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04 de Dezembro de 2011 às 23:30

Sem mediatismo, com profissionalismo e independência

Em menos de 20 anos de iniciativa privada (1987-2007) o sistema financeiro português atingiu patamares de excelência internacionalmente reconhecida.

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1. Em menos de 20 anos de iniciativa privada (1987-2007) o sistema financeiro português atingiu patamares de excelência internacionalmente reconhecida. Cumprindo a sua função basilar, o sistema financeiro foi promotor do desenvolvimento económico e social do País, sendo agente financiador das empresas, remunerando a poupança dos particulares e viabilizando o acesso a habitação própria a muitas famílias.

Com profissionalismo e independência na gestão, o sistema preservou níveis de solidez, eficiência e rentabilidade adequados, cabendo na conta de exploração a remuneração fixa e variável dos colaboradores, assim como o digno provisionamento das pensões de reforma para que cada colaborador, saindo de uma instituição, não representasse um peso para os restantes. O sistema soube ainda evitar os activos tóxicos que estiveram na origem da crise financeira e da extinção de grandes instituições financeiras mundiais. Exibindo um comportamento exemplar, o sistema financeiro português cresceu e fez crescer, até onde o deixaram.

2. Com início em 2007, a Banca em Portugal passou a ser declaradamente instrumentalizada para atender a empresas e projectos que não mereceriam, vindo a gerar imparidades devastadoras. Perante o agravar da crise global, essa instrumentalização aumentou, verificando-se a desproporção de apoios a dois pequenos bancos, com uso e abuso dos grandes e bons Bancos portugueses, que viriam ainda a tomar dívida soberana nacional e estrangeira, perpetuando um ciclo político. Uma linha de orientação com o beneplácito da supervisão - prudencial e de mercados, que deveria ter dado maior, senão toda a atenção ao mercado de investidores e depositantes.

Desta forma, um sistema financeiro que devia apenas sofrer por contágio externo - ao contrário, por exemplo, do irlandês, não causou qualquer problema à economia -, mas antes o inverso, viu-se rapidamente livre da iniciativa que o havia feito crescer e prosperar. Viu-se, aliás, livre de qualquer iniciativa que não a de atender a desígnios pouco colectivos, sem retorno económico e muito menos social.

3. Na Europa já pouco "soberana", perdura a crise da sua própria dívida, outrora sem risco, e deterioram-se as condições económicas e financeiras. Num novo paradigma dos mercados, continua a faltar na equação uma variável crítica que tarda a ser reparada - o activo sem risco. Sem inteligência ou prudência, a Europa prolonga a resolução da crise, onde todos falam muito e alto, favorecendo-se uma agenda alemã que recusa soluções. Impõem-se rácios e metas que, sem uma justificação consistente, asfixiam o sistema financeiro, obrigando a medidas imediatas, mas transformacionais, que desagregam o carácter das diferentes instituições (venda de activos, transferência de responsabilidades), e impedindo que se trabalhe para os indicadores que efectivamente interessam do ponto de vista da sustentabilidade de longo prazo - o Resultado Líquido por acção ou os Recursos de Clientes por acção, estes sim capazes de beneficiar uma performance bolsista.

Em Portugal, e a reboque de soluções europeias, prepara-se a entrada do Estado nos Bancos para resolver um problema arquitectado e logo simulado - capital. O sistema, não em uníssono, diz que não quer. E, efectivamente, nos termos que se vislumbram, os mecanismos de apoio não lhe são amigáveis.

Que empresa cotada precisa de mecanismos de apoio com latitude suficiente, mas que prenunciam uma autêntica nacionalização a médio prazo? Quem pretenderá investir em tais empresas, que para mais não pagarão dividendos? Quando se antevê para os próximos três ou cinco anos uma geração de cash flow, que será praticamente exclusiva para suportar tal plano de recapitalização, quem virá substituir o Estado, a não ser o próprio Estado? Já não há Rockefellers no Mundo, quanto mais em Portugal.

4. Uma vez que o devaneio europeu de rácios e metas dificilmente pode ser contrariado por um país periférico, devem, pois, aproveitar-se todas as oportunidades para salvaguardar o interesse nacional.

A iniciativa pública tem inúmeros casos de sucesso no que toca a mecanismos de apoio, como também tem maus exemplos - quando se mudam desígnios e estratégias de superior interesse nacional de acordo com a cor política, acusando uma democracia pouco inteligente.

No sistema financeiro, os últimos cinco anos foram suficientes para saber que não se quer seguramente repetir uma desastrosa gestão interventiva. Os responsáveis de agora têm ainda margem de manobra para adequar os mecanismos de apoio ao sistema financeiro, que não podem desperdiçar, à realidade nacional. Distinga-se a boa da má iniciativa - criação de condições e estabelecimento de regras, sim, qualquer outra intervenção, não.

A Banca precisa de voltar a preservar a via do profissionalismo e da independência, pois a economia tem de ganhar competitividade e crescer novamente. É urgente restabelecer a relação entre o stock de crédito da economia e o crescimento económico; e só um sistema financeiro ágil, profissional e independente, obviamente sigiloso, pode fazê-lo. Qualidades necessárias sobretudo no desencadear de um processo de desalavancagem, para que não se continue a transformar empresas que seriam viáveis, se financiadas, em armazéns de sucata, com o consequente desemprego dificilmente recuperável.

É preciso olhar e dar a mão às boas empresas. O País carece de mais e mais empresas que cresçam e façam crescer, como uma Jerónimo Martins, uma Efacec e tantas outras, pois é com estas que a economia e as famílias prosperam. É com empresas de sucesso que se fomenta uma classe média, essencial para fazer o país expandir económica e socialmente, sem esquecer a demografia. Basta então que se criem as condições necessárias, deixando trabalhar a livre iniciativa - profissional, independente e que dispense o mediatismo.



Ex-presidente do BCP
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