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Que comecem os jogos

É inevitável falar hoje dos Jogos Olímpicos de Pequim. Nem que fosse pela peculiar conjugação de oitos da data desta crónica, coisa que tanto excita a oriental superstição. Mas sobretudo porque tal como afirmou recentemente um grande sábio algarvio, ainda que a propósito de outro magno assunto, sempre se sabe como os Jogos começam, mas nunca se sabe como acabam.

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É inevitável falar hoje dos Jogos Olímpicos de Pequim. Nem que fosse pela peculiar conjugação de oitos da data desta crónica, coisa que tanto excita a oriental superstição. Mas sobretudo porque tal como afirmou recentemente um grande sábio algarvio, ainda que a propósito de outro magno assunto, sempre se sabe como os Jogos começam, mas nunca se sabe como acabam.

É assim que ver no evento um mero conjunto de competições desportivas com o seu cortejo de alegrias e tristezas individuais e nacionais é perder parte do espectáculo. Porque mais do que ser palco de correrias e saltos a China quis sobretudo aproveitar a oportunidade para se revelar ao mundo, colando uma imagem positiva e moderna ao seu já evidente poderio económico.

A grandiosidade da arquitectura, a pompa da circunstância, a congregação de tanto dignitário estrangeiro, a atenção sequiosa dos media servem perfeitamente o propósito.

Trata-se contudo de um empreendimento arriscado num país formatado por uma ideologia do isolamento e criteriosa repressão de qualquer exibição de liberdade. Mostrar-se ao mundo é mostrar as coisas boas, mas também chamar a atenção para as coisas más. E o caso do Tibete, apesar de muita tontice dos pró-dalai-lama, aí está para o comprovar.

Mas não só. A poluição, por exemplo, é outra revelação chocante. Exceptuando aqueles que já visitaram Pequim, poucos teriam até aqui a noção da catástrofe ambiental em que a capital da China está mergulhada.

O ar é pura e simplesmente irrespirável. O sol nunca aparece. A cidade flutua no interior de uma espessa nuvem de poeira e gazes tóxicos. O que, diga-se de passagem, é o pior ambiente para se praticar desporto e ainda menos para a alta competição. Os atletas vão ter uma vida difícil.

Confirma-se assim que os chineses revelam um grande desprezo pelo ambiente e pela vida natural. O impressionante desenvolvimento económico tem sido feito à custa de grandes atentados ambientais, transformação dos rios em esgotos, extermínio da vida animal.

Aliás os chineses comem e matam tudo o que mexe. Metem qualquer animal dentro de gaiolas que depois passeiam estupidamente pelos jardins poluídos. Para além de chacinarem animais só para lhes retirar pequenas partes do corpo que depois ingerem no pressuposto de que isso lhes trará potência sexual, de cuja falta devem sofrer muito.

Negativa é também a confirmação de que apesar de todo o fogo-de-artifício e muito sorriso, o regime continua a apertar as malhas da liberdade. A censura da Internet, a vigilância do tratamento noticioso dos correspondentes estrangeiros, o "aconselhamento" aos atletas para que não se metam em política, o praticamente impossível diálogo com a população local, são reveladores de que a pretensa abertura só tem uma direcção e um objectivo.

Mostrar o cantinho da China circunscrito à arena olímpica e esconder tudo o resto.

É claro que estas coisas nunca correm como os burocratas desenharam. Durante este mês o mundo irá dar-se conta da incongruência que é este enorme país e muitos chineses serão estimulados a querer outra vida.

Por isso logo se verá se as brisas agora lançadas pela elite comunista trarão algumas tempestades no futuro próximo.

Quanto aos jogos propriamente ditos vejo desde já um dado muito positivo. Pelo menos durante este mês iremos ouvir falar de outras modalidades para além do omnipresente e insuportável futebol. Pessoalmente aprecio sobretudo o atletismo onde o humano explora os limites das suas capacidades físicas sem outros efeitos colaterais. Ou seja e acima de tudo sem fazer mal a outras espécies.

E aí contra todas as expectativas, dado que somos um pequeno país e ainda para mais de fracos hábitos desportivos, temos alguns atletas dignos de registo e com efectivas possibilidades de fazer boa figura na mais exigente competição internacional. Só no atletismo são 27 os seleccionados. Sem criar grandes expectativas, sempre o melhor caminho para a depressão, espero que alguns destes atletas consigam elevar um pouco a auto-estima dos portugueses. Que bem precisam.




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