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30 de Novembro de 2007 às 13:59

O adeus às velhas divisões do desenvolvimento

A noção de divisão entre o Norte rico e o Sul desenvolvido tem sido, já há muito tempo, um conceito central entre economistas e decisores políticos. De 1950 a 1980, o Norte contribuiu com perto de 80% do PIB global, mas apenas com 22% da população, ao pas

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Mas a divisão Norte-Sul já está obsoleta. O dinâmico processo de globalização resultou em níveis de crescimento e de interdependência sem precedentes. Contudo, ao mesmo tempo que esta velha divisão se vai dissipando, outras têm vindo a substitui-la, separando o mundo actual em quatro níveis interligados.

O primeiro nível engloba os países abastados, nomeadamente os Estados Unidos, as nações europeias, a Austrália e o Japão – com uma população conjunta de cerca de mil milhões de pessoas e rendimentos per capita compreendidos entre 79 mil dólares (Luxemburgo) e 16 mil dólares (República da Coreia). Nos últimos 50 anos, estes países abastados dominaram a economia global, sendo responsáveis por quatro quintos da sua produção económica. No entanto, mais recentemente, surgiu um novo grupo de economias que está a contestar o domínio económico dos países abastados.

Estas economias emergentes – chamemos-lhe globalizadoras – constituem um segundo nível, composto por cerca de 30 países pobres e com rendimentos médios (onde se incluem a China e a Índia), com taxas de crescimento do PIB per capita de 3,5% e mais, e com uma população total de 3,2 mil milhões de pessoas - o que corresponde a perto de 50% da população mundial. Estes países têm registado níveis ímpares de crescimento económico sustentado que poderão permitir-lhes substituir os “abastados” como motores da economia mundial.

Os globalizadores são um grupo vasto e diversificado de países – em dimensão, geografia, cultura e história – que aprenderam como se integrar de forma óptima na economia global – e alavancando-a – para catalisarem o seu desenvolvimento.

Existe um terceiro nível que é constituído por, aproximadamente, 50 países com rendimentos médios e uma população agregada de 1,1 mil milhões de pessoas. Dispõem, também, de muitos dos mais importantes recursos naturais do planeta, possuindo cerca de 60% das reservas provadas de petróleo. Mas este “rentiers” [que vivem das receitas dos seus recursos] ainda não conseguiram traduzir as receitas da riqueza dos seus recursos naturais em crescimento económico sustentado.

O quarto nível agrega os países que estão a ficar para trás – as economias mais pobres do mundo, com mais de mil milhões de pessoas. Em termos económicos, continuam a estagnar ou a declinar. Essencialmente localizados na África subsaariana, estes países “vagarosos” estão bastante isolados da economia global e deparam-se com desafios cruciais em matéria de desenvolvimento.

Este quarto nível emergente apresenta-nos três desafios-chave. Em primeiro lugar, precisamos de intensificar os nossos esforços para garantirmos que os países atrasados deixam de ficar para trás. Isto requer mudanças de política, bem como ajudas mais generosas e mais eficazes. Se considerarmos a questão das ajudas financeiras, percebemos que, apesar de a ajuda ao desenvolvimento ter aumentado em 2005 para 107 mil milhões de dólares, a maior fatia desse dinheiro destinou-se a “circunstâncias especiais”, tais como o perdão da dívida ao Iraque e ao Afeganistão. A triste verdade é que a ajuda ao desenvolvimento em África diminuiu de 49 dólares por pessoa em 1980 para 38 dólares por pessoa em 2005. As reais necessidades de desenvolvimento dos países mais atrasados e de outras regiões do mundo não estão a ser colmatadas, apesar da retórica sobre o aumento do montante das ajudas.

Em segundo lugar, as antigas potências precisam de acomodar o despontar das economias globalizadoras – particularmente a China e a Índia – e para isso é preciso que reformemos o nosso ordenamento internacional. Os países abastados continuarão a ser importantes intervenientes globais, mas à medida que o poder económico relativo dos globalizadores for aumentando, estes exigirão um papel mais preponderante nos assuntos internacionais. A maioria dos países abastados não parece estar preparada para esta mudança, mas essas exigências terão de ser atendidas.

Por último, se bem que os globalizadores tenham retirado milhões de pessoas da pobreza e reduzido as desigualdades a nível mundial, esse cenário não resultou num mundo mais igualitário porque há economias-estrela, como a Índia e a China, que estão a experimentar uma maior desigualdade interna. Quer estejam em causa as zonas costeiras versus zonas interiores ou as zonas rurais versus zonas urbanas, estes países têm de conseguir resolver as suas crescentes disparidades, pois o elevado nível de desigualdade pode muito bem ameaçar a sua capacidade de continuarem a crescer como tem sucedido até aqui.

Se quisermos criar um mundo mais equitativo, então as tradicionais alavancas do desenvolvimento, como o comércio, investimento, ajuda financeira e migração, precisam de ser elevadas de forma abrangente e coerente. Além disso, as instituições globais precisam de ser reestruturadas. Só assim melhoraremos a nossa capacidade para lidar com os desafios globais e só assim conseguiremos melhorar as nossas previsões para a criação de um mundo mais justo. Se assim não for, poderemos estar a dizer adeus às antigas divisões, mas também a acolhermos outras que as vêm substituir.

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