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Carlos Saraiva Alves csalves@isg.pt 12 de Novembro de 2007 às 13:59

Sobre a contabilidade

A contabilidade é uma ciência, edificada a partir da criação de uma metodologia consistente de registo para o apuramento rigoroso do valor patrimonial. O seu conhecimento na Europa é anterior ao século XIII e a sua aplicação desenvolveu-se a par com a ari

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O seu conhecimento na Europa é anterior ao século XIII e a sua aplicação desenvolveu-se a par com a aritmética, após a adopção dos algarismos árabes pela escrita cristã (finais do século XV) já que até essa data toda a escrita de números utilizava os caracteres romanos (que não integravam o zero) e que eram de difícil utilização, quer para o registo, quer para a realização de cálculos.

Data de 1494 o ‘Summa de aritmetica, geometria et proporcionalita’, publicado em Veneza, da autoria do franciscano Luca Paccioli, que estudou profundamente as matemáticas do seu tempo e trabalhou com Leonardo da Vinci. Nesta obra explica-se pela primeira vez com detalhe o método das ‘partidas dobradas’, com base num trabalho de Fibonacci (protegido do  imperador Frederico II de Roma) que em 1202 tinha publicado o ‘Liber Abaci’,  um tratado de matemática em que se fazia referência ao método citado, na sequência de estudos feitos com matemáticos árabes (vide ‘Against the Gods - The Remarkable Story of Risk’, Peter L.Bernstein, J.Wiley  & Sons, 1996).

A determinação do valor de um património em dois momentos distintos, permite dizer, simplesmente calculando a respectiva diferença, se o seu proprietário arrecadou ou não cabedais (forma antiga de dizer lucros, já que o dinheiro só existia na forma de moeda e os meios monetários eram guardados em sacos de cabedal). Se este procedimento for seguido em datas certas e com critérios aferidos, ano após ano, para todos os patrimónios de uma região, o apuramento conjunto dar-nos-á a noção do enriquecimento global. Em breves linhas, está é a fundamentação histórica do plano de contabilidade (POC), a explicação lógica das operações anuais de ‘fecho de contas’ e da orientação destes procedimentos para finalidades fiscais.

É bastante óbvio o interesse da contabilidade para a governação das cidades e para a consolidação dos estados, podendo mesmo considerar-se que ‘a sua contribuição para o desenvolvimento global das economias terá dimensão idêntica à da invenção do engenho a vapor’ (op.cit.).

Uma passagem breve pela história de Portugal torna razoavelmente evidente que a contabilidade terá tido algum papel na organização das empresas que armaram naus, correram riscos e dominaram rotas estratégicas, e na estruturação das finanças e do poder centralizado do estado. Na segunda metade do século XVIII, sob a  administração de Pombal, a disciplina ganhou, aliás, especial dignidade com a instituição da 1ª Aula de Contabilidade, que se destinava a apoiar o comércio, as indústrias e a marinha mercante, que nessa época conheceram efectivo desenvolvimento em Portugal. 

No último quartel do século XX a Contabilidade recebeu enorme impulso por via da normalização e do desenvolvimento da informática. As exigências da fiscalidade moderna, as operações bancárias internacionais, a globalização das economias e a dinâmica das bolsas de valores, têm tido plena correspondência na evolução normativa contabilística, cujo desenvolvimento é notável entre a Comunidade Europeia e os Estados Unidos. 

A contabilidade apoia-se no rigor aritmético das ‘partidas dobradas’ – i.é, em cada lançamento e no balanço patrimonial, a soma dos valores registados a débito deve ser igual à dos valores a crédito – e estrutura-se nos ‘sete princípios’: (I) continuidade, (II) consistência, (III) especialização, (IV) valor histórico, (V) prudência, (VI) substantividade, (VII) materialidade.

As práticas contabilísticas, de controlo financeiro e auditoria que se ensinam e exercem hoje em Portugal, acompanham as técnicas e processos mais avançados do mundo desenvolvido. Estão acessíveis (mesmo para as pequenas empresas) programas computacionais e existe informação suficiente para que se possam realizar diariamente as operações de registo, dar cabal cumprimento às exigências legais nos prazos estabelecidos e servir as necessidades da gestão.

Nos termos de rigor dos princípios e das práticas em que se fundamenta, a contabilidade constitui um conhecimento essencial e indispensável para o domínio das ciências empresariais. O seu presente está positivamente correlacionado com o desenvolvimento da economia e da sociedade.

A contabilidade do futuro orientar-se-á certamente para o aperfeiçoamento científico e para a criatividade na determinação do valor, instituindo-se como garante das relações de equidade e confiança entre os cidadãos e as instituições – públicas e privadas – nos estados democráticos.

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