Opinião
Mais mulheres e raparigas na liderança das TIC
O dia mundial das telecomunicações e da sociedade da informação celebra-se, por resolução da ONU, a 17 de Maio. Tem o objetivo de fazer despertar a importância da Internet e outras tecnologias de informação e comunicação (TIC) na sociedade e na economia, procurando em simultâneo combater a exclusão digital.
O dia mundial das telecomunicações e da sociedade da informação celebra-se, por resolução da ONU, a 17 de Maio. Tem o objetivo de fazer despertar a importância da Internet e outras tecnologias de informação e comunicação (TIC) na sociedade e na economia, procurando em simultâneo combater a exclusão digital.
A comemoração deste ano convida não só à celebração como também à reflexão. Por vários motivos. A preponderância das TIC nas sociedades economicamente desenvolvidas é hoje inquestionável. Muitos de nós dependem delas no seu dia a dia, tanto no trabalho como na esfera privada. Os ganhos são visíveis: para muitos, um telefone inteligente permite gerir com eficácia incomparável as contas dos serviços domésticos ou bancários, a organização de um jantar de grupo ou uma viagem de férias.
Porém, o uso crescente das TIC introduz também desafios cada vez maiores. As nossas relações estão a mudar profundamente em resultado do uso permanente que delas passámos a fazer. À medida que, enquanto coletivo, absorvemos o uso das TIC nas tarefas que requlam a nossa atividade social, aceitamos também, para o bem e para o mal, essa dependência de forma mais condescendente. Temos matéria-prima e um enorme potencial para melhorarmos as nossas vidas, mas também muitas decisões coletivas a tomar.
Confrontamo-nos, porém, com um grande entrave a esta evolução. Presentemente, as infraestruturas de apoio ao desenvolvimento social e económico carecem de um número crescente de profissionais altamente qualificados de que não dispomos. Por um lado, tratam-se de profissões que exigem capacidades analíticas, essenciais à descoberta de conhecimento a partir da análise de informação. Por outro, verifica-se uma fraquíssima participação das mulheres na criação e no desenvolvimento das novas tecnologias de informação que serão utilizadas pelas próximas gerações. Ou seja, se as mulheres não se envolverem, estamos a desaproveitar quase 50% da massa cerebral disponível.
No mundo ocidental, tem-se assistido, nos últimos anos, a um decréscimo acentuado do número de raparigas que ingressam nos cursos de engenharia, mais diretamente ligados às tecnologias de informação e comunicação. Por exemplo, a fração de novos alunos do sexo feminino nos cursos de engenharia eletrotécnica e informática do IST desceu para os 10%, e existem indícios de que o panorama é idêntico noutras escolas de engenharia do país. É uma situação verdadeiramente preocupante, que não é exclusivamente nossa, mas assume foros de tragédia no caso português. Países como os EUA encetaram iniciativas para inverter a tendência, que, lentamente, têm demonstrado sucesso. Escolas como o MIT reportam uma percentagem de 50% de raparigas nas disciplinas introdutórias de informática e uma proporção feminina de 30% na população estudantil de engenharia informática.
A inversão desta tendência terá de passar pela reformulação do ensino, de forma que se torne apelativo para as raparigas (que têm interesse na informática como instrumento fundamental para melhor compreender e a seguir transformar o mundo, e não para fazer o jogo de combate mais realista ou o sistema mais rápido). Não basta, contudo, mudar as práticas de ensino da engenharia, tarefa que por si só será longa e complexa. É preciso começar mais a montante e intervir muito mais profundamente, envolvendo pais, escolas secundárias e os próprios media. Esta é, pois, uma transformação geracional, que vai ser longa e exige persistência.
Por isso, muito a propósito, o tema escolhido pela ONU para assinalar este dia é "Mulheres e Raparigas nas TIC". Temos de despertar para esta enorme assimetria que nos prejudica e resulta de preconceitos culturais, sem sentido nos dias de hoje, assim como da ausência de esforços para sensibilizar as nossas raparigas para a importância que tem para elas, individual e colectivamente, estar na fila da frente nas decisões importantes que teremos de tomar no futuro. Porque uma coisa é certa: as liberdades, o modelo social e o nosso bem-estar serão doravante determinados pelas TIC que inventarmos e as formas que encontrarmos para as regular.
Um dos muitos pontos de partida para aprofundamento desta discussão é o portal da ITU, organização da ONU para as TIC: http://girlsinict.org/
Prof. Catedrático, Departamento de Engenharia Informática do Instituto Superior Técnico
*Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
A comemoração deste ano convida não só à celebração como também à reflexão. Por vários motivos. A preponderância das TIC nas sociedades economicamente desenvolvidas é hoje inquestionável. Muitos de nós dependem delas no seu dia a dia, tanto no trabalho como na esfera privada. Os ganhos são visíveis: para muitos, um telefone inteligente permite gerir com eficácia incomparável as contas dos serviços domésticos ou bancários, a organização de um jantar de grupo ou uma viagem de férias.
Confrontamo-nos, porém, com um grande entrave a esta evolução. Presentemente, as infraestruturas de apoio ao desenvolvimento social e económico carecem de um número crescente de profissionais altamente qualificados de que não dispomos. Por um lado, tratam-se de profissões que exigem capacidades analíticas, essenciais à descoberta de conhecimento a partir da análise de informação. Por outro, verifica-se uma fraquíssima participação das mulheres na criação e no desenvolvimento das novas tecnologias de informação que serão utilizadas pelas próximas gerações. Ou seja, se as mulheres não se envolverem, estamos a desaproveitar quase 50% da massa cerebral disponível.
No mundo ocidental, tem-se assistido, nos últimos anos, a um decréscimo acentuado do número de raparigas que ingressam nos cursos de engenharia, mais diretamente ligados às tecnologias de informação e comunicação. Por exemplo, a fração de novos alunos do sexo feminino nos cursos de engenharia eletrotécnica e informática do IST desceu para os 10%, e existem indícios de que o panorama é idêntico noutras escolas de engenharia do país. É uma situação verdadeiramente preocupante, que não é exclusivamente nossa, mas assume foros de tragédia no caso português. Países como os EUA encetaram iniciativas para inverter a tendência, que, lentamente, têm demonstrado sucesso. Escolas como o MIT reportam uma percentagem de 50% de raparigas nas disciplinas introdutórias de informática e uma proporção feminina de 30% na população estudantil de engenharia informática.
A inversão desta tendência terá de passar pela reformulação do ensino, de forma que se torne apelativo para as raparigas (que têm interesse na informática como instrumento fundamental para melhor compreender e a seguir transformar o mundo, e não para fazer o jogo de combate mais realista ou o sistema mais rápido). Não basta, contudo, mudar as práticas de ensino da engenharia, tarefa que por si só será longa e complexa. É preciso começar mais a montante e intervir muito mais profundamente, envolvendo pais, escolas secundárias e os próprios media. Esta é, pois, uma transformação geracional, que vai ser longa e exige persistência.
Por isso, muito a propósito, o tema escolhido pela ONU para assinalar este dia é "Mulheres e Raparigas nas TIC". Temos de despertar para esta enorme assimetria que nos prejudica e resulta de preconceitos culturais, sem sentido nos dias de hoje, assim como da ausência de esforços para sensibilizar as nossas raparigas para a importância que tem para elas, individual e colectivamente, estar na fila da frente nas decisões importantes que teremos de tomar no futuro. Porque uma coisa é certa: as liberdades, o modelo social e o nosso bem-estar serão doravante determinados pelas TIC que inventarmos e as formas que encontrarmos para as regular.
Um dos muitos pontos de partida para aprofundamento desta discussão é o portal da ITU, organização da ONU para as TIC: http://girlsinict.org/
Prof. Catedrático, Departamento de Engenharia Informática do Instituto Superior Técnico
*Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico