear algumas actividades. A transformação da Coreia do Sul reflectiu-se na transformação das suas empresas líderes.

 

Mas, em muitos países em desenvolvimento, os conglomerados não tiveram um papel equivalente. Estavam focados em bens não transaccionáveis e serviços – que não podem ser importados ou exportados – e têm evitado a concorrência internacional. Têm estado focados na banca, construção, distribuição, retalho e televisão.

 

Uma vez estas empresas dominem um mercado, movem-se para outro que é igualmente protegido de concorrência e desprovido de oportunidades de exportação, frequentemente usando a sua dimensão e influência política para impedir a entrada de possíveis concorrentes. Em vez de se tornarem agentes da mudança, muitas vezes, previnem a mudança. (De facto, o grande debate económico na Coreia do Sul actualmente está relacionado com o travão à inovação que criam os “chaebols” quando evitam que novas empresas os possam desafiar.)

 

A transformação produtiva que os países em desenvolvimento precisam é muito mais fácil de alcançar com apoio, em vez de obstrução, dos seus conglomerados. Mas, assegurar este apoio requer políticas que empurrem os conglomerados (com mais ou menos suavidade) em direcção a indústrias de exportação que possam crescer além dos limites do mercado doméstico – indústrias nas quais a concorrência vai encorajar a disciplina que lhes falta como resultado do controlo dos mercados locais.

 

Para serem bem sucedidos, os conglomerados precisam do apoio do governo e da aceitação da sociedade. Têm de a ganhar através da sua contribuição para o crescimento do emprego, exportações, receitas fiscais e para a transformação tecnológica do país. É por isso que o general Park Chung-hee (presidente da Coreia do Sul de longa data e pai da actual presidente Park Geun-hye) pressionou os “chaebols” a fazerem no início da década de 60. E é o que os governos e a sociedade civil nos países em desenvolvimento devem, actualmente, procurar nos seus conglomerados.

 

Ricardo Hausmann, ex-ministro do Planeamento da Venezuela, e antigo economista-chefe do Banco Interamericano de Desenvolvimento, é professor de Economia na Universidade de Harvard, onde também é director do Centro para o Desenvolvimento Internacional.

 

Copyright: Project Syndicate, 2013.
www.project-syndicate.org

 

Tradução de Raquel Godinho

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