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Uma alternativa verde à austeridade?

Se bem que a austeridade na Europa se depare com uma crescente resistência social, em princípio tem o mérito da simplicidade. À medida que o debate sobre a consolidação orçamental versus crescimento se vai intensificando, torna-se claro que há pouca unanimidade quanto à forma de revitalizar a economia além da implementação de vastos pacotes de estímulos.

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Uma ideia é que a tecnologia ambiental deve alimentar um ciclo virtuoso de inovação e emprego. Para alguns, o crescimento ecológico evoca um campo coberto de moinhos de vento e telhados urbanos cobertos com painéis solares, mas é mais do que isso. A título de exemplo, quando a Airbus passou da moldagem por injecção para a impressão a 3D, para produzir dobradiças metálicas para as portas dos aviões, reduziu o seu peso para metade, conseguindo assim poupanças fenomenais em termos de consumo de materiais e do correspondente combustível durante toda uma vida de voos por todo o mundo com essas dobradiças.

Ainda assim, é mais fácil encontrar histórias empolgantes do que mostrar como se pode contribuir colectivamente para a revitalização de toda uma economia. Além disso, há uma grande variedade de histórias sobre a economia verde - e é provável que a sua proliferação se intensifique.

Em Junho, milhares de activistas, dirigentes políticos e empresários juntaram-se no Rio de Janeiro para a terceira e gigantesca Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), cujo tema se centrou a economia verde. Nesta conferência, foram apresentados novos argumentos sobre os empregos "verdes", crescimento, aumento e redução de custos, mudanças de valores, a escolha dos consumidores resultantes de uma maior consciencialização para a ecologia – tudo verde, tudo verde.

Na qualidade de co-autor de "A New Growth Path for Europe" [Uma nova via de crescimento para a Europa], um relatório encomendado pelo Governo alemão, sou culpado de ter contribuído para a cacofonia de perspectivas complementares sobre o crescimento verde. A Fundação Europeia para o Clima já publicou o seu "Roadmap 2050: A Practical Guide to a Prosperous, Low-Carbon Europe" [Roadmap 2050: um guia prático para diminuir as emissões de CO2 na Europa]. Depois disso, o Programa das Nações Unidas para o Ambiente escreveu o seu "Green Economy Report" [Relatório sobre a Economia Verde], a McKinsey publicou "The Resource Revolution" [A Revolução de Recursos] e o Conselho Internacional de Sindicatos publicou "Growing Green and Decent Jobs" [Ecologização e empregos decentes] – isto só para citar alguns.

Todos eles têm abordagens ligeiramente diferentes e fazem recomendações diferentes, pelo que se torna mais difícil para os dirigentes políticos verem a floresta através das árvores. E na raiz desta multiplicidade de perspectivas está o facto de a ciência económica se debater para explicar de que forma é que o crescimento e a inovação fazem avançar uma economia como um todo. Os modelos macroeconómicos de que dependem os responsáveis políticos são instrumentos sólidos numa época de evolução moderada e progressiva, mas a ecologização não tem a ver com mudanças graduais.

A título de exemplo, a meta da União Europeia de reduzir 80% das emissões de gases com efeito de estufa até 2050 envolve uma total reforma das infra-estruturas da União Europeia em apenas algumas décadas. A incapacidade dos economistas para modelarem mudanças tão rápidas e radicais não deve ser tomada como uma condenação dessa disciplina; é simplesmente um reflexo do estado de nosso conhecimento e do facto de a economia ser muito, mas mesmo muito, complicada. Simplesmente, não temos ainda percepções suficientemente precisas sobre como todos os seus elementos interagem em épocas de grandes mudanças, quer se trate de uma crise financeira ou de uma aceleração do crescimento.

No entanto, todos os supramencionados estudos sobre a ecologização parecem fornecer tais explicações. Assim sendo, o que é que eles realmente nos dizem?

Na prática, cada um deles se limita a um ou dois aspectos da economia e descrevem as suas relações mútuas. O estudo "Growing Green and Decent Jobs" analisa a relação entre o investimento e o emprego. "A New Growth Path for Europe" debruça-se sobre o efeito das expectativas e da aprendizagem pela prática. O relatório "Roadmap 2050" focaliza-se na ecologização do sistema eléctrico. Todos estes autores dão em seguida um salto de fé para tirarem conclusões sobre a economia no seu conjunto.

Mas apesar de o valor destes estudos estar na luz que lançam sobre as partes, os destaques subsequentes versam invariavelmente sobre o todo, articulado em termos de PIB e de empregos. Cada um desses estudos descreve determinado aspecto de uma economia verde, mas nenhum deles consegue captar o todo: não porque sejam estudos pobres, mas porque é algo que simplesmente excede a nossa capacidade.

Posto isto, o facto de ninguém conseguir provar, de forma conclusiva, como é a ecologização poderá resultar, não significa que devamos desistir da ideia. A História mostra-nos que as vagas de inovação, desde a máquina a vapor até à revolução da informação e da comunicação, têm sido fortes impulsionadoras do crescimento económico. Não podemos provar que uma vaga de inovação ambiental terá o mesmo efeito, mas os estudos das partes sugerem que tal resultado é altamente plausível.

Na qualidade de seres humanos, estamos extraordinariamente dotados para tomar decisões a partir de informação ambígua - na verdade, fazemo-lo constantemente. Quando escolhemos uma carreira ou um cônjuge, na nossa vida privada, ou quando um político aproveita uma oportunidade a partir de uma infinidade de possibilidades, a tarefa em mãos consiste sempre em tomar decisões importantes com base em informação imperfeita.

Uma grande pilha de relatórios sobre o crescimento ecológico demonstra a plausibilidade desta via para a recuperação a partir de uma crise económica de proporções históricas. Compete-nos agora perceber o seu potencial. A ecologização oferece uma alternativa realista à vacilante abordagem da austeridade para superar a actual crise económica. Os dirigentes políticos deveriam incorporar estas ideias no discurso "além da austeridade" que está a ganhar forma num crescente número de importantes Estados-membros da UE.

Roland Kupers é director de investigação no THNK e professor convidado da Universidade de Oxford.

Direitos de autor: Project Syndicate, 2012.
www.project-syndicate.org
Tradução: Carla Pedro


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