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11 de Abril de 2014 às 15:08

China amiga

Numa altura em que a ambição territorial da China tem enfraquecido os seus laços com vários países da região, e a sua influência em Mianmar diminuiu, a deterioração da sua relação com a Coreia do Norte, outrora o seu vassalo, torna-a uma potência sem verdadeiros aliados.

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A questão agora é se os Estados Unidos e outras potências podem usar este desenvolvimento para criar uma abertura diplomática para a Coreia do Norte que poderia ajudar a transformar as tensas relações geopolíticas no nordeste da Ásia.

 

A relação da China com Mianmar começou a deteriorar-se no final de 2011, quando Mianmar decidiu suspender o trabalho no maior e mais controverso projecto relacionado com a China: a barragem Myitsone Dam, um investimento de 3,6 mil milhões de dólares localizado no rio Irrawaddy. A decisão chocou a China, que tratava Mianmar como um Estado cliente – e onde mantém interesses significativos, apesar do corte de relações.

 

A corajosa decisão de suspender o projecto da barragem pode ter ferido a relação de Mianmar com a China, mas foi um passo positivo para as suas relações com o resto do mundo. De facto, seguiu-se uma grande mudança política, que resultou na flexibilização das sanções ocidentais de longa data e no término de décadas de isolamento internacional.

 

Ao distanciar-se da China, o jovem ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un, pode estar a sinalizaro desejo de se mover numa direcção semelhante. Claro que, se quiser descongelar as relações com os Estados Unidos, ainda tem um longo caminho a percorrer. O seu acolhimento da ex-estrela do basquetebol americano, Dennis Rodman, que tem gerado controvérsia nos Estados Unidos EUA, e a alegada execução de uma ex-namorada com uma metralhadora (como relatado por um jornal sul-coreano, citando fontes não identificadas na China) não é a melhor maneira de chegar ao coração dos Estados Unidos.

 

Para a maioria dos observadores, o episódio que desencadeou a deterioração da relação da China com a Coreia do Norte - a execução do tio de Kim, Jang Song-thaek – reflecte, simplesmente, a política errática e obscura da Coreia do Norte. Para a China, no entanto, foi pessoal. As acusações de traição feitas contra Jang – o melhor amigo da China no regime da Coreia do Norte - incluíam a venda, a preços reduidos, de carvão, terra e metais preciosos à China.

 

Mas as "relações de sangue" cuidadosamente alimentadas da China com a Coreia do Norte vinham azedando quase desde que Kim sucedeu o seu pai, Kim Jong-il, no final de 2011. Numa primeira demonstração de desafio, a Coreia do Norte apreendeu três barcos de pesca chineses, deteve as 29 pessoas a bordo por 13 dias (durante o quais foram alegadamente abusadas) e, em seguida, exigiu 190 mil dólares de compensação por pesca ilegal em águas norte-coreanas. Kim passou a irritar ainda mais a China com a realização do terceiro teste nuclear do país.

 

Sem surpresa, os meios de comunicação estatais da China responderam às tentativas de Kim de traçar um caminho independente, acusando-o de prosseguir a "desinificação" do reino eremita. Mas, além de uma campanha de propaganda anti- Kim, as opções da China são limitadas porque o país tem interesse em manter o acesso a vastas reservas de minério de ferro, magnesite, cobre e outros minerais da Coreia do Norte - da mesma forma que mantém o acesso às enormes reservas de Mianmar.

 

Mais importante ainda, qualquer tentativa da China de pressionar a Coreia do Norte, inclusive cortando energia e abastecimento de alimentos, correria o risco de desencadear um afluxo maciço de refugiados. Pior ainda para a China é que poderia provocar o colapso do regime da família Kim o que, por sua vez, poderia desfazer o estado norte-coreano e conduzir a uma Coreia reunificada e ressurgente, aliada com os Estados Unidos. A perspectiva de tropas norte-americanas na sua fronteira é um cenário de pesadelo para a China.

 

Além disso, uma Coreia reunificada herdaria as disputas territoriais e de recursos que estão em curso com a China (relativas, por exemplo, a Chonji, o lago da cratera no Monte Paektu, e às ilhas dos rios Yalu e Tumen). Provavelmente, a China só aceitaria a reunificação se ela conduzisse a uma Coreia “Finlandizada”, que oferecesse concessões estratégicas permanentes à superpotência ao lado.

 

Como a Coreia do Norte de hoje, Mianmar era, até recentemente, um país militarista isolado, a sofrer sanções internacionais prolongadas e crescentes. Na verdade, reflectindo a sua crescente frustração com Kim, a China co-patrocinou a mais recente rodada de sanções da ONU contra a Coreia do Norte no ano passado.

 

Mas, ao passo que Mianmar é uma sociedade diversificada que tem sido devastado por conflitos internos opondo as elites dominantes contra muitos dos grupos minoritários do país, a Coreia do Norte é uma sociedade homogénea, arregimentada, e com armas nucleares. Por outras palavras, a Coreia do Norte é uma ameaça muito mais poderosa para o resto do mundo.

 

Ainda assim, as divergências entre a Coreia do Norte e a China marcam uma viragem potencial na geopolítica do nordeste asiático. Se os Estados Unidos aproveitarem a abertura diplomática, devem alterar a sua dependência em relação aos chineses para servir como seu intermediário com a Coreia do Norte - um ponto sensível com o regime de Kim, dado o seu desejo de reduzir a sua dependência da China.

 

Ao contrário da abertura dos Estados Unidos com Mianmar, que levou à histórica visita do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em 2012, qualquer compromisso americano com a Coreia do Norte teria que basear-se num acordo de desnuclearização. A questão é se Obama - condicionado não só por problemas internos, mas também pelos esforços para alcançar um acordo sobre a Síria e um acordo nuclear interino com o Irão - tem o espaço político e a inclinação pessoal para entrar em negociações de risco com a Coreia do Norte.

 

Brahma Chellaney é professor de Estudos Estratégicos no Centro de Pesquisa Política de Nova Deli. 

 

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2014.
www.project-syndicate.org

Tradução: Rita Faria

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